Que Takeshi Kitano (“Adrenalina Máxima”, “Hana-bi – Fogos de Artifício”) é uma figura idiossincrática todo mundo está careca de saber. Assim, não é nenhuma surpresa que “Kubi”, seu mais recente filme, o diretor traga à mente desde o drama shakespeariano (bem como as adaptações japonesas de Kurosawa) até o pastiche de Rainer Werner Fassbinder, tudo filtrado pela ação sangrenta do wuxia e dos filmes de samurai.

“Kubi” é uma espécie de “Game of Thrones” no Japão Feudal. Kitano nos bombardeia com uma enxurrada de nomes e personagens que sabe muito bem que não seremos capazes de memorizar. O que importa é o seguinte: há uma disputa por terras em curso, levando alguns dos vassalos do sádico Nobunaga a se rebelar.

O primeiro deles é Murashige, com quem Nobunaga parece manter algum tipo de relação sadomasoquista. A rebelião coloca Mitsuhide numa sinuca-de-bico, já que, por um lado, deve lealdade a Nobunaga ao mesmo tempo em que é amante de Murashige. Isso sem falar no calculista Hideyoshi, interpretado por Kitano, um ex-camponês que se tornou senhor de terras e que pouco liga para os códigos dos samurais.

Muitos nomes? Nem se preocupe com isso. Kitano alterna as cenas de falatório com esquetes cômicas e combates sanguinolentos. Lá para a quinquagésima cabeça decepada, fica claro que o diretor está transitando pelo campo da farsa, em um deboche para lá de violento com todas as picuinhas de poder.

Mas o humor deixa um gostinho amargo depois de um tempo. É que todos aqueles samurais gananciosos parecem ser gays, enquanto o personagem do Kitano, o mais esperto de todos, não o é – convenientemente. Fica a impressão de que o deboche de Kitano passa não só pelos códigos morais dúbios desses personagens, mas também por sua sexualidade.

Se formos capazes de relevar essa tendência questionável, “Kubi” se mostra um espetáculo gostoso, mas passageiro.