A imaginação é um dos principais elementos da infância. Quando criança, o ser humano consegue transformar as mais adversas situações em algo mágico e quase real, seja essa uma brincadeira de armas de nerf ou, no caso de Papa-Figo, o medo por uma brincadeira que pode lhe levar a ser raptado pelo homem do saco.

Selecionado para o Festival Olhar do Norte, o curta-metragem dirigido por Alex dos Santos Reis traz ao espectador mais um olhar sobre a história em torno desta lenda infantil – no mesmo evento, o assunto foi abordado no filme amazonense “Zana – O Filho da Mata”. Em Papa-Figo, acompanhamos uma tarde na vida das crianças Thiago (Vitor Abate) e Bia (Chiara Scallet). Após irem para a casa de Thiago para jogarem videogame, ele desafia Bia a amarrar um lenço no pé da cama. Então, após uma breve falta de luz, ela desaparece e Thiago deve, então, enfrentar o Homem do Saco (Herbert Richers Jr.).

O primeiro detalhe que salta aos olhos é a atuação da dupla principal: capaz de revelar bastante sobre as personalidades de suas personagens sem muitos deslizes, logo entendemos que Bia é uma criança medrosa, enquanto Thiago é o oposto disso. Os diálogos entre os dois também conseguem ser eficientes em trazer uma linguagem próxima ao que uma criança de 10 anos diria em momentos de descontração ou de medo, sem parecer algo artificial.

A direção de Alex dos Santos Reis também merece destaque não só por seu trabalho com o elenco infantil, mas também por sua visão. Junto com o diretor de fotografia Wilson Velasco, ele consegue criar momentos de suspense com uma paleta de cores cinza, pouca luz e com enquadramentos que conseguem trabalhar dentro do plano algum susto, sem ter que recorrer a um “jump scare”.

A direção de arte de Ana Zavascki é outro achado da produção pelo cenário desolado e misterioso criado no prédio abandonado e pelos detalhes na sala de “trabalho” do Homem do Saco. Também vale citar a composição do personagem de Herbert Richers Jr., desde sua maquiagem e figurino até a forma de andar que o ator concebe para o Homem do Saco.

Mesmo sendo bem conduzido, “Papa-Figo” também enfrenta alguns problemas. Por vezes, a direção se perde no preciosismo para criar uma composição mais bonita esteticamente, não se encaixando com o clima da obra. A bola caindo em câmera lenta ou Thiago se preparando para buscar sua amiga pelas ruas de seu bairro são os exemplos mais claros disso.

Também soa estranho a decisão de Thiago sair pelas ruas de seu bairro para tentar encontrar Bia já que não é dado nenhum indício quanto ao seu paradeiro. Ele simplesmente é levado a um prédio abandonando que, na verdade, poderia ser qualquer outro. Mas ainda assim, este não se torna um problema tão grande, já que a condução da história consegue superar estas questões, sendo o foco de Alex dos Santos Reis trabalhar com o suspense e tensão, que conseguem ser bem desempenhados.

No final, Papa-Figo apresenta um resultado positivo apesar de alguns deslizes. É um filme bastante eficiente naquilo que propõe trabalhar e acaba sendo um ótimo projeto de estreia para Alex dos Santos Reis.