Com a colaboração de Caio Pimenta

Amantes do cinema em Manaus há muito se queixam, e com razão, da falta de opções na programação dos cinemas.

Claro que, há não muito tempo atrás, tínhamos um número reduzido de salas, com a falência de vários cinemas históricos no Centro de Manaus, o que restringiu a programação dos shoppings (compreensivelmente) aos blockbusters da temporada.

A chegada e a consolidação de novas redes cinematográficas, porém, mostrou que há, sim, público para a Sétima Arte, e esperávamos que isso se refletisse na programação das salas. Não foi o que aconteceu.

Os leitores do Cine Set têm acompanhado, toda sexta-feira, nossas queixas sobre a falta de diversidade dos filmes que estreiam em Manaus. E não estamos falando apenas de produções ditas “alternativas” e documentários, mas de filmes de boa repercussão de público e crítica no Brasil, alguns inclusive indicados a categorias importantes do Oscar, que, quando estreiam por aqui, é com bastante atraso, isso quando simplesmente não chegam.

Por isso, é preciso saudar a iniciativa da rede Cinemais de abrigar o Festival Varilux de Cinema Francês nas salas do Millenium Shopping. Com uma programação eclética, trazendo 14 filmes, que vão da animação ao thriller psicológico, o Festival permite aos apaixonados por cinema se inteirar da produção do país europeu em 2012. A boa acolhida dos espectadores, que pude presenciar até em sessões tardias, é indício, talvez, de um amadurecimento do público amazonense de cinema, que está cansado de ver comédias românticas bobas ou a nonagésima sequência de “Jogos Mortais” e congêneres. Torcemos muito, mas muito mesmo, pra que essa não seja uma moda passageira, e que iniciativas semelhantes possam, mais uma vez, ter espaço nas grandes salas comerciais, ao invés de ficarem restritas a festivais. O público cinéfilo precisa fazer sua parte, pra que não se repita o destino infeliz da saudosa Sessão Cult, do Cinemark (claro que os horários mais variados ajudam muito), que também arriscou trazer filmes menos óbvios, mas cuja bilheteria foi pífia.

Quanto aos filmes, não consegui ver todos (e conto com a ajuda do amigo Caio Pimenta aqui), mas o que ficou claro é que a produção do cinema francês em 2012 não foi particularmente memorável. Enquanto diretores experientes como Agnès Jaoui (de O Gosto dos Outros, 2000, indicado ao Oscar) deram sérios escorregões (Além do Arco-Íris), iniciantes como Carine Tardieu (Feito Gente Grande) e Jean-Paul Lilienfeld (Anos Incríveis) ainda não conseguiram deixar uma marca memorável para o país de Carné e Truffaut. Os temas das produções, aparentemente escolhidos pela organização para enfatizar o “francesidade” da coisa, vão fundo nas referências a personagens históricos do país, como a rainha Maria Antonieta (Adeus, Minha Rainha), o pintor Auguste Renoir (Renoir), pai do grande diretor Jean, e a escultora Camille Claudel (Camille Claudel 1915). Segue a sinopse de cada um, com um breve comentário e a nota.

Filme: Adeus, Minha Rainha

Direção: Benoît Jacquot

Elenco: Léa Seydoux, Diane Kruger, Virginie Ledoyen

Sinopse: Em 1789, quando a notícia da tomada da Bastilha chega à Versalhes, o castelo esvazia. Mas Sidonie, jovem leitora inteiramente dedicada à Rainha, não quer acreditar nos rumores que ouve.

Comentário: Um dos destaques da mostra, a produção de época é inspirada no livro de Chantal Thomas, que alega a existência de um romance homossexual entre a famigerada monarca francesa e uma de suas amas. O elenco feminino é belíssimo, mas, à parte as muitas nuances do olhar de Léa Seydoux (Bastardos inglórios), não há grandes destaques. A trama é levada sem pressa e com evidente fascínio pelo diretor, que recria com competência a atmosfera da corte naqueles dias tumultuados. Nota: 7,5

Filme: Os Sabores do Palácio

Direção: Christian Vincent

Elenco: Catherine Frot, Arthur Dupont, Jean d’Ormesson

Sinopse: A respeitada chef Hortense Laborie se assusta quando é escolhida pelo presidente para trabalhar no Palácio de Eliseu. Em princípio, Hortense é invejada e mal-vista pelos outros cozinheiros do palácio, porém ela consegue contornar a situação com sua personalidade forte. A autenticidade de seus pratos logo seduz o presidente, mas os bastidores do poder estão repletos de armadilhas.

