Os melhores momentos de Amor e Monstros, parceria dos estúdios Paramount Pictures com a Netflix, estão logo no início do filme. É quando o narrador da história, o jovem Joel, reconta o apocalipse que devastou a Terra e que transformou insetos e animais em criaturas mutantes que começaram a se alimentar dos seres humanos. O pobre Joel está vivendo há sete anos confinado num bunker, rodeado por outros sobreviventes, e sua vidinha é medíocre. Ele não pode sair, é ridicularizado pelos demais e, às vezes, tem que aguentar o casal transando no cubículo ao lado. Até parece que, sem querer, os produtores do longa fizeram um filme sobre a vida durante a pandemia de Covid-19.

Amor e Monstros muda um pouco de tom quando Joel resolve embarcar numa busca pela moça que era sua namorada antes do apocalipse, Aimee. Ninguém acredita que o medroso e apatetado Joel vai conseguir encontrá-la e, talvez para ele, uma morte rápida seja até preferível à sua existência atual. Mas a viagem até o outro posto avançado, a quilômetros de distância, é a aventura que o diretor Michael Matthew e os roteiristas Brian Duffield e Matthew Robinson querem contar. O resultado é um filme despretensioso e relativamente divertido. Podia ser até mais divertido, se tivesse a coragem de ousar um pouco mais e ser mais criativo com a sua premissa.

Todo o filme gira em torno do seu ator principal, e é graças a Dylan O’Brien, da cinessérie Maze Runner, que ele funciona. O’Brien tem uma boa atuação aqui. Em vários trechos, ele atua sozinho ou com um cachorro, ou tem que fugir de monstros malucos criados por computação gráfica. É uma atuação eminentemente física, na qual ele corre, pula e reage várias vezes a coisas que não estão lá. Em outras cenas, Amor e Monstros é esperto o suficiente para colocá-lo ao lado do veterano das telas Michael Rooker, que num paralelo com outro apocalipse divertido, o de Zumbilândia (2009), faz as vezes de Woody Harrelson por um trecho do filme. Rooker melhora a produção, junto com a garotinha Ariana Greenblat, como uma dupla de sobreviventes. Eles também ajudam o astro do longa a melhorar.

ESCAPISMO INOFENSIVO

O’Brien, no entanto, não consegue ser tão engraçado porque o roteiro o limita. É frustrante notar como os roteiristas têm um protagonista interessante aqui, mas não se mostram tão dispostos assim a investir na comédia da situação ou mesmo em fornecer a ele um arco dramático que fuja do clichê. Sério, se você já viu certa quantidade de filmes em sua vida, conseguirá adivinhar tudo que acontece em Amor e Monstros. Todas as viradas de trama, todas as etapas da jornada de Joel são bem previsíveis porque o roteiro é muito básico, fruto de manual mesmo. O humor e a aventura sustentam o filme, mas a história em si é bem qualquer nota.

Além do humor e da aventura, a concepção visual das criaturas é interessante e impactante, com sapos e caranguejos gigantes trazidos à vida em bons efeitos de computação gráfica que não têm medo de mostrar suas criaturas à luz do dia. O robô Mav1s, que aparece em determinado momento da história, também é uma figura interessante.

Tudo isso, aliado à atuação de O’Brien que retrata bem a transformação de Joel em homem, faz de Amor e Monstros uma diversão legal para a família – coisa que nem todos os filmes apocalípticos são, na verdade – mas esquecível pouco depois que ele acaba. É um filme honesto, que poderia ser melhor se não fosse tão convencional na sua estrutura, e se, claro, não deixasse no ar uma pontinha de sugestão para uma sequência injustificada. Mesmo assim, ficamos felizes ao acompanhar a jornada de alguém que sai do confinamento e vai ver o mundo, mesmo que este seja perigoso e repleto de monstros.  Talvez estejamos um pouco carentes, mas tudo bem: Amor e Monstros é divertidinho e nos lembra da importância do grande mundo e das pessoas ao nosso redor.

‘Duna – Parte 2’: Denis Villeneuve, enfim, acerta no tom épico

Abro esta crítica para assumir, que diferente da grande maioria do público e da crítica, não sou fã de carteirinha da primeira parte de “Duna”. Uma das minhas maiores críticas a Denis Villeneuve em relação a adaptação cinematográfica do clássico romance de Frank...

‘To Kill a Tiger’: a sobrevivência das vítimas do patriarcado

“Às vezes a vida te obriga a matar um tigre”.  De forma geral, “To Kill a Tiger” é uma história dolorosa com imagens poeticamente interessantes. Um olhar mais aprofundado, no entanto, mostra que se trata do relato de busca de justiça e amor de um pai para com uma...

‘O Homem dos Sonhos’: criativa sátira sobre fenômenos midiáticos

Quando li esse título a primeira vez, pensei que deveria se tratar de mais uma história patriarcal romântica e eu não poderia estar mais enganada. Dirigido por Kristoffer Borgli e protagonizado por Nicolas Cage, “O Homem dos Sonhos” aborda de forma discreta o fenômeno...

Como ‘Madame Teia’ consegue ser um fiasco completo?

Se os filmes de heróis da Marvel vêm passando por um período de ócio criativo, indicando uma possível saturação do público em relação às histórias, a Sony tem utilizado os “pseudos projetos cinematográficos” do universo baseado em propriedades do Homem-Aranha para...

‘Bob Marley: One Love’: a vulnerabilidade de uma lenda

Acredito que qualquer pessoa no planeta Terra sabe quem é Bob Marley ou já escutou alguma vez as suas canções. Se duvidar, até mesmo um alienígena de passagem por aqui já se desembestou a cantarolar um dos sucessos do cantor jamaicano, símbolo do reggae, subgênero...

‘Ferrari’: Michael Mann contido em drama sobre herói fora de seu tempo

Coisa estranha: a silhueta de um homem grisalho, a linha do cabelo recuando, adorna um balde de pipoca. É Adam Driver como Enzo Ferrari, em uma ação de marketing curiosa: vender o novo filme de Michael Mann como um grande blockbuster para a garotada. Jogada inusitada,...

‘Garra de Ferro’: um drama que não sai do quase

Garra de Ferro, o novo filme do diretor Sean Durkin, o mesmo dos bons Martha Marcy May Marlene (2011) e O Refúgio (2020), é decepcionante. Mas tinha ingredientes para ser marcante: um ótimo elenco e a base de uma história real e bastante dramática. No fim das contas,...

‘A Memória Infinita’: quando o amor é maior que o esquecimento

“Estou aqui para relembrar quem foi Augusto Góngora”  Com essas palavras e uma câmera desfocada, Paulina Urrutia, ex-ministra da cultura do Chile e companheira de Gongora a quase 25 anos, nos introduz a “A Memória Infinita”, filme dirigido por Maitê Alberdi, indicado...

‘Argylle’: Matthew Vaughn ladeira abaixo em filme fraco

Entre 2007 a 2015, Matthew Vaughn surgiu como uma das mentes criativas do entretenimento norte-americano. Neste período, ele comandou as melhores sátiras subversivas ao trabalhar os elementos de fantasia a partir da violência cartunesca com o humor politicamente...

‘Todos Menos Você’: dois gostosos e a essência da comédia romântica

As comédias românticas migraram dos cinemas para os streamings nos últimos anos. Basta lembrar que “Podres de Rico”, de 2018, foi o último filme do gênero a alcançar bilheteria e repercussão significativas nas telonas. Por isso, a ótima repercussão de “Todos Menos...