Scarlett Johansson com certeza não é nenhum rostinho novo para os cinéfilos de plantão. Atuando desde criança, a americana começou interpretando pequenos papéis em filmes como O Anjo da Guarda (1994) e Esqueceram de Mim 3 (1997), até ganhar destaque no drama Meninas de Ninguém (1996), que lhe rendeu uma indicação ao Independent Spirit Award de 1997 como melhor atriz.

Hoje, Scarlett já é figurinha carimbada em Hollywood, com direito a estrela na calçada da fama. Depois de ganhar elogios e um BAFTA por Encontros e Desencontros (2003), de Sofia Coppola, a atriz fez comédias água-com-açúcar (Diário de Uma Babá e Ele Não Está Tão a Fim de Você), um pouco de ação descerebrada com Michael Bay (A Ilha), já virou super-heroína da Marvel (Os Vingadores e Homem de Ferro 2) e também se tornou uma das musas de Woody Allen (Match Point, Scoop – O Grande Furo e Vick Cristina Barcelona). Tudo isso enquanto continuou atraindo olhares pela sua beleza estonteante, aparecendo frequentemente em rankings como sex symbol.

Curiosamente, mesmo com tantas produções no currículo, Scarlett Johansson nunca chegou a ser unanimidade como uma grande atriz. Felizmente, a boa safra da artista em 2014 talvez possa mudar isso: aparecendo em nada menos que cinco filmes neste ano, Scarlett teve a oportunidade de balancear sua presença em grandes produções e filmes menores como a “supermulher” do ano nas telonas, quase sempre emprestando um pouco de humanidade a papéis não tão humanos assim – de um sistema operacional a uma alienígena.

Seja loira, ruiva ou morena, Scarlett encarou desafios que foram marcos em sua carreira e lhe proporcionaram especialmente dois grandes destaques em 2014: Sob a Pele e Ela. Neste último, filme de Spike Jonze sobre o amor na modernidade líquida (Zygmunt Bauman curtiu isso), a atriz deu vida ao sistema operacional Samantha, que nunca aparece fisicamente em cena, já que é uma “entidade virtual”. Logo, depende inteiramente do trabalho de voz de Scarlett dar nuances à personagem e fazer o espectador acreditar que, por trás daquela máquina, há alguém (ou algo) que também é capaz de sentir. Não é à toa que o protagonista vivido por Joaquin Phoenix se apaixona por Samantha – e a capacidade da atriz em atribuir ao seu papel simpatia, uma dose de hesitações e uma vontade inata de conhecer o mundo é o que possibilita que o público se encante com o relacionamento entre os dois.

O oposto de Samantha se encontra justamente na criatura misteriosa sem nome vivida por Scarlett em Sob a Pele. O longa de Jonathan Glazer (que, aparentemente, pela recepção crítica em geral, é um caso de “ame ou odeie”) é uma produção independente filmada no clima gelado da Escócia, sobre uma alienígena disfarçada que seduz homens desprevenidos nas ruas de Glasgow – basicamente, uma versão cult e melhorada de A Experiência. Com poucos diálogos e apenas um fiapo de roteiro para se guiar, Scarlett encarou as tão faladas cenas de nudez pela primeira vez em sua carreira. Despida não só literalmente, mas também de qualquer vaidade, a atriz compõe uma personagem difícil e silenciosa, como um ser estranho e alheio às relações humanas, até que uma hora ela mesma passe por um conflito interno e confronte o pior lado da humanidade.

lucyEsse conflito interno também ocorre, em menor proporção, em Lucy, de Luc Besson. Mais uma vez se aproveitando do clichê de que humanos não usam 100% do cérebro, o diretor francês faz uma obra de ação que, embora boba, não deixa de ser divertida. No papel da personagem-título que tem acesso total à sua própria mente, depois de absorver acidentalmente uma droga, Scarlett vai da loira ingênua à heroína com superpoderes que derruba um bando de policiais só com um gesto e viaja no tempo e espaço. A trama exagerada de Besson só funciona porque a atriz consegue mostrar os diferentes estágios de Lucy e como aumenta a distância da sua personagem em relação ao mundo ao seu redor, conforme mais poderosa ela se torna. A cena em que ela liga para a mãe é um bom exemplo disso, já que, embora fique claro que Lucy ainda a ama, a separação entre as duas é inevitável. Pode até não fazer sentido nenhum, mas Lucy ainda consegue divertir e mostrar mais uma faceta de Scarlett.

Falando em ação, claro que não poderia faltar a atriz, agora novamente ruiva, chutando bundas como se não houvesse amanhã no papel de Natasha Romanoff, ou a Viúva Negra. Em Capitão América 2: O Soldado Invernal, de Anthony e Joe Russo, Scarlett volta a ser a heroína que ganhou destaque mais do que o esperado desde Homem de Ferro 2, aliando uma boa performance em cenas de ação com cinismo e inteligência. O clima de espionagem do filme dá mais espaço para Natasha respirar e mostrar alguns dos conflitos da agente, dando um pouco mais de tridimensionalidade à personagem.

Com todos esses papeis, a estrela ainda teve tempo de fazer uma ponta também na comédia Chef, de Jon Favreau, e de passar por momentos importantes na vida pessoal: a mais nova integrante do time de mulheres balzaquianas teve seu primeiro filho e também se casou em segredo com o jornalista Romain Duraic. No fim das contas, 2014 foi um ano especial para Scarlett Johansson, que seja como mulher, máquina, alien ou até mesmo um pendrive (quem pegou a referência?), conseguiu se destacar em atuações versáteis e projetos arriscados. Agora é torcer para que a atriz continue com essa vontade de fazer mais e melhor em novas produções – uma das próximas é Hail, Caesar!, projeto dos Irmãos Coen, além da nova versão live action de O Livro da Selva. Quem sabe vem por aí mais uma chance de Scarlett provar mais uma vez que é sim talentosa.

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