As cenas iniciais de Para Minha Amada Morta mostram um pai tomando conta do filho pequeno e logo surge uma pergunta na mente do espectador: onde está a mãe? A mãe e esposa, logo descobrimos, morreu, mas permanece presente na casa e na mente de Fernando, o protagonista interpretado por Fernando Alves Pinto, de 2 Coelhos (2012). Ele descobre algumas velhas fitas de vídeo com imagens da esposa e não consegue parar de assisti-las.

Numa das fitas, Fernando vê a esposa transando com outro homem, e uma ideia se forma em sua mente. Ele trabalho como fotógrafo da polícia, e graças às suas conexões descobre quem é este homem. Fernando então começa a se infiltrar na vida dele e da sua família, e por um momento imaginamos que ele poderia dar uma de Max Cady, de Cabo do Medo (1991). Afinal, ele começa a se aproximar da esposa e filha mais velha do homem. Pode estar querendo destruir o núcleo familiar. Em alguns momentos, achamos até que ele deseja (e pode) matar o ex-amante da esposa.

Mas o que começa como exercício de suspense se dilui ao longo do tempo. Quando parece que a tensão vai explodir, essa explosão é adiada. E novamente adiada. E de novo. Nas mãos do roteirista e diretor Aly Muritiba, Para Minha Amada Morta se torna um filme de ritmo bem lento, no qual a câmera se move pouco, e no qual o próprio protagonista se mostra ora obcecado, ora indeciso a respeito da própria obsessão. Alves Pinto compõe um personagem tenso, com a expressão sempre fechada ou como se estivesse planejando algo, mas com o tempo qualquer expectativa que o filme tenha criado no início se desfaz. Quem esperar ver uma obra nervosa no estilo do recente O Lobo Atrás da Porta (2014) vai se decepcionar. Este Max Cady é sedado demais, apático demais. O espectador fica à espera que algo aconteça, e como o longa dura quase duas horas, a tensão se dissipa e a história não segura o interesse.

A própria indefinição do personagem acaba fazendo com que algumas conveniências do roteiro fiquem mais perceptíveis. O filho de Fernando é convenientemente despachado – por tempo demais, até. E, aliás, por quanto tempo o protagonista deixou de ir ao trabalho para ficar morando próximo à família do amante da falecida, Salvador (Lourinelson Vladimir)? Uma cena entre os dois, na qual Salvador revela ter tido um caso com uma mulher “que fazia de tudo, e gravava”, possui diálogos muito expositivos que nem sempre fluem naturalmente entre os dois atores.

Para-minha-amada-morta-filme-de-Aly-Muritiba_still-de-Rosano-Mauro-Jr-e1458787199870Essa cena é basicamente um único plano que dura uns 10 minutos, e apesar das falas não saírem de forma inteiramente natural, ela representa um belo momento cinematográfico. Outro longo plano-sequência de cerca de 10 minutos, mais à frente, é ainda mais forte por envolver vários atores, movimentos de câmera e o conflito que finalmente ameaça estourar entre os dois homens. Nesses dois momentos, Fernando tem alguns objetos à disposição – uma pá, um martelo, uma faca – e a tensão volta a se instaurar na narrativa.

Há também um longo plano no começo enfocando o filhinho de Fernando brincando com a arma do pai. Este último, em especial, não tem função narrativa, mas essas três cenas mostram que Muritiba entende de suspense, seus atores apresentam boas atuações e o trabalho sonoro do longa é muito interessante, com ausência de trilha sonora, valorização dos silêncios e dos sons ambientes, diálogos sempre claros. Porém, seu filme na verdade é um estudo de personagem, de alguém preso no passado, indeciso sobre qual caminho seguir, e embora o desejo de evitar os clichês de gênero seja louvável, indecisão não é dos sentimentos mais fáceis de retratar no cinema. O resultado é um filme morno, mais longo do que precisa ser, com alguns momentos de brilhantismo espalhados pela sua duração. Esses momentos, porém, despertam interesse em querer continuar acompanhando a carreira do cineasta.