Robert Downey Jr saiu de “Vingadores: Ultimato” nas alturas, afinal, a maior bilheteria da história do cinema não apenas celebrava e alçava ao ápice o Universo Marvel, mas, também, era a celebração de seu astro-mor. O intérprete do Homem de Ferro é o centro de uma trama repleta de nomes fortes e comoveu até mesmo os detratores da franquia com o destino de Tony Stark. 

A Universal Pictures viu a possibilidade de surfar na onda do sucesso de Downey Jr, arrecadar uns bons milhões e ressuscitar uma franquia praticamente esquecida. Saiu, então, com este “Dolittle”. O tiro, entretanto, saiu pela culatra e prova que nem mesmo o astro mais querido do momento consegue salvar um projeto à beira do vergonhoso. 

Dolittle” traz a clássica histórico do médico capaz de conversar com animais. Aqui, ele inicia o filme isolado do mundo devido ao luto pela morte da esposa em uma expedição. Porém, o herói se vê obrigado a embarcar em uma aventura para salvar a jovem Rainha da Inglaterra à beira da morte. Ao lado do personagem de Downey Jr, estarão os mais diversos bichos e seu jovem aprendiz Tommy (Harry Collett). 

O que dizer de bom? Bem, os efeitos visuais são, de fato, incríveis. Exceto pelo leãozinho que fica atrás da versão de “O Rei Leão”, os demais animais impressionam pelo realismo, especialmente, o gorila com voz na versão em inglês de Rami Malek (“Bohemian Rhapsody”). De resto, só agradecer que o pesadelo dura 97 minutos. 

CONSTRANGIMENTOS EM SÉRIE 

Escrito por quatro (!!!!) roteiristas, “Dolittle” não consegue se achar em momento algum. Não há qualquer desenvolvimento mínimo dos personagens, a narração surge e some do nada, o fiapo de história claramente não se sustenta para envolver o público a se importar com aquilo e as viradas na trama são possíveis de decifrar por uma criança de sete anos com 30 minutos de antecedência.  

Para disfarçar, ou melhor, nos enganar, acelera-se o ritmo na montagem para dar um pretenso dinamismo, gerando uma confusão generalizada em que não se sabe necessariamente o que está acontecendo muito menos a pretensão daquilo.  

O humor também mais constrange do que consegue fazer rir. Do mergulho de Dolittle no aquário ao avestruz derrubando o que vê pela frente no Palácio de Buckingham tudo é tão sem inspiração a ponto de se questionar se os roteiristas e o diretor Stephen Gaghan (como alguém que fez “Syriana” foi parar aqui?) qual público riria daquilo, pois, nem mesmo crianças são bobas a esse ponto. Não à toa o desfecho de “Dolittle” se resume a constrangedores peidos e uma operação no ânus de um dragão – sim, este é o nível. 

Se ver gente do naipe de Jim Broadbent, Michael Sheen, Antonio Banderas e todo o time de dubladores desperdiçada a tal ponto chega a doer pelo constrangimento, o sentimento em relação a Robert Downey Jr é de frustração. Não apenas por ser o produtor executivo de tamanha bomba e permitir se colocar à frente de um projeto tão pobre, mas, pela postura preguiçosa em não colocar um mísero traço de personalidade neste Dolittle, apenas reciclando cacoetes de Tony Stark, Sherlock Holmes e do Jack Sparrow de Johnny Depp. Não duvido que o astro siga por este caminho na carreira daqui em diante (ele mesmo já insinuou isso), o que seria um desperdício de carisma e talento raro de ser visto em Hollywood. 

A vazia sala capaz de comportar mais de 350 pessoas onde fui assistir “Dolittle” não era apenas um impacto de um sábado gordo de carnaval. A falta de entusiasmo do público deixa claro que não basta incríveis efeitos visuais, o astro do momento e um investimento absurdo de marketing. Sem o mínimo de qualidade, não há obra que se sustente.