De certa forma, o Dia das Bruxas ficou marcado no imaginário do cinema de horror como a data ideal para um psicopata maníaco trucidar jovens com a libido sexual exacerbada em alguma cidade, fraternidade ou acampamento fictício. A culpa disso atende pelo nome de John Carpenter que, em 1978, lançou “Halloween – A Noite do Terror”, filme que abriu as portas do cinema americano de terror para um lixo de mercado viável financeiramente. Estas obras de homicidas ficaram conhecidos como Slasher, um subgênero bastante conhecido no universo do medo.

A sua principal fonte de influência foi o cinema italiano da década de 70 com os seus famosos Giallos (que em breve vai ganhar também um especial aqui no Cine Set). O formato estilizado do assassino misterioso de luvas pretas e uma arma cortante existentes nas produções italianas deu lugar nos Slasher a um psicopata assassino que matava de forma brutal e violenta adolescentes preocupados apenas em se drogar e fazer sexo.

Grande parte dos filmes foram marcados por orçamentos modestos e a precariedade nos roteiros. Logo, eles receberam a alcunha de obras “bastardas” dentro do cinema de terror. Se Carpenter indicou o caminho com o seu bicho-papão Michael Myers, a consolidação do Slasher veio com o trabalho que até hoje é conhecido como a sua marca registrada: “Sexta-Feira 13” (1980), de Sean Cunningham.

Sem dúvida, o filme de Cunningham foi o que sedimentou as regras (e clichês) do Slasher: mortes violentas, sexualidade, nudez, um assassino impiedoso e misterioso, além do famoso susto final na cena derradeira. Não é à toa que o sucesso impulsionou a produção de aproximadamente 40 filmes entre os anos de 1980 e 1981. Não faltaram adolescentes sendo atacados por diversos psicopatas no cinema.

Para este especial do Cine Set priorizei obras mais obscuras dentro do gênero. São os melhores? Talvez sim, talvez não, mas com certeza são boas diversões. Por isso, franquias como “Sexta-Feira 13”, “A Hora do Pesadelo”, “Halloween” e “Brinquedo Assassino” ficaram de fora, até porque tudo o que poderia ser falado sobre eles com certeza já foi. Franquias mais atuais como “Pânico” e “Jogos Mortais” seguiram o mesmo caminho. Deixei de fora os clássicos “O Massacre da Serra Elétrica” (1974), de Tobe Hooper, e “Banho de Sangue” (1971) de Mario Bava – cineasta que, sem dúvida, foi o precursor deste tipo de filmes como também dos Giallos -, ambos obrigatórios de serem assistidos.

A lista consta com trabalhos poucos valorizados e que apresentam boas doses de violência gráfica – essencial para qualquer filme deste nível – além de um roteiro minimamente decente tanto em história quanto em personagens (não esqueçam que exigir qualidade neste quesito no Slasher é querer demais). Antes de começar o Top 5, gostaria de fazer uma menção honrosa a dois filmes:

O Massacre (Slumber Party Massacre, 1982, de Amy Jones)

O grande barato deste filme é que ele é totalmente feminino, isto é, dirigido e escrito por mulheres, o que foge da misoginia existente nos Slasher tradicionais. Funciona como uma bela metáfora da repressão e liberdade sexual feminina. Tem boas mortes, uma duração curta e uma atmosfera interessante – os 20 minutos iniciais e finais são tensos. O assassino Russ Thorn utiliza uma broca (quer conotação mais fálica que esta?) para exterminar suas pobres vítimas. A produção é do lendário Roger Corman.

Alta Tensão (Haute Tension, 2003 de Alexandre Aja)

Antes de ser “exportado” aos EUA para dirigir remakes, o francês Alexandre Aja dirigiu este brutal e violento filme com ótimas referências ao finado Slasher, que nesta década já caminhava como um morto-vivo. Pode-se dizer que na década de 2000, o horror francês mostrou que não apenas de amor ou romance a terra de Truffaut vive. O sangue é tão forte que em alguns momentos você tem a impressão que algo está respingando em você. Aja sabe como enquadrar a violência deixando o público com os nervos a mil. Destaque para New Born do Muse embalando a trilha enquanto o sangue jorra e os ótimos efeitos de maquiagem do mestre Giannetto de Rossi, habitual parceiro de Lucio Fulci.

Depois das considerações, vamos ao TOP 5 Slasher sem ordem de preferência. Espero que gostem da matança:

1. Acampamento Sinistro (Sleepway Camp, 1983, de Robert Hiltzik)

Apesar de grande parte das mortes aconteceram off-screen (fora da tela), este Slasher até hoje é cultuado pelos seus temas polêmicos e o final impactante (sem exagero nenhum, o melhor dentro do gênero). Feito sob a bagatela de 350 mil dólares, o trabalho de Hiltzik é ousado e bizarro, a começar pelo próprio diretor, que dedicou o filme para mãe, uma homenagem estranha, ainda mais pelo enredo do filme. Com um roteiro que aborda diversas esquisitices, acabou ganhando outras continuações (quatro no total), sendo que apenas na última Hiltzik retornou à direção. Ah!!! Aquele final chocante continua surpreendentemente saboroso.

