Quando o primeiro longa-metragem live action de “Turma da Mônica” saiu, minha amiga e crítica do Cine SET Rebeca Almeida, escreveu que este era um novo caminho para o cinema infantil nacional. Pulamos para 2022 e com mais produções deste universo, Daniel Rezende, diretor dos longas anteriores, pode confirmar as percepções de Rebeca por meio do sucesso da série da turma liderada pela dona do Sansão, disponível exclusivamente no Globoplay.

São vários os fatores responsáveis pelo sucesso da adaptação dos gibis de Maurício de Sousa. Consigo vislumbrar mais pontos positivos do que negativos e digo isso de uma perspectiva geral, visto que a produção é claramente voltada para o público infanto-juvenil e, como tal, possui características próprias voltadas a alcançá-los. Mas Rezende, que projetou esse universo cinematograficamente e, agora, assume o papel de showrunner, expande a produção e dialoga com o máximo de faixa etárias e públicos possíveis. Há inserção de elementos para todo tipo de espectador, o qual pode conferir uma série infantil, uma investigação, um romance soft ou um drama familiar. Tudo depende da sua perspectiva.

Considerando a leva de adultos que cresceram com a turminha do Limoeiro – o primeiro gibi foi lançado em maio de 1970 -, a ampliação traz elementos novos para os membros do grupo, mas ainda mantém os elementos que os imortalizaram, o que contribui para unir gerações antigas e novas.

Por dentro do Limoeiro

“Turma da Mônica – A Série” coloca os protagonistas em um período de suspensão: eles não são mais crianças, mas também não são considerados adolescentes. O torpor se evidencia narrativamente pela ausência de um lugar em que possam se reunir para aproveitar as férias. O pêndulo ainda é importante para que os plots sejam desenvolvidos, calcados nos dilemas que esta fase desencadeia. Monica (Giulia Benite), a dona da rua, sugere um local e tudo parece se encaminhar para mais um dia comum nas férias escolares, até a chegada de Carminha Frufu (Luisa Gatai) e os eventos promovidos pela sua animosidade com a dona de Sansão.

A história de tom infanto-juvenil começa a ganhar contornos interessantes a partir desta rivalidade. Como para muitas pessoas diante do processo de amadurecimento, a inclusão de uma variante desencadeia e aflora questões adormecidas ou em estágio de letargia. Soma-se a isso os hormônios efervescentes da pré-adolescência. Pronto: temos um prato cheio para discussão de temas que ainda assombram as pessoas que estão chegando aos 30 anos, imagine então o público geral.

Se nos filmes a discussão se concentra nas relações entre eles e entre seus pais, na série, observamos como as características clássicas, vindas do gibi, se expandiram para questões coletivas ainda que permaneçam denotando suas individualidades. Neste sentido, a falta de banho de Cascão (Gabriel Moreira) e a ansiedade de Magali (Laura Rauseo) passaram a afetar o relacionamento deles com a turma, chegando a interferir na saúde – como o caso do sobrinho do Capitão Feio (Fernando Caruso) – e agregando as dificuldades de Magali o medo de dizer não e a insegurança.

Os rostos da turma

Já o relacionamento entre Monica e Cebolinha (Kevin Vechiatto) parece ter entrado finalmente na fase em que se percebem enquanto diferentes e atraentes, além do ciúme e a necessidade de aprovação do crush. A escolhaos aproxima bem mais do contexto da “Turma da Mônica Jovem”, algo que confesso me agrada por abrir possibilidades para o elenco neste universo – embora seu afastamento já tenha sido anunciado – e explicita o quanto o quarteto principal cresceu com os personagens.

Grande parte do sucesso da série se deposita no carisma do elenco geral e na estranheza e doçura tão características dos juvenis e que emulam muito bem, tangenciando a vida como ela é. Destaco Becca Guerra, no papel da fofoqueira Denise, que faz sua primeira aparição do universo da Turma da Mônica: ela carrega bem a investigação e oferece o tom cômico que, ao mesmo tempo, alivia e aumenta a tensão em cena.

Vale lembrar que esta oportunidade de nos aprofundarmos e conhecermos mais os personagens só é possível devido a escolha narrativa de apresentar pontos de vistas distintos e, por fim, revelar o conjunto total da obra. O que nos permitiu vislumbrar a força e a fraqueza da galera do Limoeiro. Tal escolha chega a cansar depois da quinta repetição, contudo as reviravoltas nos deixam imersos, atentos e à espera da resolução da trama.

Tudo isso mostra que “Turma na Monica: A série” é uma produção gostosa de se assistir, além de agradar os mais diversos públicos, consegue nos levar de volta a infância e a leitura dos gibis. É como imergir na nossa HQ favorita e querer guardá-la no potinho: singela, prazerosa e confortável. Realmente um novo caminho para as produções infanto-juvenis.