Em 1956, Sidney Lumet era um jovem diretor escolado na Broadway e na televisão. Assim como aconteceu com outras promessas da época, seu talento logo chamou a atenção da Costa Leste dos Estados Unidos. Lá, o ator Henry Fonda, já estabelecido, queria Lumet comandando a adaptação de um roteiro de Reginald Rose chamado “12 Angry Men”.

A história já havia sido contada dois anos antes, na televisão. No entanto, era uma premissa boa demais para não ser explorada pelo cinema. Afinal, em todos os ditos “dramas de julgamento”, só vemos o que acontece no tribunal. E as horas entre os depoimentos e o veredicto? E esse tal grupo de pessoas confinadas em uma sala que decide basicamente o futuro de uma pessoa que pode ser culpada, mas que também pode estar sendo acusada de um crime que não cometeu?

Lumet aproveitou o bom roteiro e colocou o pé na porta, entregando um clássico logo de cara. Muito já se foi escrito sobre “12 Homens e Uma Sentença”. Por isso, resolvi tentar mostrar por que eu acho que esse é um filme fundamental na estante de quem respira cinema ou de quem apenas gosta de uma boa história.

1. O roteiro

O começo de tudo. O roteiro inteligente de Rose acerta em todos os momentos, da apresentação dos personagens ao desfecho da história, passando pela forma como a trama evolui, como vamos criando as imagens do crime na cabeça, só pelos diálogos e pelos discursos fortes dos personagens, a maneira como vemos a “ficha” dos jurados caindo… Lumet tem mérito, mas o jogo já estava quase ganho antes mesmo de ele entrar em campo.

2. Sidney Lumet

Trabalhar com apenas um cenário pode ser uma tarefa ingrata. É difícil não descambar para o “teleteatro”. No entanto, Lumet foge da obviedade das ‘quatro paredes’ e brinca com o mise-en-scène. Vemos aquela sala se tornar grande o suficiente para 12 homens recriarem a cena do crime, e, ao mesmo tempo, claustrofóbica a ponto de suarmos tanto quanto os personagens.

3. O casting

O “jurado número 8” pode até roubar a cena e ser considerado protagonista, mas todos os personagens dentro daquela sala são fundamentais para o desenvolvimento da história. Por isso, todos os atores parecem viver intensamente seus personagens. O resultado é palpável e fala alto mesmo quando ainda não sabemos nada sobre eles. Destaco o trabalho de Lee J. Cobb, que constrói um personagem com alma de antagonista, mas, que na verdade, é apenas um homem frustrado, como vemos nos últimos minutos da história.

12 Homens e uma Sentença: 12 Razões para um Clássico4. Henry Fonda

Lumet adorava trabalhar com atores (gente, ele insistiu até no Vin Diesel!). Quando se encontrava com um grande talento, era lindo de ver. Foi assim com Al Pacino em “Serpico” e “Um Dia de Cão”, Peter Finch, Faye Dunaway e Beatrice Straight em “Rede de Intrigas” e até mesmo com seu derradeiro filme, “Antes Que o Diabo Saiba que Você Está Morto”, onde dirigiu Philip Seymour Hoffman. Com Fonda, não foi diferente. O “jurado número 8” é convicto e convincente. O ator entrega um trabalho cheio de nuances, do sorriso discreto quando um personagem vai para o “seu” lado à culpa por tirar do jurado vivido por Cobb as suas lembranças mais doloridas. O “queridinho da América” também parece por vezes isolado, acuado – sentimentos que Fonda trabalha com perfeição.

5. A energia

“12 Homens e uma Sentença” é claustrofóbico, não apenas por ser quase todo ambientado em um espaço fechado. Ele é agoniante. Podemos até descobrir como termina, mas o desenrolar da trama é cheio de pequenas surpresas. Em apenas uma hora e meia, vemos uma decisão que deve ter durado beeeeem mais que 96 minutos. O filme pode até não ter sido feito em plano-sequência e tampouco roda em “tempo real”, mas funciona com a mesma intensidade e o realismo de uma produção sem cortes.

6. Os close-ups

Nenhum close-up é feito sem propósito aqui, como podemos perceber pela forma como Lumet pontua as reações dos outros personagens – cito um momento em que todos os jurados gritam e discutem e vemos apenas Henry Fonda, como se estivéssemos com ele esse tempo todo. No entanto, talvez o close mais importante seja o do “jurado 9”, propositadamente não tão explorado quanto os outros personagens, mas dono das tiradas mais interessantes da história.

7. A relevância social da história

Ao discordar dos outros jurados, o personagem de Henry Fonda diz que não sabe se o réu em questão é culpado ou não, mas que não podia jogá-lo para a morte sem ao menos discutir o ocorrido. No fim das contas, não é isso o que muitos fazem? Usando um pouco de lógica, cada um dos jurados vão juntando as peças do quebra-cabeça e mostrando o quão frágil pode ser a Justiça.

Lee J Cobb em 12 Homens e uma Sentença8. Os detalhes

O terno branco de Fonda. Os óculos e o gel no cabelo do jurado ‘almofadinha’. A trilha sonora (quase) inexistente. A forma como o outro jurado que quer sair para ver o jogo de beisebol não para de olhar para o relógio. O suor que escorre pelas testas de cada um deles. “12 Homens…” é um filme de detalhes, tanto na sua trama (da faca que teria sido usada para matar a vítima do crime aos óculos ‘esquecidos’) quanto na sua produção.

9. A resolução

Com um filme que evolui como um crescendo, há o risco de a resolução parecer apressada. Contudo, essa produção tem um fim tão bom quanto os outros 90 minutos que acompanhamos. À medida que cada um dos jurados “cede” e percebe que a verdade é outra, o desespero e a tensão aumentam. Será que o “jurado 3”, experiente, cansado e cheio dos argumentos, vai seguir com a sua convicção até o fim? O roteiro nos entrega um fim que pode parecer apressado e “fácil” demais para uns, mas, para mim, é perfeito.

10. “A frase”

Ok, as frases marcantes do filme são parte do roteiro e estou trapaceando, mas quem se importa? Não dá para não destacar “Hey! What’s your name?”. É nesse momento que paramos e percebemos que passamos o filme todo sem saber os nomes dos personagens. E fez alguma diferença?

11. O reconhecimento

Prêmios não são a coisa mais importante do mundo, mas são bem-vindos. “12 Homens…” venceu o Urso de Ouro no Festival de Berlim e recebeu três indicações ao Oscar – incluindo melhor filme. Para falar a verdade, a Academia poderia ter sido mais generosa, mas, se pararmos para pensar que a década de 50 passou em branco para clássicos como “Um Corpo Que Cai”, não dá para dizer que o filme está em má companhia.

12. O legado

“12 Homens e Uma Sentença” foi refilmado para a TV em 1997, com direção de William Friedkin e um elenco que contava com Jack Lemmon (no papel que foi de Fonda), George C. Scott e James Gandolfini. A produção foi elogiada e ganhou prêmios tanto no Emmy quanto no Globo de Ouro (Lemmon perdeu, mas o vencedor daquele ano ficou tão emocionado que deu o troféu para o veterano!). Os “dramas de tribunais” continuaram firmes e fortes nas décadas que se seguiram, tanto no cinema quanto na TV. Mas talvez o maior legado de “12 Homens…” foi ter nos apresentado ao cinema sem firulas que Lumet iria continuar entregando nas décadas que se seguiram.

12 Homens e uma Sentença: 12 Razões para um Clássico