Não há monstro mais assustador do que um bom ator. Kerry Condon que o diga: indicada ao Oscar 2023 em Melhor Atriz Coadjuvante por “Os Banshees de Inisherin”, a atriz irlandesa é protagonista deste “Mergulho Noturno”. Driblando toda a ruindade de roteiro, direção e colegas de elenco, em certos momentos, ela consegue fazer você esquecer tudo isso, se envolver no drama da personagem e até levar a sério a meia dúzias de bobagens que é obrigada a dizer. O único problema é que ela não é milagreira, logo, não demora muito para você ver a tranqueira que está assistindo. 

Projeto da Blumhouse, “Mergulho Noturno” parte da ideia interessante de uma piscina assassina. Basta entrar nela para ver assombrações e ser sugado para o fundo sem passagem de volta. Um ponto de partida interesse visto que o conceito idealizado de felicidade e reunião familiar simbolizado por este tanque cheio de água – algo, diga-se, captado em um momento de rara lucidez durante a festa dos Wallers. 

O problema é o que fazer com isso. O diretor Bryce McGuire ao lado do seu parceiro no roteiro Rod Blackhurst se mostram quase nada inspirados para tal missão. “Mergulho Noturno” mira claramente nos suspenses sobrenaturais vindos do Oriente no começo do século como “O Chamado” e “O Grito”. Logo, há um mistério que cerca o lugar amaldiçoado e caberá à mocinha, no caso, a mãe (Condon) desvendá-lo e salvar toda a família.  

ROTEIRO E CENAS DE TERROR FRAQUINHAS 

Para tanto, as frases de efeito (toda parte filosófica da relação do ser humano com a água e domar a morte são maravilhosas de ruim) e as licenças poéticas são exploradas ao limite. A casa está abandonada há décadas e ninguém pergunta o motivo? Como a evolução do quadro de Wyatt (Ray Waller) pode ser tão associada à piscina por pessoas, teoricamente, racionais? O sujeito quase mata uma criança, morre afogado e ninguém leva para o hospital ou coisa do tipo? 

Tudo poderia ser esquecido ou minimizado caso “Mergulho Noturno” oferecesse cenas de terror que valessem a pena. Aqui, falta de tato de McGuire em conseguir ser inventivo para tirar o melhor das sequências. Momentos que deveriam ser tensos como o encontro da mãe com a senhorinha asiática perdem força pela decupagem burocrática, gerando apenas a previsibilidade e a sensação de já termos vistos aquilo antes.  

O jogo da luz que pisca e apaga na piscina à medida em que o perigo se aproxima é tão bé-a-bá do cinema de terror que somente um iniciante no gênero consegue se assustar. Salva-se apenas o ataque à filha do casal em que a piscina vira um oceano sem com a intermitência da luz, as bolhas e os monstros criam um cenário verdadeiramente sufocante – não à toa foi o momento escolhido para ilustrar o trailer. 

Nesta miséria de criatividade e vontade, o talento de Kerry Condon se torna um farol de dignidade em “Mergulho Noturno”. Por mais que esteja naturalmente um nível abaixo de “Inisherin” e trilhe caminhos já vividos, por exemplo, por Naomi Watts, há de se reconhecer como a entrega da irlandesa cativa o público minimamente para que não saia correndo da sala antes do fim do filme. Todo o desejo genuíno de Eve em fixar raízes após uma série de mudanças por conta da profissão do marido – jogador de beisebol – é palpável assim como a vontade de se livrar daquele mal para proteger os que ama. Passa longe de ser um grande desempenho, mas, é o suficiente que todo o resto não consegue atingir. 

“Mergulho Noturno” abre a temporada dos filmes de terror nos cinemas brasileiros em 2024 pronto para ser esquecido. Não duvido que a própria Kerry Condon venha a fazer o mesmo em breve.