O terceiro episódio da última temporada de “Game of Thrones” promoveu um dos espetáculos mais impressionantes do audiovisual recente. Durante 1h22, presenciamos trabalho técnico de montagem, direção de arte, fotografia e som, talvez, nunca visto antes na televisão mundial. Por outro lado, tamanho brilhantismo está longe de ser refletido no roteiro, especialmente, pela quantidade assombrosa de soluções forçadas para os conflitos, os famosos Deus Ex Machina.

Tratado como o momento mais épico de toda a série, a batalha de Winterfell foi uma jornada que fez jus à expectativa. Testemunhamos uma ação ininterrupta, repleta de batalhas do início ao fim. Os dilemas de cada personagem ou o jogo político ficaram completamente em segundo plano: todos estão diante da pura luta pela sobrevivência. Parecido com o que fizera Christopher Nolan recentemente em “Dunkirk”, o clímax inicia-se no primeiro segundo e somente termina quando sobem os créditos.

Responsável por outro brilhante e importante combate de “Game of Thrones” (“A Batalha dos Bastardos”), Miguel Sapochnik conduz à beira da perfeição este terceiro episódio. Não há uma tentativa de tornar aquele momento agradável aos olhos do espectador: o jogo muito claro de luz (fogo e esperança) e escuridão (gelo e morte) retratado pela direção de fotografia de Fabian Wagner orienta toda a batalha. E o predomínio da primeira é natural pela forma como o episódio se desenrola para um desfecho trágico seja na cena aérea do primeiro ataque à parte final do conflito em que as luzes parecem sufocar diante da escuridão e da fumaça, criando uma atmosfera infernal repleta de melancolia.

Para amplificar isso, a montagem rápida tal qual os ataques, vindos de onde menos se espera, contribui para uma estado de angústia completa de que não há saída. Isso leva Sapochnik a criar um dos ápices de toda a série com Arya cercada por vários por White Walkers em um cena superior a 90% dos filmes genéricos de terror. Toda a edição de som merece reconhecimento na temporada de premiação do ano que vem assim como a trilha sonora com aquele tique-taque contando o fim da linha para os personagens.

Daqui por diante, teremos SPOILERS.

ARYA GRANDE, MORTES, JONERYS, DEUS EX MACHINA

Havia dito que os dois primeiros episódios de “Game of Thrones” prepararam o terreno para a batalha de Winterfell e que era necessário algo fantástico para compensar os domingos anteriores. Se a parte técnica foi um show à parte, o mesmo não se pode dizer do roteiro. Qualidades foram reforçadas, enquanto os pontos fracos prosseguem sem uma expectativa real de que possa mudar neste fim de temporada.

Sem dúvida, Arya está sendo, junto com Sansa, o grande nome deste último ano. Enquanto a personagem de Sophie Turner ganha espaço como estrategista e uma jogadora política até então inesperada, a caçula da família Stark brilha como a mais forte guerreira desta reta final. A coragem de recusar ir para a cripta, travar uma luta contra diversos White Walkers do tamanho do dobro dela, escapar com muita destreza da perseguição de vários deles e dar o golpe fatal no Rei da Noite são dignas de aplausos e toda a adoração das redes sociais. Fora que representa a quebra do estereótipo masculino dentro do gênero de ação tal como fizera Capitã Marvel, Furiosa, Trinity e tantas outras heroínas no mundo do cinema.

Por outro lado, “Game of Thrones” prometeu e não cumpriu as tão esperadas mortes chocantes. Quem apostava em Jaime, Arya, Daenerys ou qualquer um do núcleo principal, quebrou a cara. Sobraram para os coadjuvantes Sor Jorah, Melisandre, Beric Dondarrion, Lyanna (fofinha), Edd e o outrora importante Theon. A série da HBO ‘arregou’ tal fizera a Marvel em “Guerra Infinita” (será que teremos um final chocante à la “Ultimato”?).

Não dá mais também para o casal Jon e Daenerys: o ponto mais baixo da batalha de Winterfell foi, sem dúvida, o casal perdido no meio das nuvens. Como os protagonistas de toda a série simplesmente ficam fora do centro da ação por grande parte do episódio? Até mesmo o duelo entre os dragões não representou grandes coisas dentro de todo o conflito. Será preciso um esforço monstruoso para fazê-los crescer neste fim de temporada.

O que impede um 10 bonito da batalha de Winterfell, entretanto, é, sem dúvida, os Deus Ex Machina recorrentes. Arya sendo salva de última hora pelo Cão de Caça e Jorah indo resgatar Daenerys após a queda do dragão podem até passar batidos por não chegarem a ser tão decisivos assim, mas, o mesmo não é possível com o desfecho do Rei da Noite. Como Arya dá um salto ninja rumo ao vilão-mor no meio de diversos White Walkers? Como assim ninguém viu aquela garota voando no meio de todo mundo?

Somente não chega a ser frustrante ver um capítulo tão bem feito terminar de maneira tão sem nexo por tudo o que “Game of Thrones” realizou até aqui e nosso carinho pelos personagens, especialmente, alguém tão fora da imagem de salvador do mundo como Arya. A batalha de Winterfell foi sim épica, mas, poderia ter sido ainda mais brilhante com um roteiro mais criativo.