Depois da ficção-científica, o gênero cinematográfico que melhor explorou os avanços tecnológicos é o cinema de terror. Da crítica a ciência no clássico gótico de Frankenstein de Mary Shelley ao assustador A Mosca, passando pela manipulação televisiva de Videodrome do mesmo David Cronenberg, até chegar as fitas de VHS amaldiçoadas de Sadako/Samara em Ringu/ O Chamado e a utilização das fotografias fantasmagóricas no ótimo Os Espíritos – A morte está do seu lado, o terror e seu viés fantástico se adaptaram à evolução tecnológica, reinventando-se para inserir novos pesadelos no inconsciente do público.

É fato que o cinema de terror sempre questionou nossa realidade e contexto histórico em relação as ansiedades da era das informações. Nas últimas décadas, há um crescimento do que chamamos de iHorror que tem buscado explorar as redes sociais, aplicativos e tablets como ferramentas de instigar o medo no espectador. Infelizmente, o iHorror no cinema, tem produzido poucas obras relevantes ou bons filmes de terror. É comum você encontrar para cada exemplar eficiente como Pulse (2001) e Megan esta Desaparecida (2011), uma quinqualhada de filmes ruins como Chat – A Sala Negra (2010), Face da Morte (2012), Amizade Desfeita (2014), entre tantos outros.

Medo Viral, último lançamento no segmento, revela quatro situações:

  • 1) O iHorror sofreu um enorme bug de sistema com este novo filme;
  • 2) ele se assemelha aquela tristeza que bate, quando você olha para a tela do computador e percebe que depois de três horas baixando aquele arquivo importante, o download efetivado é de apenas 10%;
  • 3) é preferível fazer uma colonoscopia com arame farpado do que aguentar os 90 minutos do filme;
  • 4) se você é masoquista e gosta de ver tralhas do gênero fechando os olhos para a ruindade, Medo Viral é, definitivamente, o filme ideal para você.

Dirigido, produzido e escrito pelos irmãos Vang (Abel e Burlee), Medo segue um grupo de jovens abalado pela morte de uma colega de escola – situação apresentada na primeira cena do filme –  e que recebem posteriormente, o convite para baixar um aplicativo misterioso, passando a presenciar uma série de fenômenos estranhos causado por um vírus sobrenatural (!!!!) chamado de Mr.Bedevilled, capaz de identificar seus maiores temores para torná-los realidade.

A situação de Medo Viral já não é das melhores quando você descobre que o filme ficou dois anos engavetado (por que será, hein?) pela distribuidora nacional. Para completar, a história é o samba do crioulo doido nos clichês – longe de contagiar como a música homônima dos Demônios da Garoa -, que copia na maior cara dura (no caso dos irmãos Vang, é pura cara de pau) vários elementos de filmes de terror conhecidos, do slasher A Hora do Pesadelo até os filmes de fantasmas e monstros como O Chamado e IT – A Coisa.

Todos os conceitos da trama, são porcamente desenvolvidos. Ao tentar provocar sustos, Medo Viral se transforma numa paródia involuntária digna de uma continuação de Todo Mundo em Pânico. Os irmãos Vang reciclam ideias e concepções visuais de vários filmes. A ideia do vilão, Mr. Bedevilled se apropriar dos medos e materializá-los perante suas vítimas não deixa de ser uma cópia sem pudor nenhum de Pennywise de IT – A Coisa de Stephen King.

Soma-se a isso, as principais transformações que o vilão adquire para aterrorizar suas vítimas: uma idosa decrépita de feições distorcidas que é fisicamente idêntica aos fantasmas asiáticos acrobáticos do cinema de terror oriental (J-Horror), que faz parte, vejam só, coincidentemente da fantasia do personagem asiático; a jovem que tem medo de  palhaço e encontrará vários pela sua casa; a presença de um balão vermelho flutuando que não deixa de ser outra referência a Pennywise. A própria concepção do vilão é uma mistura de Hall 9000 com Jigsaw na sonoridade, mas visualmente é uma cópia descarada do Coringa. Essas são apenas algumas, de tantas outras apropriações de filmes do gênero, que Medo Viral se mostra realmente um vírus “copycat” por assimilar a gênese de horror, porém, os reproduz numa total burocraia, sem dar qualquer ressignificado a eles.

Perceber-se que o roteiro dos irmãos Vang parte de um pressuposto de boas ideias como a do aplicativo que conhece intimamente os segredos dos seus usuários, funcionando como uma metáfora do tempo que as pessoas gastam excessivamente com os celulares e também o medo que nossa intimidade possa ser compartilhada em redes e aplicativos sociais, inclusive uma das personagens passa por incomodo semelhante no filme, sendo este, o único contraponto criativo que a obra explora de como a tecnologia é nociva.

Infelizmente esta premissa original, é desperdiçada por uma estética que não funciona nem visualmente, nem como para estabelecer tensão e medo. A direção dos irmãos é marcada pela falta de inventividade. Ambos acreditam que para provocar sustos fáceis, os jumps scares, é necessário apenas movimentar de um lado para o outro a câmera, enquanto algo fora do quadro da imagem salte sobre ela para provocar medo no espectador. Há, pelo menos, 5 a 6 utilizadas através desta fórmula que mostram como os jumps scares são desconexos e repetitivos, sem qualquer planejamento minimamente digno na construção de tensão.

Medo Viral revela a extrema pobreza e falta de capacidade cinematográfica dos seus realizadores, incapaz de produzir um horror psicológico de qualidade. É o típico filme que quando você termina de assistir, têm a sensação que merece umas boas férias. Se é o pior filme de terror do ano? Bom, aí tem um páreo duro, afinal 2018 proporcionou outras aberrações como Exorcismos e Demônios e Slender Man. A verdade é, que talvez, seja melhor você gastar duas horas da sua vida vendo a tinta da parede secar do que perder o seu tempo assistindo Medo Viral.