Ricardo Darín é o maior nome do cinema sul-americano. Se pararmos para pensar que o nosso cinema evoluiu muito nas últimas décadas, e que muitos nomes se destacaram, isso é uma definição superlativa, mas que sem dúvida nenhuma faz jus ao talento e trabalho deste talentosíssimo ator argentino.

Charme é um fator ingrato. A não ser que alguém me prove o contrário, acredito que charme é um elemento que não se adquire, apenas se tem, ou não. Eu, pelo menos, nunca vi o caso de uma pessoa o adquirir com o passar do tempo. É possível se adquirir técnica, ferramentas de trabalho, experiência, mas charme vem do berço. E se tem uma coisa que Darín tem de sobra é charme. Essa sua característica tão marcante faz com que o ator viva papéis dos mais variados, do bom ao mau caráter, e permanecemos ali hipnotizados, apaixonados pelos seus olhos azuis, e sua sinceridade inquestionável.

Com o seu trabalho na última década, Darín se estabeleceu como um dos leading actors mais importantes do cinema mundial, podendo ser tranquilamente comparado a nomes do prestígio de um Daniel Day Lewis, Denzel Washington, Sean Penn, Brad Pitt, etc.. E ele sabe disso, sabe da força do seu nome. Numa ótima entrevista do ator a revista Playboy, ele fala sobre nunca ter ido fazer cinema em Hollywood, que já havia sido convidado, claro, mas que não havia gostado do que viu, pois não tinha interesse em ser o latino da vez na América, preferia fazer um cinema de qualidade muito melhor. Questionado sobre dinheiro, ele responde “mas eu já tenho dinheiro, vou ter mais dinheiro pra quê, você tá louco?”.

Isso é uma prova da maturidade de um artista que sabe que o seu trabalho é mais do que ganhar dinheiro e agradar as pessoas. E exatamente por seguir esses princípios tão a sério é que ele estabeleceu uma carreira tão sólida, e com filmes tão representativos.

5 – XXY (2008)

Este sensível filme de Lúcia Puenzo, que conta a história de uma garota hermafrodita que passa pelo delicado momento da adolescência, e da descoberta da sexualidade, é uma oportunidade excepcional para vermos a economia que Darín emprega aos seus trabalhos. Aqui o seu tradicional charme dá espaço a uma representação minimalista, mais calada, fundamental para o sucesso deste filme, injustamente pouco visto. E além de ser mais uma ótima atuação, é um exemplo de como o ator sabe escolher bem os projetos que faz, não se deixando levar apenas pela questão comercial, como ele prova ao atuar em um filme nitidamente de baixo orçamento, sem grande apelo de bilheteria, vivendo um personagem secundário, que serve ao filme, não o contrário.

4 – O Filho da Noiva (2002)

O filme que abriu caminho para todo o sucesso internacional do cinema argentino na década passada, O Filho da Noiva, sedimentou a fama de Ricardo Darín. Digamos que ele se tornou “o” Ricardo Darín ao liderar este bem sucedido filme de Juan José Campanella, que foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2002. Interpretando Rafael, um homem que está entrando na meia idade, mas que ainda é imaturo, desligado, e sempre com muitas coisas do trabalho para resolver, Darín está com um charme irresistível, e faz com que sintamos empatia por aquela figura cheia de defeitos. Pela primeira vez o ator mostrou que é um leading actor de primeiríssima linha.

3 – O segredo dos seus olhos (2010)

Certamente o filme mais famoso do ator, O segredo dos seus olhos, representa a consagração máxima do cinema argentino recente, e do seu diretor, Juan José Campanella. O filme, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010, é um trabalho extremamente bem sucedido na questão das suas interpretações, tendo Darín como destaque. Os diferentes momentos da trama contribuem para variados níveis de interpretação, o que estabelece um jogo bastante rico entre os atores, especialmente no seu ótimo desfecho. A direção novelesca e a trama que exige que o espectador acredite em coincidências demais não diminuem o valor da atuação de Darín, que é novamente excelente.

2 – Abutres (2010)

Lançado pouco tempo depois de O segredo dos seus olhos, Abutres teve um reconhecimento bem menor, o que considero uma grande injustiça, visto que o filme de Pablo Trapero é um trabalho de direção muito mais madura, e que chega num lugar bem mais desafiador. Dando vida ao advogado trambiqueiro Sosa, Darín entrega uma brilhante atuação, fazendo com que a dualidade do personagem ganhe contornos interessantíssimos no decorrer da trama, estabelecendo uma figura com valores totalmente deturpados, mas que ainda encontra resquícios de honra para, de alguma maneira, consertar o que fez de errado, mesmo que por meios inadequados. Filmaço, e uma atuação arrasadora de Darín.

1 – Nove Rainhas (2001)

Quem é esse cara, de onde surgiu? Difícil não pensar nisso ao assistir ao eletrizante Nove Rainhas, e ver a atuação fora de série do seu protagonista, Ricardo Darín. A trama acompanha dois ladrões que tem a possibilidade de dar o maior golpe de suas vidas, vendendo uma série de selos falsificados a um milionário. Trambique em cima de trambique, com personagens que sempre parecem esconder alguma coisa, são um palco ótimo para Darín mostrar todo o seu charme, que seria uma marca registrada tão conhecida nos anos seguintes. A sua desenvoltura ao representar personagens de variadas camadas teve aqui o seu início. Certamente o ator se tornou cada vez mais sofisticado e técnico com o passar dos anos e filmes, mas o tapa dado em Nove Rainhas ainda é o mais forte da sua carreira. Espero que ainda haja muitos anos de Darín pela frente, pois ele certamente ainda fará trabalhos desafiadores, que exploram ao máximo a sua capacidade como intérprete.

O pior

A Dançarina e o Ladrão (2012)

É evidente que a atuação de Darín não é ruim neste trabalho. Se analisarmos a situação com calma, perceberemos que o filme do experiente Fernando Trueba não é nenhum desastre. Mas acontece que a sua falta de foco, as muitas tramas que se desenrolam, e a direção pouco inspirada do espanhol, fazem desse filme um verdadeiro teste de paciência, com clichês acumulados que se repetem, num trabalho nota 5,0 do início ao fim. Se Darín não compromete, fica uma crítica a sua escolha pelo projeto, que nem se aproxima da qualidade dos seus trabalhos mais destacados. Bola fora.