“Flux Gourmet”, novo filme de Peter Strickland, é um prato reservado aos curiosos gastronômicos de plantão. O projeto do atual mestre do bizarro inglês foi exibido no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary deste ano após estreia em Berlim e vem recheado das obsessões estéticas e temáticas que o tornaram um autor cult. Porém, a sensação de que o realizador está perdendo o frescor torna o longa um pouco indigesto.

A produção gira em torno da residência de um trio de artistas em um instituto dedicado ao “catering sônico” – uma forma estranha de performance que usa a manipulação de comida como base para experimentos sonoros. Egos inflados, tensões latentes e toda sorte de parafilias vão cozinhando os ânimos em banho-maria até a situação sair completamente fora de controle.

Uma das razões pelas quais a esquisitice de Strickland atrai aclamação da crítica e uma base de fãs é seu tom extremamente pessoal – em suma, ela nunca parece condescendente com o espectador. Talvez isso nunca tenha sido mais claro do que em “Flux Gourmet”, já que o diretor de fato participou de um coletivo artístico dessa natureza na juventude.

O roteiro escrito pelo realizador aproveita o seu conhecimento de causa para servir uma sátira ácida do universo da arte contemporânea, implicando instituições e o público em um circuito megalômano e auto serviente. Nele, tudo pode ser uma performance se você a justificar pomposamente. Não à toa, os olhos do espectador neste microcosmo é Stones (Makis Papadimitriou), um escritor contratado para documentar a residência e exposto às baboseiras grandiloquentes do grupo. 

UM FILME MENOR

A despeito da localização remota que cria a ideia de uma realidade paralela, este é o filme de Strickland que mais parece dialogar com o mundo exterior, sendo menos dependente da lógica quase onírica que rege seus trabalhos anteriores. Dividido em três claros capítulos, ele também possui a estrutura mais clara dentro da sua filmografia. De certa forma, não deixa de ser curioso ver o diretor aplicando a sua marca em um formato mais tradicional.

Porém, algo do seu cinema fetichista parece perdido na tradução e há uma aura de déja vù que permeia os 111 minutos de projeção. Claro, o sarcasmo e as referências a outros gêneros (como giallo e documentários musicais) entretém, mas o diretor já entregou obras melhor realizadas cobrindo território similar. Em particular, as explorações sonoras de “Barberian Sound Studio” apresentam a versão mais sisuda de muitos temas abordados aqui.

Ainda assim, não há como negar a visão do realizador e um filme menor seu ainda estimula mais do que a maior parte da oferta dos multiplexes hoje em dia. Nos seus questionamentos sobre o limite da arte, “Flux Gourmet” não está exatamente no nível “estrelas Michelin” – mas tampouco deixa o espectador com fome. 

* Texto original alterado para substituir a equivocada expressão humor negro.