O penúltimo episódio de “Succession” traz três das maiores marcas deste sucesso da HBO: 1) a impressionante capacidade em mesclar suspense, drama e muito humor ao mesmo tempo; 2) a rapidez nas mudanças dos destinos dos protagonistas; e 3) um dos maiores vilões da história da televisão – mesmo que, aqui, esteja dentro do caixão. 

“Igreja e Estado” inicia no dia seguinte à ATN anunciar por conta própria a vitória do fascista Jeryd Mencken (Justin Kirk) para a presidência dos EUA e data do funeral de Logan Roy (Brian Cox). A tensão máxima é palpável com pessoas correndo pelas ruas de Nova York ao som de sirenes de polícia para todos os lados e imagens de violentos protestos ao redor do país na televisão. O desespero de Rava (Natalie Gold), ex-esposa de Kendall (Jeremy Strong), ilustra a panela de pressão. Responsável por importantes episódios de “Game of Thrones” e do competente “O Menu”, Mark Mylod, porém, dirige esta dança do caos com elevadas doses de acidez impressionante. 

De todos os episódios desta última temporada de “Succession”, nenhum possui momentos tão cínicos e hilários como “Igreja e Estado”. Da zoeira de Lukas Matsson (Alexander Skarsgard) com o tempo de existência real da democracia nos EUA passando pelo genial infográfico do jornal até os encontros das exs de Logan, somos brindados com uma sequência de tapas na hipocrisia daquela elite esnobe em todas as suas contradições e discursos contrários à prática, a qual tem a oportunidade de se despedir do homem responsável por forjar muito daquela realidade. No teatro armado para a despedida de Logan, os jogos pelo poder continuam rolando com a igreja virando um palco de negociações e traições, algo capaz de deixar Logan com orgulho. 

AS TRANSFORMAÇÕES RÁPIDAs

O picadeiro, entretanto, pode ser um fardo pesado demais para alguns. Que o diga Roman (Kieran Culkin): o canalha detonador do caos nos EUA (e consequentemente no mundo) começa o episódio na crista da onda após ajudar a eleger Mencken. Todo pimpão na cobertura do apartamento com uma vista arrebatadora de Nova York, o sujeito tem a consciência que um discurso arrasador no velório seria o suficiente para assumir a dianteira na sucessão da WayStar. A confiança, entretanto, não resiste ao fantasma do pai, figura que tanto o humilhou e, mesmo assim, nutria tanto amor. Roman desaba diante de todos, enrolado nas próprias anotações e com uma voz que lembra uma criança indefesa pedindo socorro aos irmãos mais velhos, deixando muito claro quem, no fundo, ele sempre foi. 

Cabe a Kendall e Shiv segurar o rojão: o primeiro faz um discurso potente ao aproveitar a deixa do tio Ewan (James Cromwell) para dosar entre o filho que sente a falta do pai e empresário durão que construiu com toda a sua ambição aquele país – para o bem ou para mal. Em tom hesitante, a personagem de Sarah Snook recorda a figura que recebia de presidentes a reis e, ao mesmo tempo, metia medo nos filhos com um grito que somente Logan era capaz de fazer. Diante daquela imponente plateia, a dianteira parece estar com o irmão. 

Mas, lembra da segunda característica marcante de “Succession”? A rapidez das transformações dos jogos de poder? Pois, Shiv consegue uma estratégia persuasiva para fazer o “nazista” Mencken ser mais simpático com a proposta do sueco branco Matsson. Isso tudo em um momento impagável de completo desespero dos irmãos para tentar extrair algum tipo de vantagem do futuro morador da Casa Branca. A dança que a câmera de Mylod faz ao redor do presidente eleito e da família Roy joga o público como testemunhas definitivas de figuras que tentam, mas, nunca serão iguais ao pai ao tratar o poder.  

Perto do fim, “Succession” marca em “Igreja e Estado” aquele que, talvez, seja o verdadeiro dilema da série: mais do que saber quem será o sucessor de Logan na WayStar, a verdadeira pergunta é saber se Connor, Kendall, Shiv e Roman serão capazes de seguir seus próprios caminhos de maneira realmente plena após tantos anos de abuso e subjugados a um tirano impiedoso e, como diz Ewan, um sujeito que “alimentou as chamas dos corações dos homens”. Ao que tudo indica, o quarteto sucumbirá.