“The Banshees of Inisherin”, novo filme de Martin McDonagh, aborda um tipo de término pouco abordado nas telonas: a amizade entre dois homens adultos. A produção premiada em Veneza (onde estreou) foi exibida no Festival de Londres deste ano. Apesar de transbordar o humor ácido típico do diretor anglo-irlandês, o filme peca no ritmo lento que estende em demasia sua história simples.

Os (ex-)amigos em questão são Pádraic (Colin Farrell) e Colm (Brendan Gleeson), dois camponeses de uma isolada ilha irlandesa na década de 1920. Sua interação sofre uma ruptura fatal quando Colm decide encerrar unilateralmente a amizade. Pádraic, um sujeito de pouca astúcia e sem muitos amigos, se recusa a aceitar o fato. A trama então se torna um duelo de vontades que sai lentamente do controle.

Como nos melhores embates dramáticos, ambos têm sua dose de razão. Colm é um músico de certa idade que se vê tomado pelo desejo de produzir uma obra de arte que o sobreviva. Para tanto, ele entende que precisa cortar o supérfluo da sua vida – inclusive o tempo com o amigo.

Já Pádraic, que se vê sem seu único real parceiro, corre atrás de reverter essa decisão para seguir com a sua vida. Os dois estão lutando contra a mortalidade, mas com métodos distintos: Colm acredita que vencerá a morte com a posteridade artística; Pádraic, com o papo-furado no bar local. 

peculiar e insular

Farrell continua a ótima fase interpretando o amigo deixado de lado – algo reconhecido em Veneza, que o consagrou com a Coppa Volpi de Melhor Ator. Ele tem o desafio de pintar Pádraic como uma figura trágica, preso em uma escalada de violência além de seus conhecimentos limitados. Grande parte do humor do longa vem da incredulidade do público diante de sua autonegação.

A decisão de McDonagh – cujo roteiro também saiu premiado de Veneza – de contar essa história com a Guerra Civil Irlandesa como pano de fundo reforça a ideia de uma guerra sem sentido. Esse tema solene, no entanto, não o impede de criar uma situação absurda (que beira a caricatura) em que sobram deixas cômicas.

Quem melhor se aproveita deste tom é Kerry Condon (da série “Better Call Saul”), que interpreta Siobhán, a irmã de Pádraic. Muitos dos pontos altos da produção são suas conversas com o personagem de Farrell. Ela serve como a voz da razão aqui, lutando contra as amarras sociais do seu vilarejo e tentando (sem grande sucesso) que os homens ao seu redor tomem atitudes sensatas.

Para além de seus subtextos, é fato que o filme não chega ao patamar de obras anteriores de McDonagh, como ” Sete Psicopatas e um Shih Tzu” e “Três Anúncios para um Crime”. A verve anárquica do cineasta se perde em uma trama arrastada e enxuta que não sustenta os 114 minutos de projeção, durante os quais pouco se desenvolve além do esperado. Como seus protagonistas, “The Banshees of Inisherin” é uma obra peculiar e insular, que pouco dialoga com o mundo exterior. 

* Texto original alterado para substituir a equivocada expressão humor negro.