Alexandre Magno Abrão, conhecido pelo nome artístico “Chorão”, vocalista da banda Charlie Brown Jr (CBjr) de 1992 até 2013 – o ano de sua morte prematura por overdose. O grupo foi responsável por marcar a geração de jovens e adolescentes com suas belas composições que falavam de amor, relacionamentos, sonhos e até política ao criticar as hipocrisias da sociedade brasileira.
Contar a história controversa de um dos maiores artistas do rock brasileiro não é uma tarefa fácil. E em apenas 75 minutos, o diretor Felipe Novaes tenta trazer um breve recorte sobre a trajetória de Chorão a quem não o conhece. Com relatos de familiares, amigos, colegas de trabalho e ex-integrantes da banda, o documentário “Chorão: Marginal Alado” acaba perdendo tempo tentando “canonizar” o vocalista da CBjr, sem explorar a fundo, diversos pontos de sua trajetória.
Apesar de possuir um bom material à disposição, grande parte do tempo é gasto com a repetição de ideias ressaltando a personalidade forte de Chorão, a insaciável sede por ajudar as pessoas e como isso o desgastou até a sua morte.
Abordagem superficial e ‘polêmicas’ deixadas de lado
É interessante pontuar que “Chorão: Marginal Alado” foi lançado em 2019, mas teve um longo período de produção – aproximadamente 5 anos. Em dado momento, o próprio documentário informa que sete dias após o ex-baixista da banda, Luiz Carlos Leão “Champignon” ceder entrevista para a equipe, o grande amigo de Chorão foi encontrado morto em sua casa.
O largo tempo de produção não condiz com a escassez de informações sobre a vida de Chorão que é apresentada no documentário. O espectador recebe rápidos flashes da infância e adolescência do vocalista, sua trajetória como skatista, os desafios que enfrentou para montar a banda, polêmicas envolvendo outros artistas como João Gordo (presente no documentário), do Ratos de Porão, e Marcelo Camelo, do Los Hermanos. Ambos tiveram uma relação bastante conturbada com Chorão na virada do segundo milênio, chegando até a episódios de agressão física.
Para se ter uma ideia, não foi dado espaço nem para explicar a origem do nome artístico: “Chorão” recebeu esse apelido pelo amigo de infância e skatista, Fabio Bolota, por geralmente ficar “com cara de choro” ao errar algumas manobras.
Mesmo que o documentário discorra brevemente sobre as polêmicas, Felipe Novaes não se preocupou em mostrar como Chorão absorvia seus problemas e os transformava em músicas que se tornaram hits, sucessos até hoje. Sem falar da identificação que muitos jovens e adolescentes tiveram com suas composições na época.
Pode até aparecer algo simples e sem grande importância para a narrativa. Mas, se parar para analisar, a proposta do documentário é exatamente esta: mostrar o lado humano do artista; suas dificuldades financeiras e de relacionamento; saúde mental fragilizada e como Chorão buscava refúgio de todos esses problemas na arte de compor grandes canções como “Zóio de Lula”, “Lugar Ao Sol”, “Dias de Luta, Dias de Glória”, e “Proibida Para Mim (Grazon)”. Esta última teve até certo destaque no documentário, quando Alexandre Ferreira, filho de Chorão, contou que o pai escreveu a letra da música em uma caixa de pizza!
Montagem que emociona
O ponto forte do documentário acaba sendo a montagem de Matias Lovro que soube dosar muito bem os relatos dos depoimentos com os extensos “monólogos” e “conselhos” que Chorão costumava fazer em seus shows.
Destaque para uma cena inédita do artista incentivando o uso da pirataria para uma fã que não tinha dinheiro para comprar seus álbuns. Vale ressaltar que no início dos anos 2000, a indústria musical sofria bastante com a queda de números de venda por conta da explosão do compartilhamento ilegal de músicas na internet.
“- Tudo o que você busca em mim, está dentro de você. Está no seu coração, na tua cabeça. Eu sou só um reflexo das coisas que você acredita […], mas está tudo dentro do teu coração.
– Sempre estive contigo e sempre vou estar, cara. Por mais que eu não tenha dinheiro para ir aos teus shows e nem comprar os teus CDs, eu te amo.
– Não gasta dinheiro com essa p****. Baixa o som e curte o barato. O som é pra vocês, não precisa comprar. Ama as pessoas e usa as coisas. O máximo que tu puder, valeu?”
O declínio da saúde mental
Outra cena emblemática é no minuto final do documentário. O espectador ouve o mesmo discurso que Chorão dizia no início da carreira: “a minha alma é feita de sonhos, luto por isso, sem isso eu não vivo”. Esta mesma frase é dita pelo artista em um de seus últimos shows, mas dessa vez com um semblante triste e cansado. É neste momento que vemos que os sonhos de Chorão se tornaram um fardo no qual ele já não suporta mais carregar. Esta cena demonstra claramente o quanto é necessário discutir saúde mental nos dias de hoje.
Por mais paradoxal que fosse, Chorão demonstrou ser um grande artista capaz de marcar toda uma geração com suas ideias e posicionamentos. Além, é claro, de influenciar a música brasileira em vários gêneros e subgêneros. Ainda que haja quem não goste de Chorão por conta de certas atitudes que o artista tomou em vida, é preciso deixar de lado o moralismo ao tratar sobre a trajetória de Chorão, como bem pontuou o relato do jornalista e apresentador Serginho Groisman no documentário.
“O Chorão tem que ser respeitado muito, muito, por tudo o que ele fez. As escolhas pessoais dele podem ou não estar ligadas à música, ao sucesso. O que a gente não pode, de jeito nenhum, é ter uma visão moralista, o certo e o errado, o bem e o mal. Ninguém é composto só disso”.
Em “Chorão: Marginal Alado”, o que se tem é uma tentativa de abordar resumidamente a trajetória de um artista tão complexo que foi o frontman da Charlie Brown Jr. Um exercício bastante difícil, pois como o próprio cantor dizia em uma de suas músicas: “não tão complicado demais, mas nem tão simples assim”. O documentário é um bom recorte para quem não conhece o artista. Mas, devido a magnitude de seu legado, Chorão merecia bem mais do que foi explorado.