Os Estranhos, do diretor Bryan Bertino, lançado em 2008, não é nenhum clássico do terror, mas é um filme que faz razoavelmente bem aquilo que se propõe: contar uma história assustadora com poucos personagens e cenários, investindo em um clima de tensão pela arbitrariedade da situação vista na tela. Ao longo da trama, nunca descobríamos quem eram os tais estranhos mascarados que aterrorizavam o casal de protagonistas, nem porque eles estavam cometendo os seus atos de terror e violência. E essa noção do acaso, de que “poderia acontecer com você”, é sempre bem vinda em uma história do gênero por aumentar o medo.

Já este Os Estranhos: Capítulo 1, bem… É apenas a velha picaretagem do cinema. Este novo filme é uma tentativa de transformar em franquia algo que era perfeitamente autocontido – na verdade, é a segunda tentativa, pois há alguns anos foi lançado Os Estranhos: Caçada Noturna (2018), uma continuação “em espírito” do original que era uma produção B rotineira, mas com, ao menos, um momento incrível: um assassinato na piscina ao som do clássico brega “Total Eclipse of the Heart” de Bonnie Tyler. Uma cena capaz de trazer um sorriso a qualquer fã do gênero terror.

Este Capítulo 1… Nem isso. É um remake não assumido do primeiro, mas sem tensão, sem envolvimento e sem vida. Em essência, os produtores deste aqui pedem que o público gaste dinheiro em um filme que já viram. O nome disso: picaretagem.

VOCÊ JÁ VIU ISSO ANTES … e melhor

Nesta produção, temos os habituais clichês do gênero: um casal jovem e inexpressivo (vividos por Madelaine Petsch e Froy Gutierrez) viaja pelo meio do nada, USA. Logo no início, surge um forte sinal de alerta – a velha bombinha de asma, presente em 9 de cada 10 filmes clichezentos de terror. O casal para em uma cidadezinha onde, aparentemente, todo mundo é meio esquisito. O carro quebra e o mecânico tem a maior pinta de psicopata. Eles aceitam passar a noite em uma casa de Airbnb isolada – nada suspeito. Eis que começam a ser atacados pelos três mascarados de sempre – um homem e duas mulheres – e precisam lutar pela sobrevivência.

Quando Bertino fez o longa original, ele concebeu a história de invasão doméstica pegando elementos de alguns casos reais e incidentes – e claro, a campanha de divulgação insistiu na estratégia do “Inspirado em fatos reais”. O diretor e roteirista até demonstra ter afinidade e jeito para o terror, como demonstrou no filme anterior, o bacana Demoníaca (2020), mas aqui a preguiça dominou: tirando o fato do casal atual ser mais jovem que do primeiro filme e não estar com dificuldades na relação, todas as batidas da história e até alguns sustos e diálogos são praticamente iguais ao do longa de 2008.

SUSTO ZERO

Outro preguiçoso aqui foi o diretor Renny Harlin: em um passado já muito distante, ele fez dois bons filmes de ação que foram importantes para as carreiras de Bruce WillisDuro de Matar 2 (1990) – e Sylvester Stallone – Risco Total (1993). Ele também fez A Hora do Pesadelo 4 (1988), uma das boas sequências com o demônio dos sonhos, Freddy Krueger, e… É só. Há alguns anos, começou a seguir a rota dos filmes direto para o DVD e depois streaming. Harlin parece que só apontou a câmera e foi tomar um café, pois telegrafa todos os sustos – uma cena envolvendo uma revelação com uma vela desperta risos – e conduz tudo com frouxidão.

Quase nada acontece na primeira metade de Os Estranhos: Capítulo 1 e bem pouco na segunda. Quando o longa não está aborrecendo o espectador pela previsibilidade, irrita ofendendo a nteligência: os vilões são praticamente mágicos às vezes, capazes de se teletransportar para atacar e pregar “sustos” e os heróis burros, pois têm chances de escapar – em dado momento da trama, até conseguem uma arma – e as desperdiçam. E quando a ação se transpõe para o lado de fora da casa, somos levados a mais cenas burocráticas ambientadas na floresta mais iluminada do cinema recente.

COMO SERÁ O FUTURO?

O maior problema de Os Estranhos: Capítulo 1 é que é um filme que já vimos antes e melhor – nem uma ceninha no final consegue gerar qualquer expectativa pela segunda parte, a ser lançada daqui a alguns meses – e aparentemente os planos dos produtores é fazer uma trilogia. Ora, todo o entorno da cidade esquisita – incluindo uma ponta do conhecido ator do gênero, Richard Brake, como um xerife – está claramente sendo guardado para as continuações, mas será que alguém vai se interessar em vê-las, quando a primeira parte é tão fraca?

Sabemos que muitos espectadores gostam da familiaridade, mas isso não é desculpa para um longa tão sem vida e sem qualquer sopro de uma novidade, mínima que seja. Os Estranhos, lá atrás, não parecia o tipo de filme que geraria uma franquia, mas aqui estamos – porém, como será possível manter uma franquia sem apresentar um pouco de variação na fórmula?

Tudo isso é tarefa para os cineastas responsáveis pelo projeto, mas resta torcer para que façam um filme enquanto acordados na próxima vez. Porque esse daqui é tão preguiçoso que o sono e o tédio começam a irradiar para além da tela.