“Women Talking”, novo filme de Sarah Polley, retrata o momento em que ideias difíceis se tornam palavras e ações. O longa, exibido no Festival de Londres depois de passagens aclamadas em Telluride e Toronto, aborda o fanatismo religioso através da lente do movimento #MeToo com coragem e grandes atuações. Apesar disso, o excesso de didatismo pode fazer a produção pregar apenas para os já fiéis quando chegar ao circuito comercial.

O filme acompanha oito mulheres de uma comunidade menonita que descobrem que os abusos sexuais cometidos contra elas não eram de natureza demoníaca, mas sim pelos homens ao seu redor. Diante dessa terrível revelação, elas se reúnem para deliberar entre bater ou correr – com o destino não só de suas vidas, mas de suas almas, na balança. 

MARA, BUCKLEY E FOY EM GRANDES ATUAÇÕES

O roteiro de Polley, adaptado do romance de Miriam Toews, publiciza esta trama, levemente baseada em uma história real, ocorrida na Bolívia em 2011. A diretora tem a sensibilidade de não mostrar os atos em si, mas o horror de seu desenlace – incluindo aquele que permanece com as vítimas por anos. Isso ganha potência extra quando o público lembra que atos como estes estão acontecendo mundo afora.

A segunda é mostrar o peso do silêncio nestas comunidades pouco tocadas pelo mundo exterior e pelos movimentos feministas das últimas décadas. Longe da imprensa e das mídias sociais, mulheres como as retratadas em “Women Talking” se veem tão tolhidas de meios para lidar com o abuso que lhes falta linguagem para dar significado ao que lhes acontece.

Rooney Mara, Jessie Buckley e Claire Foy se destacam no elenco, representando três facetas distintas do conflito. Ona (Mara) é a calma que busca entender o que está acontecendo através do prisma religioso. Mariche (Buckley), depois de tantos abusos, é a que parece conformada em uma raiva silenciosa. E Salome (Foy) busca conciliar sua luta contra os homens com seu papel de mãe de meninos. 

DISCURSO PANFLETÁRIO ENFRAQUECE REALISMO

O resultado do choque dessas abordagens é uma fábula de emancipação feminina nos moldes de “12 Homens e Uma Sentença”, mas sem a concisão deste clássico. Durante os 104 min de projeção, os pontos debatidos se tornam cíclicos e “Women Talking” se arrasta, esgarçando a trama até o limite.

Além disso, o roteiro faz das protagonistas mais arquétipos do que personagens propriamente ditas e suas interações transbordam didatismo. A maneira como o grupo chega a certas conclusões não parece natural, mas meramente um contorno narrativo que garante ao longa a certeza de que sua mensagem será passada.

Esses percalços não tiram as qualidades de “Women Taking”, especialmente no que diz respeito às atrizes mencionadas, que tem tudo para emplacar indicações a Melhor Atriz Coadjuvante no Oscar do ano que vem. No entanto, a mão pesada dos realizadores torna a produção panfletária, afetando o realismo que teria beneficiado seu material-base.