Sabe aquele filme apontado pela crítica como clássico ou amado por grande parte do público e que você simplesmente não consegue entender o motivo de tanta admiração? A equipe do Cine Set escolhe suas heresias.

Caio Pimenta

a doce vida

Clássico: A Doce Vida (1960)

Tentei duas vezes terminar de assistir o grande clássico de Fellini. Consigo apreciar a beleza da sequência inicial ou a passagem estrelada por Marcello Mastroianni e Anita Ekberg na Fontana di Trevi, além de notar a crítica social àquela Roma vazia e supérflua. O envolvimento emocional, porém, passa longe. Seja na longa duração ou nos personagens sempre em um tom de exagero típico das obras italianas, não consigo ter paciência para o universo do cineasta. Não à toa que também sofri para chegar até o final do vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, “A Grande Beleza”.

benjamin button

Sucesso Recente: O Curioso Caso de Benjamin Button (2009)

Era um sábado à noite de fevereiro de 2009 quando fui ao Cinemark assistir o mais novo filme de David Fincher, diretor que sempre terei respeito por ter comandado “Seven” e “Clube da Luta”. As 10 indicações ao Oscar e Brad Pitt com Cate Blanchett no elenco deixavam o clima favorável para assistir uma obra-prima. Passada as quase três horas, a sensação era de se sentir lesado: repetição da história de “Forrest Gump”, uma trama arrastada e um personagem-título apático. Ainda bem que Fincher resolveu voltar para tramas mais cínicas com “A Rede Social” e “House of Cards”.

Diego Bauer

meu amigo totoro

Clássico: Meu Amigo Totoro (1995)

Antes de iniciar minha vida de cinéfilo tenho que admitir que nunca havia assistido a nenhum filme de Hayao Miyazaki. Quando fui ler ao seu respeito, vi que suas duas obras mais idolatradas eram A Viagem de Chihiro, e principalmente Meu Amigo Totoro, o qual tinha/tem críticas alçando-o ao posto de obra-prima. Foi com curiosidade que fui assistir a esse filme, e com enorme decepção o terminei. Até consigo enxergar a beleza da história das duas irmãs, a questão da doença da mãe, da mudança da cidade pro campo, a fuga para um mundo imaginário, mas… apesar de tudo isso, este filme me pareceu absolutamente maçante. A irmã mais nova, apesar de ter atitudes compreensíveis tendo em vista seu estado emocional, é insuportável (!!!!!!!), e o excesso de lentidão com que a trama se desenvolve, tornam assistir a este filme um verdadeiro teste para a paciência.

um estranho no lago

Sucesso Recente: Um Estranho no Lago (2013)

Filme que participou do Festival de Cannes do ano passado, e presença constante em muitas listas de melhores do ano, Um Estranho no Lago é daqueles filmes que te dá os elementos necessários para contar sua história, conta com um eficiente trabalho do seu elenco, e… mesmo assim consegue ser insuportavelmente chato. O tom radicalmente naturalista, misturado com os seus diálogos banais e entediantes, fazem com que a trama surja tão maçante quanto a sua linguagem, tornando o que é visto irrelevante, visto que o que quer que apareça, vai ser engolido por esse tédio interminável. Admito que o final é surpreendentemente tenso e provocou, pelo menos, uma vez alguma reação em mim ao não ser o sono, mas aí já era tarde demais.

Ivanildo Pereira

rastros de ódio

Clássico: Rastros de Ódio (1956)

Tenho um problema com Rastros de Ódio (1956) de John Ford, estrelado por John Wayne, considerado um dos maiores faroestes da história. Veja bem, não estou dizendo que o acho ruim, apenas muito superestimado. É a história do preconceituoso Ethan Edwards (Wayne), que passa anos à procura da sua sobrinha que foi raptada por índios e criada como um deles. Muita gente graúda admira esse filme: Francis Ford Coppola, Martin Scorsese, George Lucas (que o referenciou em Star Wars)… Já eu, do alto da minha pequena opinião, não consigo ver tantas qualidades. Para mim, o filme tem um humor meio fora de hora, o elenco (fora Wayne) é bem irregular, e o que poderia ser uma visão impactante do racismo americano é diluída por um final feliz meio forçado. Não entra nem no meu Top 5 do John Ford. Outros faroestes dele, como No Tempo das Diligências (1939) ou O Homem que Matou o Facínora (1962), são muito superiores.

o leitor

Sucesso Recente: O Leitor (2008)

Quando digo que também acho O Leitor (2008) superestimado, alguns me olham estranho.  Exceto por As Horas, o diretor Stephen Daldry nunca conseguiu me empolgar ou emocionar. Claro, a primeira parte é muito boa, mas quando entra em cena a discussão do Holocausto, o filme se transforma naquilo que chamo de “isca de Oscar”. É como se fossem dois filmes diferentes, e o segundo é aquele com um tema sério (que a Academia adora) e muitas oportunidades para os atores “atuarem”. A frieza das cenas de Ralph Fiennes tem pouco a ver com a atuação do jovem David Kross, e embora Kate Winslet realmente esteja muito bem, ela já fez trabalhos mais interessantes. Naquele mesmo ano, a atuação de Kate em Foi Apenas Um Sonho (2008) me impressionou mais do que a dela em O Leitor. E ela viu se tornar realidade a piadinha do seriado Extras: foi só fazer um filme sobre o Holocausto, que o Oscar veio.

