A fórmula parece irresistível: um dos grandes produtores da história da TV norte-americana, David E. Kelley (“Ally McBeal”, “Big Little Lies”), a grife HBO (ou Max, agora) e uma história de um crime que realmente aconteceu. “Amor e Morte” chegou sob grande expectativa, com Elizabeth Olsen longe das crises da Feiticeira Escarlate, um Jesse Plemons pós-indicação ao Oscar por “Ataque dos Cães” e a assinatura de Lesli Linka Glatter, diretora com uma coleção extensa de trabalhos na TV e que finalmente colabora com E. Kelley. 

Os pormenores da mulher que matou a amiga – e esposa de seu amante – tiveram um início eclipsado pelo encerramento de “Succession” (ainda que com estreias de episódios às quintas-feiras), mas logo ganharam uma audiência fiel e um lugarzinho no TOP 10 semanal do serviço de streaming.  

Muitos fãs foram atraídos pelo tom da série, que passeia entre um crime brutal e as peculiaridades das cidades do interior do Sul dos Estados Unidos. Isso sem falar em quem se interessou também em assistir a “Candy”, série sobre o mesmo crime, mas protagonizada por Jessica Biel. 

No fim do mês passado, o Cine Set teve a chance de participar de uma coletiva de imprensa virtual com o elenco e a diretora de “Amor e Morte”. Seguem os melhores momentos da entrevista: 

A repercussão 

Lesli Linka Glatter (diretora) – Eu estava bem nervosa antes da estreia. Amei o processo que vivenciamos juntos e tinha confiança na história que contamos e nos personagens. O nervosismo, porém, veio quando a série foi para o mundo. Mas, eu tenho que dizer que pessoas com quem eu não falava há anos vieram falar comigo (sobre a série). Tem sido bem maravilhoso e gratificante. 

Elizabeth Olsen (intérprete de Candy Montgomery) – Eu costumo me sentir bem vulnerável no primeiro mês de estreia de algum projeto – nas duas semanas antes e nas duas semanas depois do lançamento. Tem sido legal ser abordada pelo público. As pessoas chegam comigo e falam sobre a série. Essa é a parte legal. A parte horrível é o começo, logo que vai ao ar. Mas, depois, quando já tem o seu público, acaba sendo bem legal porque você já conseguiu descobrir como deixar o projeto ir para o mundo. 

Lily Rabe (intérprete de Betty Gore) – Demorou pra eu deixar a personagem e sentir essa separação, mais do que com outros trabalhos. Acho que, pra mim, é algo bem específico com cada trabalho, mas, com esse, eu pensava ‘nossa, ainda estou com ela’. Eu ainda estou. E já tem um ano, mas a gente carrega tanto em nossos corpos, que eu acabo sentindo as palmas das mãos suando quando falo sobre ou apenas penso no que foi essa experiência. Esse trabalho realmente foi na medula, minhas células ainda estão lá, mas tem sido maravilhoso, como a Lizzie e a Lesli disseram.  

O tom da série 

Lesli Linka Glatter (diretora) – Quando eu li os artigos originais, (eu pensei) que se não fosse verdade, você não poderia inventar. A história era tão inacreditável que tinha que ser verdade. Isso foi empolgante para mim. Primeiro, temos uma mulher com esse buraco no coração e no espírito – no caso da Candy – que decide preenchê-lo tendo um caso com marido da amiga, uma escolha nada óbvia, fora que não seria a pessoa que alguém escolheria para ter essa experiência transcendental. Os dois passam três meses falando sobre ter este relacionamento, o que é a forma menos sensual de começar algo.  

Daí, ocorre a tragédia e com ele a mudança no tom de “Amor e Morte” para um drama de tribunal. Equilibrar estas transformações foi o mais empolgante em todas as etapas, da pré passando pela filmagem até a pós-produção. Minha grande bênção foi trabalhar com esse elenco, capaz de adicionar tanta complexidade para cada personagem. 

Lily Rabe (intérprete de Betty Gore) – (Lesli e David) não se esquivaram da mudança de tom. E eles apostaram em deixar a comédia e o drama acontecerem ao mesmo tempo. Nós, como atores, nunca sentimos que tínhamos que controlar qualquer um dos lados para fazer a série parecer confortável. Na minha visão, este foi o maior brilhantismo e coragem deles. Em qualquer outro projeto, muita gente teria medo de fazer o que eles fizeram. Para uma atriz, isso é algo que fez o processo ser maravilhoso. 

Jesse Plemons (intérprete de Allan Gore) – Eu assino embaixo, e adiciono também que, quando a gente para pra pensar, é algo complicado: mas, na realidade, as coisas aconteceram de forma abrupta. Foi bom ter esse tempo de tela antes pra ter uma noção de quem essas pessoas são, porque se torna mais significativo quando você as entende. 

Lesli Linka Glatter (diretora) – Filmamos muitas dessas cenas sobre a comunidade primeiro, antes de desconstruir tudo. A ideia era construir esse grupo de pessoas, e foi incrível ver vocês, como atores e humanos, se conectarem de verdade uns com os outros. Parecia que era uma comunidade mesmo ali.  

E aí, quando chegamos aos últimos episódios e ao horror daquele crime, eu senti que não dava pra fugir daquilo. Essa é uma história real, e você tem duas mulheres, duas amigas, duas mães nesta lavanderia terrível juntas. Eu acho que, se você fugir do que realmente aconteceu, não está servindo à história ou às personagens. O crime é meio inexplicável. Até hoje eu acho inexplicável. 

