Histórias de amor entre humanos e robôs não são exatamente novidade no cinema. Por sorte, “I’m Your Man” não é uma delas. O filme, que estreou no Festival de Berlim deste ano e rendeu o Urso de Prata de Atuação Principal para a atriz Maren Eggert, é uma divertida comédia sobre as contradições do ser humano e as expectativas de relacionamentos. 
 
Eggert é Alma, uma pesquisadora workaholic que está às vésperas da publicação de um importante artigo quando conhece Tom (Dan Stevens, das séries “Downton Abbey” e “Legion”). Charmoso, inteligente e romântico, Tom parece um partidão, mas, de fato, é um andróide desenhado e programado para atender ao gosto da pesquisadora. 
 
Para obter fundos para seu projeto, ela topa – a contragosto – viver com o robô pelo período experimental de três semanas para redigir um parecer e submetê-lo ao comitê de ética responsável por autorizar sua introdução no mercado. Claro, ter um androide gato pela casa super disposto a conquistar você não seria um problema para muitas pessoas. Mas como romance é a última coisa na cabeça de Alma, Tom se vê numa missão hercúlea para realizar a missão para a qual foi programado. Que comecem os jogos. 

MELHOR USO DE SIMPLES PREMISSA


 
O que poderia ser uma comédia romântica baseada em dois sujeitos duros na queda às voltas com a possibilidade de amor ganha contornos mais profundos nas mãos da diretora alemã Maria Schrader (a minissérie “Nada Ortodoxa”). O roteiro, escrito por ela juntamente com Jan Schomburg, aproveita a situação inusitada para fazer grandes perguntas sem perder de vista o humor. 
 
Além de cineasta, Schrader é uma celebrada atriz e claramente sabe a hora em que a interação entre dois atores é o suficiente para fazer uma cena funcionar. O momento em que Tom revela uma informação devastadora sobre a pesquisa de Alma, por exemplo, é um exercício de atuação: evitando spoilers, resta comentar que a forma como o robô confronta a reação da pesquisadora expõe muito das motivações egoístas que guiam inúmeros desejos humanos. 
 
Os dois intérpretes estão em seu melhor nível aqui: Stevens dá um ar quase zombeteiro ao robô e suas tentativas de entender Alma para além de seus algoritmos são o cerne cômico do filme. Mas Eggert explora habilmente ao máximo o sofrimento de uma mulher em um profundo estado de descrença e não à toa foi premiada pelo júri da Berlinale. 

I’m Your Man” constantemente brinca com as expectativas do público com relação aos personagens, com Tom apresentando comportamentos que parecem dotados de altruísmo, carinho e compaixão e Alma se atendo a pragmatismos quase robóticos. 

A produção argumenta que a grande tragédia aqui é o fato de que a pesquisadora perdeu a capacidade de relacionar-se consigo mesmo de uma maneira humana – e de que precisou de um robô para se dar conta disso. Evitando soluções fáceis, “I’m Your Man” faz o melhor uso de sua simples premissa. 

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