O tom misterioso presente logo na abertura de Aquário já deixa claro que, mais do que oferecer quaisquer certezas ao público, Cristiane Garcia entende a força da mera sugestão e quer jogar com a percepção do espectador. Em uma atmosfera completamente oposta ao seu premiado Nas Asas do Condor, a diretora amazonense envereda aqui por um drama psicológico que acompanha a história de uma família despedaçada.

Em um jogo de luz e sombra beneficiado pela direção de fotografia de Paulo Cezar Freire, exato no uso do preto e branco quase expressionista, Aquário joga em cena os fragmentos da história daquela família aos poucos: o pai visivelmente desleixado (Paulo Queiroz), que vive num galpão alagado e cheio de goteiras; o filho (Odilon Fonseca), que claramente não quer passar o fim de semana com ele; e a ex-mulher traumatizada (Vanessa Pimentel), que quer manter distância da antiga casa e vive de cigarros e comprimidos.

Embora quase esbarre na exposição excessiva em alguns diálogos que soam um tanto forçados, e seja prejudicado por eventuais excessos dos atores (como a mãe que beira a histeria, em alguns momentos), ainda assim o roteiro escrito por Alexandre Santana consegue manter a aura de suspense em torno de toda a situação que abalou aquela família.

O fato é que, surpresas à parte, há uma perda irreparável no seio familiar, e tudo no galpão do pai transparece as marcas da fatalidade que se acometeu, desde os sons (num bom trabalho de mixagem) até a penumbra quase constante. A resposta está no tal aquário do título, símbolo de algo que se perdeu e que o pai tenta agora retomar junto ao filho. Mais do que metáfora, o aquário é também a força desencadeadora que leva o curta a assumir um tom de sobrenatural que casa bem com toda a atmosfera sentida até ali.

A conclusão não é nem um pouco clara – afinal de contas, a loucura está na cabeça de quem? –, mas a coragem em não fazer um drama fácil e nem um terror pseudo-trash, tão comum no cinema amazonense, fazem do curta-metragem de Cristiane Garcia uma obra curiosa e ousada.