Uma escritora com traumas profundos que busca superá-los escrevendo sobre suas angústias em um lugar remoto e desolado. Com tintas de thriller e drama existencial, “Bem-vinda, Violeta” pode ter uma passagem interessante nos cinemas brasileiros, onde deve ser lançado até final de 2022. Após estrear no Brooklyn Film Festival, passar pelo Festival do Rio e pela Mostra de SP, o filme, uma co-produção da RT Features, marca a parceria nas telas e na vida do cineasta Fernando Fraiha e da atriz Débora Falabella. 

“Bem-vinda, Violeta” é uma obra portanto sul-americana, que se vale da colaboração entre elenco argentino, uruguaio, produção brasileira partindo da adaptação da obra “A Cordilheira”, do escritor gaúcho Daniel Galera. Fraiha recebeu a incumbência de adaptar o livro, um romance sobre um escritor que vai para Buenos Aires divulgar seu novo livro, e esse foi um trabalho que levou cerca de três anos e dezenas de tratamentos de roteiro para ser cumprido. O trabalho de roteirização foi feito juntamente com a escritora uruguaia Inés Bortagaray (que também co escreveu “A Vida Invisível”, de Karim Aïnouz), e a consultoria de Galera, dando conta de ilustrar a jornada de uma aspirante a escritora que se inscreve em uma residência de escrita numa localidade bem isolada e montanhosa na Terra do Fogo. 

“Não há nada mais perigoso do que um escritor motivado” 

Conhecido por “Fale com Ela”, Dario Grandinetti é quem contracena e faz o contraponto com à personagem da escritora, Ana, interpretada por Débora Falabella em “Bem-vinda, Violeta”. Ele é Holden, um afamado escritor que dirige a residência de escrita criativa. Um sádico, daqueles típicos estereótipos do gênio com métodos pouco ortodoxos, o arquétipo do mestre e também do louco. 

O que Holden propõe a Ana e aos outros quatro escritores selecionados é que abandonem a si próprios para viver como seus personagens. Simples, não? Para fazer com que a vida seja verdadeira como as ficções que criam ou buscam criar. A princípio retraída, quase que pudica e insegura quanto ao seu talento, Ana passa a se deixar dominar mentalmente por aquele guru literato. 

“Bem-vinda, Violeta” supera a premissa desinteressante e segura a atenção com as dinâmicas propostas por Holden e a interação entre Ana e os outros escritores da residência, como a cleptomaníaca que é sua colega de quarto. Mas certo excesso nas repetições também influi negativamente no ritmo da narrativa, que muda de tom drasticamente quando Ana é aviltada por Holden, momento em que a trama principal colide com uma auxiliar envolvendo a personagem fictícia Violeta, uma adolescente que seduz o professor, um homem mais velho, e o leva a cometer suicídio. 

EXPERIÊNCIA RARA NO BRASIL 

Em sua segunda incursão como diretor de uma obra ficcional, Fernando Fraiha (de “La Vingança”) consegue contornar bem alguns escapes na condução, apostando na fragmentação temporal e elipses para ilustrar a mudança mental de Ana. E tem na dupla de atores centrais um suporte importante, já que Débora consegue mergulhar na personagem e em cenas repletas de diálogos com Grandinetti, que também se sai muito bem.  

As situações limite perpetradas por Holden, incansável na busca por compreender como e “Onde se perde a originalidade da ideia” leva as raias da obsessão Ana/Violeta, que começa a se entender e se reconhecer naquele processo tortuoso de criação. 

Filmado durante a pandemia, apenas com luz natural durante as horas de sol em Ushuaia, “Bem-vinda, Violeta” é uma produção interessante, ainda que imperfeita, de exercício dentro de um gênero que ainda não é dominado pelos cineastas brasileiros, mas que já traz importantes avanços em termos qualitativos. Outro fator fundamental para amplificar o suspense, além da ambiência e a desolação que o cenário trouxe para o filme é a trilha de O GRIVO, destacando “Suíte para Violeta” que toca nas sequências de maior impacto emocional.