Hollywood sempre explorou o montanhismo e seus alpinistas como cinema de ação. Exemplos disso são alguns trabalhos eficientes dentro do gênero: “Atirando para Matar” (1988), de Roger Spottiswoode, sucesso oitentista das videolocadoras com a ótima dupla Tom Berenger e Sidney Poitier; “K-2 A Montanha da Morte” (1991), de Franc Roddam; “Risco Total” (1993), de Renny Harlin protagonizado por Sylvester Stallone; e até o mestre Clint Eastwood já dirigiu e protagonizou um filme no gênero, o desconhecido “Escalada para Morrer” (1975).

Quando misturamos a fórmula com fatos reais encontramos outros exemplares como é o caso de 127 Horas” (2011), de Danny Boyle, filme irregular, mas que conta com a boa atuação de James Franco; o ótimo (e desconhecido) alemão “Face Norte” (2008), de Philipp Stolzi e o interessante documentário “Desafio Vertical” (2003), de Kevin Macdonald. Curiosamente o último filme de destaque dentro do gênero completa 15 anos de lançamento este ano, no caso o “blockbuster” “Limite Vertical” (2000), de Martin Campbell, que, apesar de convencional, na sua estrutura narrativa funcionava no quesito de ação .

“Evereste”, com previsão de estreia para a próxima quinta-feira (24/09), surge para dar novo fôlego e prestígio ao gênero. Mescla drama, fatos reais e ação em doses eficientes, os alinhando ao bom elenco e a direção segura do diretor islandês Baltasar Kormákur. Baseado em fatos reais e inspirado no livro “No Ar Rarefeito” de Jon Krakauer – mesmo autor do best-seller “Na Natureza Selvagem” adaptado para o cinema por Sean Penn – o filme retrata os eventos fatais ocorridos no Monte Evereste em 1996, onde dois grupos formados por escaladores profissionais e amadores inexperientes (mas amantes de aventuras) precisam unir-se para enfrentarem uma tempestade implacável.

A grande virtude do filme é como ele constrói sua ambientação, no caso Kormákur prepara o terreno para que o clima de aventura se instale aos poucos à medida que nós identificamos com os personagens, seus dramas, suas qualidades e defeitos. Quando este ambiente é visto como real, o filme transporta o espectador para uma ambientação super tensa, reproduzindo em cada imagem a sensação de frio, falta de ar e sensação de perigo sentida pelos escaladores quando atingem altitudes maiores.

Neste quesito, o uso do formato em 3D IMAX, ainda que discreto em grande parte do filme, apresenta sua funcionalidade em momentos-chave principalmente nas sequências de ação dando a dimensão do tamanho da aventura na qual os personagens se envolveram, e a câmera de Baltasar passeia por cima dos personagens, oferecendo uma visão de profundidade na imagem, na qual funciona como um exercício de tensão para encenar o clima claustrofóbico e de vertigem necessários ao trabalho.

O roteiro por sinal, acerta em humanizar os personagens; não há heróis ou vilões, evitando os maniqueísmos característicos dos filmes hollywoodianos. Ele também discute pontos interessantes como o que leva algumas pessoas a enfrentarem a natureza e se colocarem diante de situações limite apenas para exporem a sua vida a um risco desnecessário para terem o gosto da adrenalina. Há uma cena no filme, onde o carteiro Doug Hansen (John Hawkes) explica os motivos que o levaram a fazer aquela loucura. É nesse momento que o filme cria o vínculo final para que você mergulhe na insanidade dos personagens e faça parte desta jornada.

É uma pena que “Evereste” cometa alguns deslizes “capitais” durante o seu desenvolvimento. O roteiro jamais vai a fundo no olhar jornalístico proposto na parte inicial do filme em relação as excursões e o comércio do “circo de aventuras” onde o financeiro se sobrepõe ao profissionalismo. Estofo pra discutir estes pontos, o roteiro tem, mas evita em aprofundar a sua visão crítica em relação ao tema.

Os personagens, ainda que humanizados, ficam na esfera da superficialidade em razão do número grande de personalidades, não permitindo que cada um tenha sua subtrama bem trabalhada. É problemático como o roteiro consegue criar um vínculo empático com alguns personagens e depois descartá-los sem grande explicações. Exemplo disso são Doug Hansey e Andy Harris (Jake Gyllenhaal) que, apesar de serem interessantes, acabam restritos a uma caracterização rasa.

Kormákur que, durante todo o desenvolvimento do filme, mantém as rédeas do trabalho de forma firme, evitando os clichês, comete o pecado de ceder à tentação exatamente no ato final: enche o filme de melodrama com os velhos clichês, inclusive com o previsível discurso romântico de despedida.

O elenco, repleto de atores consagrados, dá um tom digno ao trabalho. Nenhum deles brilha, mas cumprem com eficiência seus papéis. Jason Clarke aos poucos consolida-se como astro dos blockbusters – em apenas um ano foi protagonista de Planeta dos Macacos: O Confronto” e “Exterminador do Futuro: Gênesis”. Josh Brolin transforma o seu egoísta Beck Weathers em uma figura marcante. Por fim, Jake Gyllenhaal imprime o carisma e energia necessária ao líder Andy Harris e o ótimo John Hawkes a humanidade vital ao seu Doug Hansen. Quem sofre é o elenco feminino, liderado por Keira Knightley, que juntamente com Emily Watson e Robin Wright precisam se virar nos trinta para dar conta de personagens com momentos reduzidos na tela.

No geral, “Evereste” é um bom filme de montanhismo. É eficiente principalmente por criar momentos tensos. Não deve agradar aos fãs do cinema de ação, no caso daqueles que esperam um novo “Limite Vertical”, até porque é um filme que prima pelo ritmo lento, mais preocupado em desenvolver o drama e personagens (ainda que o resultado no todo não atinja um nível satisfatório) em detrimento da ação – que por sua vez é colocada de forma orgânica e coerente no filme. No fim, cumpre com eficiência o papel de ser um entretenimento de aventura dentro da média para os padrões de Hollywood. Não vai te levar a se aventurar ou adentrar no mundo dos esportes radicais mas com certeza vai dar a sensação de como é escalar uma montanha.