Comentário: Uma produção simpática, que flui bem, amparada sobretudo na empatia da atuação de Catherine Frot. A trama endeusa a figura do cozinheiro, tão cara à cultura francesa, e o diretor Vincent não esconde sua volúpia em registrar, em detalhes, cada preparo da chef Hortensie para o presidente. No final, os homens chegam a chorar com a sua partida. Nota: 7,0

Filme: Prenda-Me

Direção: Jean Paul Lillienfeld

Elenco: Sophie Marceau, Miou-Miou, Marc Barbé

Sinopse: Uma noite, uma mulher vai a uma delegacia confessar o assassinato do seu marido violento cometido há muitos anos. Mas à medida que a policial interroga essa mulher, menos tem vontade de prendê-la.

Comentário: Filme que começa como um policial (até na trilha sonora), mas se revela um estudo psicológico de personagem. No caso, a sofrida (e passiva) esposa vivida por Sophie Marceau (que já foi bondgirl em 007 – O Mundo Não é o Bastante), que busca na punição judicial uma forma de validar sua existência miúda. Infelizmente, o roteiro mira em direções demais, e não acerta em nenhuma de forma satisfatória. Resta a ótima atuação da veterana Miou-Miou, como a policial franca e sem rodeios, que se recusa a prender Sophie. Nota: 6,0

l'homme qui rit
Filme:
O Homem Que Ri

Direção: Jean-Pierre Améris

Elenco: Gérard Depardieu, Emmanuelle Seigner, Marc-André Grondin

Sinopse: Ursus, um showman pitoresco, acolhe dois órfãos em sua caravana: Gwynplaine, um jovem com o rosto marcado por uma cicatriz que dá a impressão de estar permanentemente rindo, e Déa, uma menina cega.

Comentário: O grande destaque da mostra, sem dúvidas. Superprodução conduzida com segurança pelo diretor Améris, o filme recria com fidelidade o universo dos romances de Victor Hugo, tão singular em sua mistura de romantismo fantástico e realismo brutal. A empreitada é ainda mais admirável por ser esta a primeira refilmagem do clássico do cinema mudo, que inspirou fontes tão diversas quanto os quadrinhos de Batman (o personagem Coringa), o anime Ghost in the Shell e os grandes escritores H. G. Wells e J. D. Salinger. Destaque para o elenco, que inclui o sensível protagonista Marc-André Grondin, a angelical Christa Teret (também em Renoir, mais acima) e o mundano Gérard Depardieu. Prova de que nem só de Os Miseráveis vive o autor francês no cinema. Nota: 8,5

Filme: Uma Dama em Paris

Direção: Ilmar Raag

Elenco: Jeanne Moreau, Laine Mägi, Patrick Pineau

Sinopse: Anne sai da Estônia para ir a Paris cuidar de Frida, uma senhora estoniana que mora na França há muitos anos. Mas Frida tenta desencorajá-la de todas as maneiras.

Comentário: O longa sofre com um roteiro que parece desrespeitar o espectador nas decisões referentes à protagonista que, mesmo tendo mais de 50 anos e atuando há tempos na profissão, age como uma adolescente a cada mísero problema que surge. Além disso, a história procura um romance entre dois personagens de maneira forçada para que a trama continue. Salva-se apenas a excelente atuação de Jeanne Moreau. NOTA:5,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Além do Arco-Íris

Direção: Agnès Jaoui

Elenco: Agathe Bonitzer, Arthur Dupont, Jean-Pierre Bacri

Sinopse: Uma comédia sobre relacionamentos o amor que alegremente desmistifica o fim tradicional dos contos de fadas.

Comentário: Excesso de personagens mata essa história que tenta tirar um sarro dos contos de fada, mas não consegue. Mesmo conseguindo criar boas histórias, falta unidade e ligação satisfatória entre todos os eixos da trama. Em alguns momentos, personagens somem e depois reaparecem (o caso da menina que nutre uma paixão platônica pelo mocinho da história, por exemplo). O angustiado Jean-Pierre Bacri e o misterioso Benjamin Biolay são os pontos altos da história e fazem com que tudo não se perca. NOTA:6,0 (Por Caio Pimenta)

Filme: O Menino da Floresta

Direção: Jean-Christophe Dessaint

Com as vozes de Jean Reno, Lorant Deutsch, Isabelle Carré e Claude Chabrol

Sinopse: Em uma grande floresta vive um jovem selvagem de dez anos. Seu pai, um bronco caçador, sempre disse a ele que o mundo acabava nos limites da floresta. Um dia, porém, para salvar seu pai, o rapaz se aventura num mundo desconhecido.

