O povo Uru-eu-wau-wau, situado no norte de Rondônia, resiste aos avanços do agronegócio, das madeireiras e dos grileiros que ameaçam invadir suas terras. Diante da incompetência da FUNAI em proteger seu território, uma ilha arbórea em um oceano desmatado, coube aos próprios indígenas patrulharem seus domínios. 

Liderados pelo jovem cacique Bitaté, os Uru-eu-wau-wau contam com uma arma que seus antepassados não tinham: equipamentos de filmagem. Filmando a si mesmos e a sua luta, eles são um sopro de ar fresco para todos aqueles que ameaçam desvanecer ante o fardo que é nascer nesta Terra Brasilis. 

O contra-ataque

Esperança parece ser mesmo o sentimento no qual o documentário “O Território” está mirando. Não que os problemas que apresenta estejam resolvidos ao final da projeção – longe disso; mas o retrato que compõe da trajetória de Bitaté – de garoto brincando no rio a líder de seu povo –, bem como de seus esforços de batalha, rendem um quê extasiante no espectador. 

É que fica difícil, diante da imagem de Bitaté ensinando uma criança indígena a manusear uma câmera, não confirmar (uma vez mais) o nosso amor pelo cinema. Na verdade, se há um pecado cometido pelo documentário, talvez seja o de não confiar o suficiente nesse amor – o que significa, também, não confiar o suficiente nos indígenas. 

E digo isso sabendo que os Uru-eu-wau-wau tiveram participação ativa na produção; um dos diretores de fotografia, por exemplo, é Tangãi Uru-eu-wau-wau. Mas fica a impressão de que o diretor Alex Pritz recai em alguns tiques e jargões de quem está mirando nas plateias de festivais estrangeiros. Está lá, por exemplo, a música atmosférica e solene, digna de um especial de TV a cabo, permeando as imagens idílicas dos insetos e dos troncos.

Crônica das trevas

Se “O Território”, por vezes, parece engessado demais, ao menos não deixa de interessar enquanto crônica de uma era de trevas no país – não por acaso, relâmpagos cortam o negrume do céu em diversos momentos do longa. As filmagens, ancoradas também na figura da ambientalista Neidinha Bandeira, tiveram início pouco antes das eleições de 2018. Conforme o abismo se torna mais fundo com o passar dos anos, o documentário adquire cada vez mais ares de tensão, enquanto Bitaté consolida seu contra-ataque movido a flechas e câmeras de vídeo. 

É claro que o lançamento do documentário em ano de eleição não é coincidência. Mas afinal, “O Território” será mesmo capaz de chegar aos ouvidos não-convertidos? Fica a leve suspeita de que, por maior que seja sua competência, ele não ecoará muito longe das fileiras já cativas. 

Uma pena. A gente se pergunta, então, o que resultaria de uma produção totalmente tocada pelo cacique Bitaté. Torçamos e aguardemos.