O ator Jesse Eisenberg (“A Rede Social” e “Café Society”) ficou famoso por seus personagens ligeiramente – ou bastante – neuróticos, e muitos deles pareciam viver no seu próprio mundinho. E na estreia dele como diretor, é justamente isso que Eisenberg explora na dramédia When You Finish Saving the World, produção da queridinha do momento A24 – Emma Stone é uma das produtoras. É um filme estranhamente cativante, que funciona graças aos seus dois personagens, figuras que poderiam despertar grande antipatia, mas que nos parecem um pouco familiares também.

Baseado em um audiobook que o próprio Eisenberg lançou em 2020, o filme se centra num conflito entre uma mãe e o filho adolescente. Evelyn (vivida por Julianne Moore), trabalha dirigindo um abrigo para vítimas de abuso doméstico. É uma pessoa que vive no mundo real e conhece o horror de um lar desfeito ou da violência. É também uma mulher consciente, social e politicamente, do mundo ao seu redor. Por isso mesmo, ela parece não reconhecer mais o filho, o jovem Ziggy (Finn Wolfhard), o típico adolescente obcecado por si mesmo que ganha dinheiro fazendo lives onde canta músicas bobinhas para seus fãs online. Ziggy, no entanto, se acha “o poeta”.

Os pontos de vista diferentes desses dois personagens vão colidir, quando Ziggy se apaixona por uma colega da escola e, por isso, tenta despertar um senso político; e Evelyn toma interesse por um jovem da idade do filho e tenta convencer esse rapaz a ir para a faculdade.

ECOS DE BAUMBACH

Colidir talvez seja um termo forte demais. When You Finish Saving the World é um filme de pequenos conflitos, dos pequenos abismos entre familiares. Nada de realmente muito explosivo acontece. Não é sério o suficiente para ser um drama, e nem é tão engraçado o bastante para ser comédia. O tom lembra vagamente um longa de Noah Baumbach – e foi em A Lula e a Baleia (2005), do seu amigo diretor, que Eisenberg despontou como ator, outro filme de pessoas ensimesmadas tentando fazer sentido dos seus sentimentos e conviver no mundo.

Mas o diretor estreante é um pouco mais afetuoso que Baumbach, conseguindo às vezes ser mais ácido. Eisenberg nunca nos faz esquecer que seus personagens são narcisistas – a certa altura, o pai da família, vivido pelo veterano Jay O. Sanders, diz isso em voz alta, um momento em que When You Finish Saving the World poderia ser mais sutil. Mas, de alguma forma, o longa se mantém num equilíbrio delicado: achamos Evelyn e Ziggy esquisitos, mas ficamos do lado deles durante toda a história.

FAMÍLIA E SUAS SENSAÇÕES INDESCRÍTIVEIS

Se a direção de Eisenberg é discreta, sem muita invenção visual – destaca-se um plano com um pilar no centro do quadro separando Evelyn do seu “filho postiço” vivido por Billy Bryk, mas de modo geral a encenação é básica – é nas atuações que o filme brilha. Moore e Wolfhard foram escolhidos à perfeição, e seus personagens são construídos nos detalhes, desde o carrinho minúsculo que Evelyn dirige, na música clássica sempre ao redor dela, ao “tera” que Ziggy usa como advérbio de intensidade – “tenho tera fãs!” – e aos seus maneirismos, tudo neles grita conflito de opostos, de “velhice x juventude”. Ambos são a razão pela qual When You Finish Saving the World termina provocando uma curiosa e interessante sensação no seu espectador.

Uma sensação que não depende dos maneirismos típicos de filme indie norte-americano, os quais o filme não evita, mas consegue contornar; nem de uma construção artificial dos personagens e situações. Na verdade, o maior mérito de When You Finish Saving the World, além de se equilibrar entre o afetuoso e o irritante sem nunca pender muito para um ou o outro, é de deixar uma constatação ao seu desfecho: família é assim mesmo. Um misto de amor, decepção e mais algumas sensações que nem se pode descrever direito.

Filme visto no Festival de Sundance 2022.