Comentário: A única animação exibida no Varilux traz uma bela história de busca pelo amor paterno e descoberta do mundo. Com a história remetendo a “Bambi” e os traçados aos filmes de Hayao Miyazaki, o filme passa longe de aliviar o rumo da trama para agradar o público com trilhas grandiosas e final feliz. Não cair nessa armadilha é a principal qualidade desta bela produção. NOTA: 7,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Feito Gente Grande

Direção: Carine Tardieu

Elenco: Agnès Jaoui, Denis Podalydès, Isabelle Carré

Sinopse: Dividida entre seus pais, que a enchem de amor e de almôndegas, Rachel, 9 anos, conta os minutos que a separam da liberdade. Até o dia em que seu caminho cruza o da intrépida Valérie.

Comentário: A obra fica no meio-termo: apesar da premissa interessante, o filme nunca chega a decolar, porém, cumpre o trabalho de emocionar o público graças ao talento de seus atores. Um pouco mais de coesão e menos subtramas teria feito melhor ao filme. NOTA:6,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: A Datilógrafa

Direção: Régis Roinsard

Elenco: Romain Duris, Déborah François, Bérénice Béjot

Sinopse: 1958. A jovem Rose Pamphyle tem um dom: datilografar numa velocidade vertiginosa. Ela desperta o esportista ambicioso adormecido em Louis Echard, dono de um escritório de seguros.

Comentário: O mais clichê e americano de todos, “A Datilógrafa” é também uma obra deliciosa de se ver. Para isso, o filme conta com bons e carismáticos protagonistas, roteiro enxuto e uma direção de arte, trilha sonora e figurino de alta qualidade. Roinsard sabe da falta de originalidade da história e consegue êxito em fazer o simples. Agradável passatempo. NOTA:7,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Renoir

Direção: Gilles Bourdos

Elenco: Michel Bouquet, Christa Theret, Vincent Rottiers

Sinopse: 1915. Côte d’Azur. No crepúsculo da sua vida, Auguste Renoir sofre com as dores da idade. Mas a jovem Andrée surge em sua vida e lhe da uma energia que ele já não esperava.

Comentário: Mark Ping Bing Lee é o grande trunfo deste ótimo filme. Para quem não sabe, este é o nome do diretor de fotografia do longa, responsável por criar composições dignas dos mais belos quadros do pintor francês. A história não chega a ser brilhante e, em alguns momentos, resvala no tédio, porém, consegue força através da ótima atuação de Christa Theret. NOTA:7,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Pedalando com Moliére

Direção: Philippe Le Guay

Elenco: Fabrice Luchini, Lambert Wilson

Sinopse: No auge da sua carreia de ator, Serge Tanneur vive como eremita quando Gauthier Valence, um ator de televisão bajulado pelo público, o procura para lha propor um papel em “O Misantropo” de Molière.

Comentário: Luchini consegue ser o ponto forte desta trama que não se define entre a comédia e o drama. Com tantas tramas insossas rodeando a tela, os ensaios para a composição dos personagens da futura peça são os pontos altos da história. Talvez, um  pouco mais de densidade no restante do roteiro fizesse o longa se tornar algo digno da obra de Moliére. NOTA:6,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Camille Claudel

Direção: Bruno Dumont

Elenco: Juliette Binoche, Jean-Luc Vincent, Robert Leroy

Sinopse: 1915. Internada por sua família num manicômio, onde ela não poderá mais esculpir, Camille Claudel vive reclusa enquanto aguarda a visita do irmão, Paul Claudel.

Comentário: Binoche, Binoche, Binoche. Como o cinema precisa de mais atuações exemplares como a entregue por esta excelente atriz. O filme também consegue destaque pela ambientação feita por Dumont do hospício, capaz de dar a dimensão do inferno pelo qual a protagonista passa. Tudo isso através de muito silêncio, poucos cores e pelo modo pacato do local. NOTA:7,5 (Por Caio Pimenta)

Filme: Anos Incríveis

Direção: Michel Leclerc

Elenco: Félix Moati, Sara Forestier, Eric Elmosnino, Maiwenn, Emmanuelle Béart

Sinopse: Com a popularização das filmadoras portáteis, um grupo de amigos decide criar seu próprio canal de televisão e, sobretudo, fazer uma revolução. Assim nasce a “Télé Gaucho”, anarquista e provocadora.

Filme: Aconteceu em Saint-Tropez

Direção: Danièle Thompson

Elenco: Monica Bellucci, Kad Merad, Éric Elmosnino

Sinopse: O enterro da esposa de Zef cai bem na hora errada, no momento em que Ronie casa sua filha! Esse acontecimento inesperado agrava os conflitos já existentes entre os dois irmãos.