Amizade Desfeita é simultaneamente um filme do seu tempo e um retorno de velhas fórmulas do gênero terror. Afinal, com a tecnologia e as redes sociais cada vez mais presentes em nossas vidas, era apenas questão de tempo aparecer um filme do gênero que as explorasse dentro da sua narrativa, trazendo uma abordagem diferente para o batido conceito do found-footage, os filmes de “filmagem encontrada” – aliás, Amizade Desfeita é uma produção da Blumhouse, companhia fundada graças ao sucesso da franquia Atividade Paranormal, o maior nome do found-footage dos últimos anos. Mesmo assim, sua história é a velha vingança do além-túmulo, estilo lenda urbana, com personagens antipáticos e momentos tão exagerados que até outra franquia famosa, Premonição, sentiria um pouco de “vergonha alheia” em mostrá-los.

O conceito central do filme é muito interessante: toda a história é contada pela tela do computador da heroína, a jovem Blaire (Shelley Henning) – seu nome é uma referência? Provavelmente… No início, ela navega como qualquer um de nós: põe uma música para tocar no Spotify, abre várias janelas e também um vídeo no YouTube, no qual vê o suicídio de uma conhecida, Laura Barns (Heather Sossaman). Ela também inicia uma conversa com o namorado via Skype. Algum tempo depois, outros amigos se intrometem e a conversa passa a envolver várias pessoas. No entanto, há um intruso nesse bate-papo: um participante não identificado que ninguém consegue expulsar. Esse intruso vai aos poucos envolvê-los num jogo mortal que tem algo a ver com a morte de Laura e o vídeo, postado alguns dias antes, com o propósito de humilhá-la e que a levou a se matar. Será o intruso o fantasma de Laura?

Curioso, não? A seu favor, o filme do diretor Leo Gabriadze procura, pelo menos no início, compor uma atmosfera de realidade para qualquer um que passe muito tempo navegando na internet. Os sons diegéticos são usados para estabelecer essa familiaridade: os sons característicos de um Mac sendo ligado ou da chamada do Skype são reconhecíveis, e em alguns momentos, até usados para criar tensão. E as “distorções” vistas quando alguém se movimenta na câmera digital, que acabam deformando os rostos em vários momentos, também ajudam a compor a nossa percepção daqueles personagens, já que nenhum deles é propriamente “gente boa”, como descobrimos ao longo da trama.

Além disso, Gabriadze não quebra o “tempo real” da sua narrativa inserindo flashbacks ou cortando para outros ambientes. Ficamos realmente confinados à percepção da protagonista, que usa páginas da internet, Facebook e vídeos para tentar compreender o que está acontecendo, e acompanhamos o seu raciocínio. Ao estruturar sua narrativa em torno do terror tecnológico, Gabriadze não consegue deixar de relacionar seu filme à velha tradição do terror japonês, sempre envolvendo os mais variados aparelhos assombrados – é até meio surpreendente que nenhum cineasta nipônico tenha pensado nessa ideia antes.

Infelizmente, toda essa atmosfera bem construída do início se perde do meio para o final do filme, quando os exageros começam e os atores precisam… bem… começar a atuar. Quanto mais tensa fica a trama, mais caricatos se tornam os desempenhos dos atores, a ponto do filme se tornar apenas uma gritaria completa por um longo trecho. Os desempenhos são, em geral, ruins, e as revelações sobre os personagens ao longo da trama os transformam em figuras completamente desagradáveis, a ponto de começarmos a torcer para que eles morram sob a influência do “fantasma da máquina”.

E as mortes também são tão exageradas que causam risos ao invés de medo: duas cenas em particular, envolvendo um liquidificador e uma escova de cabelo, são pérolas da comédia involuntária. Ao menos a segunda rende um meme, demonstrando que a assombração da história possui senso de humor… A essa altura, o filme já passou a imitar a principal estratégia da franquia Atividade Paranormal para causar medo: matar o espectador de susto com um ruído estrondoso na trilha sonora, geralmente o grito de alguém.

No fundo, Amizade Desfeita só é moderno na forma. Sua essência é igual à de outros títulos do terror como Baile de Formatura (1980) e Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado (1997): jovens idiotas causam involuntariamente uma morte e mais tarde alguém, que pode ou não ser a vítima revivida, resolve se vingar deles. O próprio nome da entidade maléfica na conversa de Skype, “Billie”, parece ser uma referencia ao maníaco de Noite do Terror (1974) de Bob Clark, e como o vilão daquele filme, o de Amizade Desfeita está bem próximo das suas vítimas. A ideia por trás do filme, claro, possui relevância para o público moderno: o que se faz na net geralmente tem consequências na vida real – essa é uma lição que muitos ainda precisam aprender – e o tema do cyberbullying é muito discutido hoje. Mas Amizade Desfeita, no fim das contas, é muito bobo e limitado para envolver ou assustar o espectador. É um tolo e meio chato passeio no trem assombrado do parque de diversões, e no qual a cena mais assustadora envolve uma substância vista saindo do corpo de Laura Barns, filmada enquanto está inconsciente. Essa substância também serve para definir o filme.