O desafio de ‘virar’ Candy 

Elizabeth Olsen (intérprete de Candy Montgomery) – Os obstáculos vieram de tentar fazer tudo ter sentido, de criar uma linha temporal da personagem – da mulher da qual as pessoas falaram no tribunal, mas também fora dele. Antes, todo mundo a tratava como a estrela do baile, a melhor mãe, a pessoa que liderava tudo na igreja. E ter aquela reação depois de matar alguém em legítima defesa e guardar esse segredo, são coisas não se conectam de forma óbvia. 

Tive que entender quais são os valores de alguém que faz aquilo. E como isso virou uma necessidade obsessiva do amor de outras pessoas, ou o que quer que tenha sido. Foi algo que ela precisava, ao que estava tentando se agarrar com todas as forças. 

Sotaque, figurino e cabelos 

Lily Rabe (intérprete de Betty Gore) – O sotaque foi uma parte maravilhosa na preparação, pra mim, porque os Gores eram do Kansas, e se mudaram para essa cidade no Texas. Eu e o Jesse conversamos sobre isso, e trabalhamos com pessoas diferentes, mas mandávamos um para o outro links do YouTube. Tinha todo tipo de coisas maravilhosas para chegarmos ao sotaque juntos. Algo da Betty que eu adorei explorar foi que ela é uma dessas pessoas que, quando fala com alguém e que tem algum tipo de necessidade em relação a esse alguém, acaba pegando um pouco do outro. E isso foi algo que eu adorei brincar: nas conversas com a Lizzy, por exemplo, eu trazia para a personagem o ritmo e o sotaque dela. 

Elizabeth Olsen (intérprete de Candy Montgomery) – Descobrir as vozes da personagem também foram minha parte favorita. Ela cresceu em várias partes dos EUA, além da França. Por ter ficado 10 anos no Texas, imaginei que ela adotou qualquer jeito que fosse o mais feminino e capaz de ajudá-la a ser mais simpática e a ter o que queria.  

Jogar com o lirismo do sotaque e o alcance vocal foi muito prazeroso até porque costumo falar desse jeito. Isso ajudou na fisicalidade por si só. É a melhor parte de criar uma personagem. É difícil, às vezes, quando você não tem essas referências externas para criar uma personagem, o que não foi o caso em “Amor e Morte”. 

Jesse Plemons (intérprete de Allan Gore) – Nos primeiros dias, quando estou me preparando pra um papel, é como se eu estivesse rondando o assunto, pegando o máximo de informação que puder, especialmente se for uma pessoa real. Depois, eu tento uma forma de entrar na história, de entender a pessoa. E, a partir do momento que eu vejo o personagem, a minha conexão com ele, o processo se move externamente.  

Eu costumo começar internamente em um processo lento, onde você vai descobrindo aos poucos, à medida em que vai entrando no personagem. O figurino sempre ajuda. Foi bem divertido brincar com o fato de que eles não eram necessariamente de fora dali, mas que também não eram exatamente daquele lugar, logo, era preciso traduzir bem esta situação. No fim, o mais importante é entender o que se passa dentro do personagem. Aquelas calças eram apertadas, mas, cara, tudo isso ajuda. 

Tom Pelphrey (intérprete de Don Crowley) – Quanto mais eu ouvia as histórias sobre o Don, mais eu lembrava, de alguma forma, do meu pai. Eles são diferentes de várias formas, mas há algumas coisas, certas características (em comum). Don tinha algo que lembrava meu pai, ou talvez alguma coisa que lembre a todos de seus pais, eu não sei.  

Meu pai nunca se bronzearia (como Don), mas ele também não tinha um cabelo fora do lugar. E eu ainda pedi um anel pro dedo mindinho – meu pai usava um. Há algo em um cara que está sempre de terno, sempre com o cabelo perfeito, não é sentimental, mas não é necessariamente um cara duro…”. 

Segunda temporada? 

Elizabeth Olsen (intérprete de Candy Montgomery) – Eu adoraria fazer uma segunda temporada porque amei muito interpretar Candy. É louco dizer, mas eu amei. Eu não sei quem é essa mulher, como ela é realmente. Eu não sei nada sobre ela. Mas eu amei fazer a versão que criamos juntos (na série). 

Jesse Plemons (intérprete de Allan Gore) – Bem, tem algo a ser escrito sobre Allan depois que a história termina. Acredito que, desde o ocorrido, demorou muitos anos, mas acho que ele se reconectou com os filhos. Todos ainda tiveram muito o que viver depois daquele evento terrível. Eu não consigo imaginar como foi carregar todo aquele fardo pelo resto da vida. 

Patrick Fugit (intérprete de Pat Montgmery) – Tudo o que a vida reservava para Pat e Candy depois que “Amor e Morte” termina é meio que evidente, especialmente, quando você vê o relacionamento deles e o que causou essa desconexão, além da forma com a que eles meio que colocaram band-aid nos problemas para voltar (a ficarem juntos) durante o julgamento.  

É triste, mas algo que eu gostei nos dois é que você vê a razão deles não darem certo, mesmo que façam um esforço, se amem e se importem um com o outro. Pelo menos, na forma como eu e a Lizzie os interpretamos. As coisas vão dar errado. É algo autoexplicativo. Além disso, eu não tenho nenhum interesse em voltar a botar a peruca e os óculos (do personagem).  

PS: coletiva realizada antes da greve do Sindicato dos Atores, deflagrada no dia 13 de julho.