Há uma plasticidade visual que conduz todo o trabalho de Halder Gomes (“Cine Holliúdy”) em “Vermelho Monet”. O filme protagonizado por Chico Diaz, Maria Fernanda Cândido e Samantha Müller nos conduz pelo submundo do mercado de artes plásticas apresentando um visual arrojado e ousado que brinca com a metalinguagem. 

Acompanhamos três histórias e perspectivas sobre a arte. Müller vive uma atriz brasileira que parte para Portugal a fim de protagonizar um filme, já Cândido interpreta uma agenciadora de obras artísticas, enquanto Diaz é um pintor que sofre de uma doença a qual o faz perder a percepção das cores, enxergando tudo em preto e branco. O artista vivencia uma busca por encontrar inspiração em corpos femininos, até que a vista cor nos cabelos vermelhos de Florence (Müller) e se torna assombrado pela coloração e a moça. 

CHICO DIAZ E MARIA FERNANDA BRILHAM

O roteiro escrito também por Halder Gomes aborda cada um dos personagens como universos independentes, transpassando suas tramas de forma morosa. Eles representam partes específicas da construção de uma obra artística, sendo o artista, a musa e a ligação entre ambos e a sociedade; conforme o filme se desenrola, Gomes busca criar diálogos e situações que nos façam perceber como cada persona tem seu lugar na roda artística e os processos que os envolvem. 

Esta escolha é ousada e arriscada, uma vez que não há simplicidade em encontrar um ponto de equilíbrio que possibilite explorar as narrativas com equidade, podendo haver algum núcleo que seja mais prejudicado na divisão e atenção do público. Em “Vermelho Monet”, Diaz e Cândido se sobressaem em relação a Müller. Além da experiência dos dois artistas e da verossimilhança que imprimem em tela, a dramaticidade de suas tramas é mais palpável que a de Florence. Em certos momentos, os diálogos dela, por exemplo, parecem artificiais e pouco fluidos. Os relacionamentos que constroem no decorrer do filme também parecem frágeis e descartáveis, o que torna mais difícil ainda uma identificação com o público. 

Em paralelo, Johannes Van Almeida (Diaz) é o personagem mais multifacetado de “Vermelho Monet”. Sua procura por uma cor que lhe dê inspiração, o fato de encontrá-la na memória que carrega da visão da amada e o cuidado que tem por ela em seu estado vegetativo criam simpatia por um indivíduo que engana mercenas e parece a beira de um colapso mental. Suas explosões e comedimentos são os pontos fortes do filme ao lado da racionalidade da personagem de Cândido. 

paixão, desejo e o processo artístico

A abordagem escolhida por Helder nos encaminha dessa forma a um espiral metalinguístico que se concentra em debater as camadas da arte. Apresenta suas variadas etapas percorrendo a produção, o consumo e a disseminação; pauta, dentro desse cenário, como os seres humanos contribuem e articulam os acontecimentos neste segmento. Tais elementos o tornam um exemplar curioso para o cinema brasileiro e endossam a gama de narrativas existentes a serem exploradas pela nossa arte. 

Quanto ao visual, “Vermelho Monet”, como o nome indica, se embebeda pelas cores e por meio delas delineia seus quadros e planos. A fotografia de Carina Sanginitto é instigante e um recurso fortemente atrelado à narrativa. Os enquadramentos baseiam-se em pinturas popularmente conhecidas e que são referenciadas em momentos estratégicos do filme, o que lhe oferece uma beleza singular e potente. 

O trabalho com as cores se mostra ainda na utilização de luz, sombra e o preto e o branco da visão de Johannes, o resultado é uma pintura contínua e a plasticidade que enchem a tela. O contraste entre as cores nutre também a ebulição de sentimentos que permeiam os personagens, por isso, por exemplo, o vermelho e suas tonalidades se mostram caros e elementos constante entre indivíduos que tem suas paixões e desejos a flor da pele. 

“Vermelho Monet” aponta novos caminhos cinematográficos a Halder Gomes e oferece uma pequena amostra plástica e rica visualmente sobre o processo artístico, a paixão e o desejo. Neste sentido, a trama cresce de acordo com suas experimentações, mas se perde entre tantos pontos de vista e histórias fracas que apenas saturam o trajeto.