Renildo Rodrigues

terra em transe

Clássico: Terra em Transe (1967)

Esse aí foi uma decepção dos meus anos de descoberta. Interessado em todos os nomes célebres das revistas de cinema, a presença unânime de Glauber Rocha como o maior diretor brasileiro bateu bem de frente com a decepção que foi este filme.

Confuso, estilizado demais, com um discurso oblíquo e um protagonista cujo “vazio” chega a ser ridículo (não percam a cena da “orgia”), Terra em Transe, eu iria descobrir depois, é o fruto mal-nascido do engajamento de um diretor que, não obstante ser um criador de imagens assombrosas (e este filme tem sua cota), estava encharcado de ideologia datada sobre “luta de classes”, e não tinha ideia de onde queria chegar.

Felizmente, algumas imagens belíssimas me fizeram acreditar que esse mesmo diretor podia ir bem mais longe com outro material, mais livre, mais “puro”, e ia mesmo: Deus e o Diabo na Terra do Sol e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro são cinema brasileiro, especificamente brasileiro, como nunca mais se soube fazer.

juno

Sucesso Recente: Juno (2007)

“Uma comédia de inteligência e frescor incomuns, com diálogos tão rápidos que você acha que os atores estão ligados na tomada”.

Esse comentário, orgulhosamente estampado na capa do filme, foi de Roger Ebert, um crítico que, em 46 anos de ofício, nunca pecou pela falta de entusiasmo. E ele não estava sozinho em seu julgamento: num caso incomum para uma comédia, com elenco e diretor semi-desconhecidos (Obrigado por Fumar pode ter tornado Jason Reitman célebre, mas só entre os cinéfilos), Juno esteve em quase todas as listas de melhores filmes de 2007, e sua protagonista (Ellen Page) causou verdadeiro frisson entre as adolescentes.

Confesso que, não fossem Amor Sem Escalas e Jovens Adultos, os dois brilhantes filmes posteriores de Reitman, eu juraria estar diante de um caso de miopia geral: Juno é engraçadinho, tem diálogos razoáveis e uma personagem charmosa, apesar de chata em boa parte da história. Mas isso certamente não justifica todo o oba-oba.

Susy Freitas

o sétimo selo

Clássico: O Sétimo Selo (1957)

Já tentei terminar de ver esse filme várias vezes, sem sucesso. O sono bate e nunca descubro como termina, o que é curioso para uma pessoa que vibra assistindo a filmes com o ritmo de “Caché” ou “Um Estranho no Lago” e faz maratona de “O Poderoso Chefão” de madrugada quando a insônia bate.

Acredito que ainda não cheguei na parte em que “O Sétimo Selo” se torna extremamente profundo e marcante a ponto de estar em praticamente todas as listas de melhores filmes. Isso ou talvez minhas expectativas tenham sido tão altas com esse filme que se tornaram inalcançáveis!

O mais curioso é que gosto bastante dos filmes de Ingmar Bergman na medida em que vou me aprofundando em sua filmografia; aliás, esse é um realizador que resisti até demais para conhecer mesmo sendo nome obrigatório para qualquer cinéfilo. Veio a paixão confessa por “Monica e o Desejo” ou por “Persona – Quando Duas Mulheres Pecam”, por exemplo, mas o coitado do “O Sétimo Selo” ainda aguarda a redenção comigo. Uma heresia inexplicável, confesso.

500 dias com ela

Sucesso Recente: (500) Dias Com Ela (2009)

Um filme apontado por muitos como, no mínimo, um novo pequeno clássico cult. No entanto, ao assistir a esse filme, ficou em mim uma sensação de estar comprando gato por lebre, mesmo tendo visto o filme sem expectativa nenhuma.

Meu ódio por “(500) Dias com Ela” cresceu de tal maneira que simplesmente desafia até hoje a posição analítica equilibrada de alguém que se propõe a escrever sobre filmes! A cada minuto que o filme rodava na tela, não conseguia parar de pensar em como eu desejava que o casal protagonista morresse, e essa sensação se cristalizou em mim, tamanha a falta de identificação que senti com tudo.

Na tentativa de superar o asco pelo filme e tentar analisa-lo, encaro-o como banal: o formato é mais tradicional que uma “Sessão da Tarde”, os personagens são estereotipados e a trilha sonora tem todos os clichês “indie” imagináveis, e não de uma maneira legal. O ódio pelo casal principal é um ponto de destaque nessa heresia, em especial pela protagonista feminina, que como toda boa “manic pixie dream girl”, presta um grande desserviço à representação das mulheres no cinema por sua imbecilidade vendida como “adorável”.