2. Chamas da Morte/A Vingança de Cropsy (The Burning, 1981, de Tony Maylam)

Esse é um dos clássicos que passava na Sessão das Dez do SBT. Quem não se lembra da divertida tagline do filme “Não olhe… ele vai vê-lo. Não respire… ele vai ouvi-lo. Não se mexa… Você está morto!”. Cropsy é um vilão cruel marcante, principalmente por usar uma afiada tesoura de jardinagem como instrumento de vingança. A principal virtude do filme é ser um dos raros Slasher preocupado em contar o fiapo de história, além de nos apresentar personagens carismáticos e humanos. O diretor Tony Maylam, por sinal, os desenvolve dentro de um suspense eficiente, sem qualquer pressa – a primeira morte só acontece após 40 minutos.

E vale destacar uma cena em particular que é a obra-prima dos filmes de psicopata: a famosa “cena da jangada“  filmada pelo diretor com uma brutalidade impressionante. Ela não dura nem 1 minuto, mas é marcada por tensão e violência graças ao ótimo trabalho de edição. É esta sequência que representa o ápice do filme e valoriza o primoroso trabalho de efeitos especiais de Tom Savini que recusou fazer a sequência de “Sexta-Feira 13” para trabalhar neste.

Uma curiosidade de bastidores: ele foi escrito e produzido pelos irmãos Bob e Harvey Weinstein como projeto embrionário da Miramax. E também marcou a estreia de algumas estrelas no cinema como Jason Alexander, Holly Hunter e Fisher Stevens. Um horror nostálgico que não se faz mais nos dias de hoje com a mesma intensidade.

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3. Quem Matou Rosemary? (The Prowler, 1981, de Joseph Zitto)

Apesar do título nacional insinuar que estamos diante de uma adaptação cinematográfica de um romance de mistério de Agatha Christie ou Arthur Conan Doyle, a verdade é que “Quem Matou Rosemary?” é uma pequena pérola. Mas qual é a diferença dele para os outros exemplares dentro do gênero, você deve estar me perguntando? Eu posso lhe responder da seguinte forma: é o gore e a violência excessiva para nenhum fã botar defeito ou reclamar, graças à qualidade do trabalho de Tom Savini (sim, ele mais uma vez, o grande astro de bastidores do Slasher), que estava inspirado na matança – e na qual ele próprio alega ser o seu melhor trabalho no cinema.

Há pelo menos umas 3 cenas primorosas de violência – uma delas referência direta a Psicose”, só que turbinada com muito sangue. O diretor Joseph Zitto acerta também na boa atmosfera de suspense e mistério. Constrói as cenas como um verdadeiro artesão do cinema de horror e oferece altas doses de violência e mortes criativas sempre explícitas. Não é à toa que ele assumiu a direção da quarta sequência de “Sexta-feira 13”, onde voltou a trabalhar com Savini.

4. Torso (I corpi presentano tracce di violenza carnale, 1973, de Sergio Martino)

“Torso” já é um filme atraente pelo seu ótimo título – traduzido literamente como “o corpo apresentando traços de violência carnal”. É uma obra torta, grosseira e suja na sua essência barroca crua, que seduz pelo estilo voyeurístico.

Martino consegue criar um filme híbrido, na qual mistura subgêneros juntando na mesma barca o Slasher e o Giallo. Foge do lugar comum dos seus trabalhos anteriores com tramas rocambolescas para desenvolver apenas o enredo básico, mas compensado pelo apuro visual agressivo – a cena de assassinato em uma mata enlameada e enevoada é encenada de forma crua que conquista pelo estilo selvagem. Martino também sabe como poucos explorar a sensualidade feminina. Em outras palavras, “Torso” é uma aula pura de como emoldurar a violência carnal no cinema de horror.

5. Noite do Terror (Black Christmas, 1974, de Bob Clark)

Lembro de ter assistido o filme em uma das minhas madrugadas insones na adolescência em um sábado qualquer. Chamou-me atenção o certo cinismo e politicamente incorreto do filme, alinhado à história de um psicopata que ataca em uma fraternidade feminina na véspera de Natal. Antes de ser conhecido como  o pai da comédia sexual da década de 80 com “Porky’s – A Casa do Amor e do Riso”, o diretor Bob Clark se aventurou no cinema de horror com este ótimo slasher que eu, pessoalmente, considero o avô do gênero, pois foi lançado quatro anos antes do “Halloween” de Carpenter. Prioriza a construção do suspense e personagens em vez das mortes, diferente do que acontece em 90% dos trabalhos. Por isso é um baita filme carregado de um clima sombrio e ritmo intrigante

Por sinal, “Noite de Terror” tem diversas situações que não encontramos mais nos filmes de terror politicamente corretos nos dias atuais. Em uma das cenas, Barb (Margot Kidder, pré Lois Lane) oferece um copo de bebida alcoólica a uma criança, em um tom deliciosamente cínico. Clark explora com qualidade o recurso da câmera em primeira pessoa, transformando o seu assassino Billy em um personagem assustador, sem jamais que sua silhueta seja visualizada por completo pelo público. A música de Carl Zitter é sinistra e valoriza a atmosfera inquietante. Geralmente esquecido no subgênero, “Noite de Terror” teve, ainda mesmo que tardiamente, o reconhecimento de filme cult e clássico que merece.

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