“Lost”, “Mad Men” e “Os Sopranos” trazem alguns dos melhores episódios-pilotos da história das séries. São capítulos capazes tanto de sobreviverem por si só tamanho o brilhantismo como também definem sobre o que será tudo que veremos dali em diante. Já outros são mais protocolares apostando no seguro para cativar o público e, em seguida, dar passos mais ousados. “The Last of Us” encontra-se neste time após o bom piloto de 1h30 de duração. 

Esta escolha dos showrunners Neil Druckmann e Craig Mazin não é para menos: estamos diante da adaptação de um dos maiores games de todos os tempos, uma obra conhecida pelo cuidado da história, o desenvolvimento cuidadoso dos personagens e da narrativa como um todo. Cientes do vespeiro que é mexer com objetos de cultos da cultura pop, os dois optam por referências diretas ao game e apresentar o universo de “The Last of Us” da forma mais precisa e direta possível. 

CONQUISTANDO OS FÃS DO GAME 

Com um pequeno prólogo explicativo sobre um fungo capaz de derrotar a humanidade em um nível maior do que uma pandemia causada por um vírus (oi Covid), o piloto se divide em duas partes: a primeira acompanha o início do surto em 2003 a partir da cidade de Austin, no Texas, com Joel (Pedro Pascal) e a filha Sarah (Nico Parker). Estamos diante de um dia normal – a preguiça da manhã, a ida ao colégio, a compra de um presente, a passagem na casa da vizinha. 

Pequenos sinais, entretanto, vão mostrando, porém, que aquele não é um dia normal: a notícia do caos em uma cidade distante demais para nos importarmos (oi Covid 2), a pressa da atendente em fechar loja, os carros de polícia passando em alta velocidade, os jatos sobrevoando uma tranquila vizinhança. Nada novo para quem já viu algum filme de terror. A letargia da garota diante destes alertas, porém, chega a um ponto que fica impossível não recordar de “Todo Mundo Quase Morto”, de Edgar Wright. Dei uma leve risada, confesso.  

Mazin, entretanto, se recupera logo adiante ao injetar ação em “The Last of Us”, especialmente, na fuga em alta velocidade dentro do carro. Com a câmera situada praticamente na visão do motorista para emular a jogabilidade do game, a série presta homenagem a sua origem como também demonstra inteligência para conquistar os fãs com referências ao jogo – basta ver a alegria deles no Twitter. O ápice, como não poderia deixar de ser, está no emocionante desfecho, uma recriação quase exata em live-action do game. 

EPISÓDIO COMPETENTE 

Já a segunda parte do piloto de “The Last of Us” dá uma reduzida no ritmo para contextualizar os fãs e os recém-chegados sobre o mundo pós-surto, agora, em 2023. Com as cidades destruídas, temos uma junta militar autoritária mandando em tudo e matando quem não segue as ordens. Diante disso, surgem grupos rebeldes liderados por pessoas como Marlene (Merle Dandridge), enquanto Joel se mostra preocupado pela falta de notícias com Tommy (Gabriel Luna), amigo e última ligação dele com o passado. Por fim, temos Ellie (Bella Ramsey), uma garota com um segredo capaz de mudar os rumos daquele universo apocalíptico. 

Pouca coisa marcante acontece neste trecho ainda que fique longe de ser desinteressante. Sabemos o que fazem aqueles novos personagens, mas, quase nada de suas personalidades, algo, claro, que os futuros episódios devem resolver sem dificuldade. Nem mesmo o início do relacionamento entre Joel e Ellie chega a render – no máximo, vale observar a empolgação quase inocente da garota em conseguir estar pela primeira vez do lado externo da comunidade sitiada. Neste pequeno gesto, a série dimensiona de forma sutil as diferenças dos traumas de cada geração diante daquela tragédia. 

Não foi nem de longe um piloto inesquecível, mas, “The Last of Us” estabelece bem o seu universo apocalíptico, apresenta seus personagens dignamente, traz um elenco carismático e dá as referências necessárias para agradar aos fãs do game. Depois de jogar no seguro, pode ousar um pouco mais.