O ensino médio é uma época de emoções fortes. Talvez as emoções mais fortes que uma pessoa possa sentir durante uma vida bem longa.

Na adolescência tudo parece ser definitivo e muito importante, ou se é muito feliz, ou muito triste, se tem muitos amigos, ou nenhum, ou esse é um momento de boas recordações, que são sempre bem vindas quando trazidas à tona, ou é uma fase em que o melhor a fazer é esquecer tudo o que foi vivido, visto que tal fase pode trazer marcas que não passam com o tempo.

Claro que muitos filmes abordam esse momento da existência, mas de modo geral, eles não parecem muito preocupados em fazer um estudo aprofundado sobre essa fase específica da vida, preferindo investir em comédias despretensiosas, ou olhando os adolescentes com um certo desdém, interpretando as inconsistências desse período como algo que desagrega profundidade para uma trama que queira se levar a sério.

Dando uma repassada rápida, importantes exceções a isso são nomes como John Hughes, Gus Van Sant, Laís Bodansky e Greg Mottola.

Porém, mais um nome entra para este time. Este é Stephen Chbosky, e o seu excepcional As Vantagens de Ser Invisível.

Charlie (Logan Lerman) é um calouro no ensino médio que busca enfrentar essa fase da vida da maneira menos dolorosa possível, depois de um trauma na infância. Tendo receio de se envolver com as pessoas, primeiramente abrindo-se apenas com o seu professor de inglês, Mr. Anderson (Paul Rudd), ele acaba criando uma forte amizade com Patrick (Ezra Miller) e Sam (Emma Watson). Esse laço criado faz com que a sua passagem por esse momento se torne menos dolorosa, embora os problemas inevitavelmente surjam, e nem sempre haja uma maneira correta para resolver as coisas.

Tratar temas adolescentes é algo bastante delicado de se fazer, pois como o universo abordado é, por si só, cheio de contradições e incongruências, é bem difícil fazer com que quem assista leve aquilo a sério. Uma coisa é tratar sobre esse universo, e outra completamente diferente é encarar o assunto como um adolescente, e ver aquilo com tais olhos.

As Vantagens de Ser Invisível é um forte expoente do primeiro caso, visto que tudo o que está na tela, todos os conflitos, sentimentos, desejos, e atitudes exalam muita honestidade e dignidade, fazendo com que observemos aquilo com um sorriso no canto da boca, e quem sabe uma lágrima presa, pois é tudo muito identificável, e toca de maneira verdadeira no espectador.

O mérito disso é primordialmente de Stephen Chbosky, já que ele dirigiu e escreveu o filme, baseado no seu próprio livro. Fica claro que o autor tem domínio completo da história que quer contar, exibindo um roteiro brilhante, que narra os sentimentos de Charlie de maneira genuína e sensível, em nenhum momento apelando para pieguices e sentimentalismos que jorram um bando de frases de efeito, repletas de artificialismos.

E mesmo que o universo adolescente seja um infinito oceano de clichês e situações óbvias, o roteiro consegue trazer complexidade para aquelas pessoas, fazendo com que o garoto tímido e introspectivo, o gay rasgado cheio de piadas, e a garota que tem um passado que prefere esconder, sejam muito mais do que apenas isso, com momentos em que a trama vai fundo na questão onde quer chegar, assim alcançando uma incontestável dignidade, a qual me referi anteriormente. E o roteiro ainda emprega momentos realmente bonitos, especialmente nas cartas feitas por Charlie para o seu amigo.

O tom melancólico trazido pela direção cai como uma luva naquele universo, fugindo com habilidade de uma possível queixa de que o artifício nada mais é do que a simples revolta comum que a tal idade traz. Além de construir cenas extremamente bem feitas, desenvolvidas no tempo correto, nem muito veloz, nem muito devagar, como na montagem que é feita enquanto Charlie lê as suas cartas, quando ele fica chapado em uma festa, na cena em que o trio de amigos está no carro e Sam sobe na caçamba, ou quando Patrick conta o caso ocorrido com o seu namorado e o pai do garoto, numa cena extremamente difícil de ser dirigida, que é concluída de uma maneira extremamente honesta, resultando assim na, talvez, cena mais bonita do filme.

Mas apesar do trabalho de Chbosky ser impecável, ele é imensamente beneficiado pelo trio principal, que tem um trabalho muito bem feito. Logan Lerman carrega o filme de maneira muito talentosa, tendo ele a incumbência mais difícil de todo o elenco, visto que para o filme ser levado a sério, ele teria que deixar aquelas situações críveis, e dar a elas a força necessária, e o jovem ator exerceu esse papel de maneira exemplar.

Assim como Ezra Miller, que emenda mais um trabalho desafiador, depois da sua excelente atuação em Precisamos Falar Sobre Kevin (2011). Subindo mais um degrau na carreira o promissor ator encara um trabalho difícil, que facilmente cairia na caricatura nas mão de um ator menos talentoso. Mais um trabalho digno de elogios entusiasmados. E Emma Watson parece se desvencilhar da Hermione, e aqui busca um desafio maior, em uma trama mais densa e com mais elementos, conseguindo mostrar que tem potencial para buscar coisas diferentes.

O final pode até parecer problemático, até entendo quem pensa dessa forma. Mas não concordo, de forma alguma. A despedida do ensino médio, a ida para a faculdade, a total falta de certeza sobre o que vai acontecer com aquelas amizades que você fez por anos é um dos maiores golpes da vida. É o momento em que você sabe que tem que dar um passo a frente, mesmo que isso signifique abandonar pessoas que foram importantes pra você, sabendo que mesmo que haja um esforço das duas partes, o contato nunca mais será o mesmo. Claro que alguns anos depois podemos até olhar tal caso como motivo de piada, pois sabemos que todo aquele sofrimento parece ter sido desnecessário (ou não). Mas o fato é que nesse momento não há como ter esse tipo de reflexão.

E depois do último grande acontecimento, um belíssimo arco se fecha, e o trabalho alcança um status ainda mais belo, pois soube caminhar de maneira vitoriosa pelo caminho tortuoso e arriscado que é o seu desfecho.

E quando chegaram os créditos finais, era quase impossível combater o misto de susto e gratidão causados pelo filme, que fez com que eu refletisse sobre certas coisas que aconteceram em um passado bem menos distante do que eu gosto de lembrar, e que de vez em quando voltam, provocando, apenas para dizer que ainda estão por ali, e que não irão embora tão rápido quanto eu esperava que fossem. Uma reflexão pueril e fútil, mas genuína, causada pelo filme adolescente que mais me emocionou até hoje.

Banner de As Vantagens de Ser Invisível, com Emma Watson