“Triangle of Sadness”, novo filme de Ruben Östlund, é uma baita demonstração de que raios não caem duas vezes no mesmo lugar. O vencedor da Palma de Ouro em Cannes este ano coloca o sueco no seletíssimo grupo de diretores que levaram o prêmio por dois longas consecutivos (só Bille August e Michael Haneke dividem a honra). No entanto, o projeto, exibido no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary, é uma obra falha e caricata que não engaja para além de sua premissa. 

Ei-la: o casal de modelos Carl e Yaya (Harris Dickinson e Charlbi Dean) ganha uma passagem para um cruzeiro para super-ricos. Lá, as interações entre passageiros e tripulação vão ficando cada vez mais incômodas. Eventualmente, o capitão (um magnético Woody Harrelson) decide abandonar o script da situação e as coisas saem terrivelmente do controle. 

DIVERSOS TIPOS DE HUMOR

Östlund, que também escreveu o roteiro, tem um talento inato para prender o espectador em situações extremamente desconfortáveis. A base do seu humor é a ideia de que a incapacidade (ou inabilidade) de alguém obedecer ao instinto de fuga sob ataque é algo hilário. Há muitos momentos aqui que exploram essa sua habilidade, como a cena do jantar logo no início do filme. 

Porém, mesmo nesses instantes bem-sucedidos, Östlund deixa a vontade de fazer um ponto se tornar um obstáculo no caminho de surpreender o espectador e de levar a narrativa para um lugar inesperado. A cena mencionada, por exemplo, coloca em ação um confronto posterior no qual é possível antecipar os argumentos de Carl quase linha por linha. 

Separadamente, grande parte das gags funciona – em parte porque é divertido ver o diretor brincar com várias vertentes cômicas. Tem um pouco de tudo: humor pastelão, comédia de dupla, tiradas escatológicas, etc. O problema é quando “Triangle of Sadness” tenta alçar voos maiores, se propondo como uma análise da monetização da imagem e da moralidade do acúmulo de capital. A despeito de seu som e fúria, o longa não tem a sutileza necessária para explorar seus temas profundos. 

RUMO AO FUNDO DO MAR

Na celeuma, o elenco dá tudo de si, com destaques que quase valem o ingresso. Dickinson é uma hilária revelação. Seu timing é impecável e ele faz rir mesmo quando a produção se perde completamente durante o arrastado terceiro ato. Já Harrelson faz o tipo de louco adorável que ele provavelmente consegue interpretar dormindo, mas isso não descredita sua performance. O duelo ideológico entre seu personagem e o magnata Dimitry (Zlatko Burić, também incrível) é a alma do filme. 

Apesar disso, o longa constantemente se rende a críticas anticapitalistas óbvias – quase juvenis – que mostram um Östlund longe do vigor de obras como “Força Maior” e o também vencedor da Palma de Ouro “The Square”. Sobra vontade de dizer algo contundente sobre a sociedade contemporânea, mas o peso das intenções de “Triangle of Sadness” o levam direto para o fundo do mar.

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