“Dançando no Silêncio” é um filme bem menos sobre “superação” do que sobre redescoberta. Após ser agredida em uma noite quando tentava ganhar um dinheiro extra com rinhas de animais, a bailarina Houria (Lyna Khoudri, também protagonista do filme anterior da diretora Mounia Meddour, ‘Papicha’) tem sua vida mudada.  

Agora que precisa conviver com as dores físicas e também com o trauma que insiste em lhe rondar, a jovem se depara com uma nova realidade. A sapatilha de balé e o Lago dos Cisnes que eram seu presente e futuro agora são substituídos por sessões de fisioterapia e o mundo da dança clássica dá lugar a um grupo de mulheres com histórias distintas, também marcadas pela dor e pelo trauma.  

É no poder da irmandade feminina que triunfa, mais uma vez, Meddour. Em seus momentos mais belos, o tom solar de “Dançando no Silêncio” vai de encontro com os movimentos ora delicados, ora insistentes de Houria. A dança é sua principal forma de comunicação, e é por ela que seus sentimentos são expurgados ao longo de pouco mais de uma hora e meia de projeção.  


Essa história é contada também com o apoio de várias metáforas e símbolos clássicos, seja o renascer que vem com a água da chuva, seja o sol que volta a brilhar não importa o lugar, seja o passarinho engaiolado que rima com o sentimento acuado de Houria. Ela, afinal, segue com medo e essa ameaça não desaparece. Meddour não deixa de tocar na ferida das vítimas quando mostra o quanto a agressão à protagonista simboliza mais uns minutos inconvenientes na vida da policial que está mais interessada em saber o que vai comer. Por isso, a cada novo movimento de Houria para seguir em frente, também seguimos um pouco, de mãos dadas com ela e com seu novo corpo de baile.  

“Toda morte traz uma vida”, diz uma personagem. Assim, solta, essa frase pode parecer um trecho de conselho meio torto, no melhor estilo “faça do limão uma limonada”. No entanto, aqui é a mola propulsora para que a personagem principal comece sua jornada, de fato. Ao lado de aliadas, ela começa a entender suas particularidades com uma perspectiva que ainda é cercada pelo medo, mas também pelo propósito novo que encara. E, assim como o sol brilha em um mundo que muda a cada segundo, ela torna a dançar de um jeito novo, mas tão lindo quanto antes.