Quantos filmes de possessão demoníaca já estrearam esse ano nas telas de cinema, caro leitor? Eu perdi a conta. Este O Exorcista do Papa, do diretor Julius Avery – o mesmo que fez aquele trashzão Operação Overlord (2018) – é mais um da leva recente, que inclui filmes não só de Hollywood, mas de outros países também. É como se o cinema mundial tivesse eleito o capeta como um grande vilão para estes nossos tempos inquietos e confusos.

Porém, este aqui tem um trunfo que os outros não têm: o astro Russell Crowe. É um caso claro de ator elevando um pouco o filme em que está pela inteligência do seu trabalho e o carisma da sua presença.

Crowe interpreta o padre Gabriele Amorth, uma figura que realmente existiu. Amorth (1925-2016) foi o exorcista-mor do Vaticano por quase 30 anos, e aparentemente era tão bom de lábia que convenceu o diretor do clássico O Exorcista (1973), William Friedkin, a fazer um documentário com ele, o aterrorizante (de tão ruim) O Diabo e o Padre Amorth (2018).

Em O Exorcista do Papa, que se passa em 1987, vemos Amorth embarcando em uma investigação de caso de possessão envolvendo uma família americana que se muda para um monastério na Espanha. Com o passar da trama, ele tem que lutar não só para salvar a vida do garotinho possuído, como também a própria Igreja Católica – e porque, não, o mundo? – dos planos do demônio.

NÃO SE LEVANDO À SÉRIO

O aspecto mais curioso do filme é que parece que Avery e Crowe o fizeram dando umas piscadelas um para o outro quando as câmeras paravam de rodar. O Exorcista do Papa não assusta em momento algum e a trama não traz nenhuma novidade para este subgênero do terror: temos as tradicionais cenas nojentas e uma criança com voz grave falando palavrões, elementos que O Exorcista popularizou desde que foi lançado, além de uma boa dose de computação gráfica no desfecho para fazer os personagens se contorcerem e enfrentarem o poder do capeta.

Mesmo assim, é um filme estranhamente divertido, apesar dos clichês: Avery não perde tempo com desenvolvimento de personagens ou criação de tensão, nos arremessando logo no que interessa, as cenas de exorcismo e de confronto do herói com o demônio. Certos momentos de personagens gritando diante da câmera ficam até engraçadas – uma delas é protagonizada pelo ícone Franco Nero, o Django original, que aqui faz o Papa. O diretor ainda salpica algumas canções oitentistas na trilha sonora, para compor um clima mais de diversão do que de suspense. E o clímax é uma maluquice, com planos rápidos, ângulos de câmera criativos e pessoas gritando.

A VERDADEIRA SALVAÇÃO

Mas a maior qualidade do longa é mesmo o seu astro. A atuação de Crowe é divertidíssima, e ele com certeza sabe em que tipo de filme está. Ele fala italiano em diversas cenas com um sotaque levemente engraçado, bebe e tem um jeito irreverente, mais para herói de ação do que o protagonista de uma história sombria e assustadora. O ator já conquista o espectador desde o início e é graças a ele que conseguimos assistir até o fim. O desfecho, aliás, até insinua uma possibilidade de franquia do padre Amorth – coisas mais estranhas já aconteceram no mundo do cinema e com um Crowe disposto e um roteiro melhorzinho, pode-se até ter uma continuação legal.

O Exorcista do Papa não é, de modo algum, um filme que possa ser considerado bom. Mas para quem gosta do gênero terror e tem uma tolerância para com filmes B, é possível se divertir com ele. E tendo em vista a concorrência, ele até se eleva, principalmente por causa do seu ator principal. Graças a Russell Crowe, este é um filme que pode até decepcionar um pouco o espectador, mas, pelo menos, não o deixa no inferno por 1h40. E a estrada para o inferno, ultimamente, está cheia de filmes de possessão e exorcismo.