Vivemos hoje na era da nostalgia e dos fan films, produções independentes feitas por fãs que se passam em conhecidos universos do cinema. Existem fan films muito legais ambientados nos universos de Star Trek, Star Wars, Batman e outros. Existem também alguns bem bobos, como se feitos por crianças que desejam recriar cenas legais dos filmes da sua infância. Nenhuma dessas duas coisas é necessariamente ruim, mas elas se combinam de maneira desastrosa em O Exterminador do Futuro: Gênesis, novo capítulo da franquia iniciada há mais de trinta anos e que foi responsável por impulsionar as carreiras do astro Arnold Schwarzenegger e do diretor James Cameron. Gênesis parece ser o primeiro fan film de 150 milhões de dólares da história do cinema.

Pegando emprestada a ideia básica de J. J. Abrams e seu reboot de Star Trek (2009), mas ao mesmo tempo esquecendo-se de todas as demais razões pelas quais aquele renascimento funcionou, Gênesis se inicia mostrando o que no primeiro Exterminador de Cameron era apenas mencionado. No futuro próximo, vai haver uma guerra entre humanos e máquinas – o sistema conhecido como Skynet – e estas acabam construindo uma máquina do tempo. Pressentindo a derrota iminente, as máquinas mandam um Exterminador ao passado para matar Sarah Connor (Emilia Clarke). John Connor (Jason Clarke), seu filho e líder da resistência humana, envia o soldado Kyle Reese (Jai Courtney) para protegê-la. Mas então acontece algo durante a viagem, e Reese chega a uma diferente Los Angeles dos anos 1980. Uma onde Sarah é quem o salva e onde ela vive há anos na companhia do seu “Papi”, um velho Exterminador “do bem” – novamente vivido por Schwarzenegger, claro.

O que é esse “algo” mencionado antes? Trata-se apenas de uma arbitrariedade de roteiro, a primeira que não faz sentido e que o filme nem faz questão de explicar direito ao longo da sua duração – há outras. O roteiro é de autoria de Laeta Kalogridis e Patrick Lussier, e vale lembrar que essa dupla é responsável por “pérolas” do cinema como Alexandre (2004) de Oliver Stone, Drácula 2000 (2000), o remake de Dia dos Namorados Macabro (2009)… Deu para sentir o drama?

Aparentemente, os roteiristas e o diretor Alan Taylor quiseram repetir aquela sensação de confusão experimentada pelo espectador que assiste a O Exterminador do Futuro (1984) pela primeira vez. Mas essa confusão não se dissipa, ao contrário do que acontecia no primeiro filme. A incompetência é tanta que nem o evento base de toda a história, o porquê da História ter sido mudada, é explicado a contento. O roteiro, a partir da quarta ou quinta reviravolta maluca, se torna sem sentido e nem todo o diálogo expositivo do mundo – e há muito disso aqui, quase não há nenhuma conversa sem que alguém explique algo para o espectador – consegue esclarecer as coisas. Quando vemos elementos como uma máquina do tempo construída pelo velho Exterminador, personagens sem função na trama (pobre J. K. Simmons), e John Connor transformado em androide na segunda metade do filme – um spoiler revelado pelo próprio trailer do longa – a sensação é de que os realizadores não estão nem aí para o publico. O filme acaba cometendo o velho pecado dos tantos filmes de ficção-cientifica, o de achar que “pode tudo” só porque a história é fantástica.

Mas nada disso importa. O importante mesmo é ressuscitar a franquia, aproveitando o mesmo truque de “é uma nova realidade”, explorado por Abrams. Então, se a história é confusa, resta ao espectador acompanhar a ação, certo? Errado de novo, pois não há virtualmente nada em Gênesis que o público já não tenha visto antes, e melhor, nos dois primeiros filmes da franquia, dirigidos por Cameron. No começo é até interessante ver Taylor recriar momentos icônicos dos dois primeiros filmes – por exemplo, a reconstrução, tomada por tomada, da chegada do primeiro Exterminador a Los Angeles em 1984. Seria um bom momento, totalmente “nostálgico” – olha aí a palavrinha de novo – mas o próprio diretor o destrói ao mostrar uma luta entre o velho e o jovem Arnold com efeitos de computação muito duvidosos. Os dois Exterminadores logo se transformam em bonecos de videogame, e em nenhum momento o espectador acredita na veracidade da cena, assim como também não acredita na perseguição de helicópteros absolutamente falsa no ato final.

E não há nada pior do que um filme ruim fazendo constantes referências a outros melhores na mente do espectador. É por isso que Gênesis lembra um fan film: os seus realizadores parecem apenas interessados em recriar as partes de ação dos filmes de Cameron, mas ignoram o fato de que elas funcionavam dentro do contexto de uma história maior, uma sobre medos tangíveis da humanidade e que possuía personagens carismáticos envolvidos em dramas pessoais. Agora os heróis se mostram pálidas recriações dos originais e a missão deles é, como de praxe nos blockbusters modernos, “salvar o mundo”. De um bug de sistema operacional. Que está em todos os telefones celulares. E computadores. Retirar o medo tecnológico dos filmes de Cameron do âmbito da guerra nuclear e transferi-lo para o dos males da tecnologia moderna só deixa tudo mais vazio e bobo.

Pelo menos Arnold Schwarzenegger parece se divertir um pouco, retomando o seu personagem favorito e arrancando, com seu carisma, alguns sorrisos da plateia durante o filme. Já seus parceiros de cena estão simplesmente constrangedores. Emilia Clarke não tem peso para fazer Sarah Connor e ainda precisa crescer muito como atriz. E Jai Courtney é da escola “Cigano Igor” de atuação, incapaz de expressar qualquer emoção humana. De fato, Sarah e Reese parecem mais robóticos do que o Exterminador, mesmo com este sendo relegado a ter de falar em linguajar técnico em grande parte do filme – em Gênesis, dependendo das necessidades do roteiro, o Exterminador é mais inteligente que o Sr. Spock, falando bobagens sobre “campos quânticos” e construindo máquinas e prédios.

No fim das contas, podemos perguntar: é só isso? É a isso que a maioria dos blockbusters de Hollywood está reduzida hoje? Filmes reduzidos a apelos nostálgicos e a tentativas de transformar em franquias intermináveis histórias que já foram encerradas há muito tempo? Existe mesmo alguma razão para se ver algum filme do Exterminador fora os dois primeiros dirigidos por James Cameron? Ao buscar repostas para essas perguntas, o espectador pode acabar com um sorriso forçado igual a alguns que Schwarzenegger tentar esboçar em Gênesis. É com essa cara de tacho que se sai da sessão deste filme. O Exterminador diz que está “velho, mas não obsoleto”. É uma pena dizer, mas ele está errado: quanto mais esse icônico ciborgue aparece nas telas, mais enferrujado e obsoleto se torna.