Em pouco tempo de carreira, JC Chandor conseguiu o que muitos cineastas levam toda uma filmografia para conseguir. O sucesso surpresa do bom “O Dia Antes do Fim” e a parceria com Robert Redford no visceral “Até o Fim” colocaram o diretor e roteirista no mapa. Por isso, não é de surpreender que seu terceiro filme tenha atraído dois dos atores mais requisitados da atualidade, Oscar Isaac e Jessica Chastain. Um dos títulos injustamente esquecidos durante a temporada de premiações, “O Ano Mais Violento” traz um Chandor cada vez mais maduro e à vontade na direção de atores.

crítica o ano mais violento jessica chastainEx-colegas de faculdade – nada mais, nada menos que a prestigiosa Julliard – na vida real, Isaac e Chastain atuam juntos pela primeira vez na tela grande como o casal Abel e Ana Morales. Ele, um imigrante em ascensão na carreira. Ela, a filha de um gângster que não tem problemas para se acostumar com a boa vida que o marido começa a lhe dar. A  produção tem como pano de fundo a  Nova York de 1981. O ano é realmente um dos mais violentos já registrados na história da cidade. Em meio a ameaças de morte e muita, mas muita corrupção, Abel tenta sobreviver e manter vivo o tal sonho americano.

Se alguns veem o terceiro trabalho do diretor como uma homenagem aos filmes de gângster/máfia dos anos 70 e 80, eu acredito que a produção faz uma reinvenção do tema. Aqui, não temos Michael e Kay Corleone. Os papeis são trocados e vemos Ana como uma espécie de Lady Macbeth do submundo, empurrando o marido ao dilema da moralidade – a propósito, como não fazer  trocadilho com o sobrenome do casal? – e do discurso “os fins justificam os meios”.

Isso fica bastante explícito em uma cena que parece solta, mas que é fundamental para o andamento da narrativa, onde vemos Ana matando um veado a sangue frio. Aqui, o mérito é todo de Chastain, em mais um desempenho impecável. Com um sorrisinho irônico, a atriz mostra que a personagem é capaz de tudo contra quem aparece em seu caminho – seja um animal na estrada ou homens que aparecem armados em sua casa, na calada da noite.

O trabalho de Chastain é auxiliado em grande estilo – ok, sem trocadilhos aqui – pela equipe de maquiagem, cabelo de figurino. O visual de Ana evoca a Elvira de Michelle Pfeiffer em “Scarface” e também tem um pouco de Carmela Soprano. Chastain faz jus à fama de camaleoa na pele de uma mulher vil e controladora até em momentos “menores”, como o em que aparece datilografando com um lápis para não quebrar as unhas enormes.

crítica o ano mais violento oscar isaacJá o guatemalenho Oscar Isaac me lembrou bastante o Al Pacino do primeiro “Poderoso Chefão”. É, sem dúvidas, um trabalho que merece colocá-lo junto aos Cumberbatchs e aos Fassbenders nas listas dos diretores de elenco mundo afora. A “brincadeira” de Chandor ao inverter os papeis e colocar Abel – olha mais um trocadilho interessante com nome de personagem – como a “vítima” das circunstâncias dá certo graças ao trabalho de Isaac, que consegue personificar bem o homem que luta para não se corromper ao mesmo passo que quer garantir a paz de sua família e o sucesso de seu negócio.

O sonho americano almejado por Abel, aliás, é muito bem acentuado pela direção de fotografia de “O Ano…”. O diretor de fotografia Bradford Young ousa ao escolher uma paleta de cores quentes para ilustrar o inverno de 1981 em Nova York, mas o resultado é de encher os olhos – o filme contém um dos quadros mais belos dessa safra 2014/15, com a imagem de Ana, Abel e Andrew (Albert Brooks, em mais uma participação competente) e Nova York e a paz que precede o clímax ao fundo. A fotografia é sufocante, seja a céu aberto ou às reuniões escuras a portas fechadas. Outro aspecto técnico digno de nota é a trilha sonora, que oscila entre o exagero oitentista e o som quase inaudível.

Apesar de ser ambientada no passado, “O Ano Mais Violento” dá novo frescor aos arquétipos do gênero ao distorcer os personagens do imigrante e da esposa e, claro, mostrar mais uma vez na tela do cinema que o sonho americano, às vezes, vem acompanhado de um banho de sangue.