Personagens inteligentes criam grande drama.

Em Better Call Saul, desde o fim da quarta temporada, vemos o quanto Lalo é inteligente. Mesmo assim, ainda ficamos despreparados em relação à sagacidade dele enquanto assistimos a este retorno da série com “Point and Shoot”. A inteligência de Lalo é tanta que o roteirista Gordon Smith e o diretor Vince Gilligan conseguem realizar um verdadeiro truque de mágica: temer pelo destino de personagens que sabemos que não morrerão.

O chocante final do episódio anterior nos deixou esperando semanas pela continuação de Better Call Saul e ela não decepciona. Terminamos aquele episódio com Lalo armado no apartamento de Jimmy e Kim com e Howard morto no chão.

“Point and Shoot” começa com Lalo ordenando que Jimmy vá até um certo endereço e mate alguém, enquanto o mais esperto dos Salamancas fica com Kim esperando. Jimmy, por sua vez, em uma mistura de esperteza com desespero, usa a lábia na tentativa de salvar a esposa, convencendo Lalo a mandar Kim em seu lugar. Lalo ainda diz: “como você conseguiu uma mulher como essa?”, enquanto Kim parte.

Acontece que a pessoa a quem Lalo mandou Kim matar é ninguém menos que seu inimigo, Gus Fring. É o primeiro passo em uma sequência de lances de xadrez no qual jogadores como Lalo e Fring tentam ser mais espertos a cada jogada. E quando se tem isso, tem-se mais um grande episódio.

O roteiro é uma coisa absurda de tão bem construído, mas a condução por parte de Gilligan e seus atores também é impressionante. Closes no rosto de Rhea Seehorn enquanto ela dirige expõem todo o estado emocional turbulento da personagem e elevam a tensão. Sombras ameaçadoras dão o tom no plano do alto que a mostra saindo do veículo na direção da casa de Gus. Uma câmera grudada na cadeira sendo puxada também representa um instante de grande suspense. E o confronto entre Gus e Lalo chega ao clímax com direito a uma pista plantada há uns dois ou três episódios atrás: afinal, em Better Call Saul nada é por acaso.

E depois de tanta tensão, tudo se conclui com outra cena magistral com Jonathan Banks e seu jeito inimitável ao viver Mike, conversando do modo mais claro e direto possível com Kim e Jimmy. Em seguida, uma nota realmente triste, pelo único inocente que se deu mal de fato nesta confusão toda: Howard. Mike dizendo “com cuidado” enquanto o corpo de Howard é, enfim, colocado no seu terrível local de descanso é uma cena muito triste, temperada pelo desempenho delicado de Banks.

Depois dessa pausa, Better Call Saul retorna com este episódio capaz de fechar algumas pontas soltas e deixar outras para o futuro. Como será o relacionamento entre Jimmy e Kim de agora em diante? Poderão viver juntos sabendo que acabaram causando a morte de um homem? Será essa a causa da separação dos dois? Ainda faltam cinco episódios para o final, e de minha parte, não faço a menor ideia de para onde a série vai a partir de agora.

Tamanha é a façanha dos seus criadores, produtores e atores: apesar de ser uma prequel de outra grande série, de se passar antes de uma narrativa tão cativante e conhecida, Better Call Saul trilhou o próprio caminho e conquistou o direito de ser razoavelmente imprevisível. Realmente, uma façanha que só pessoas muito inteligentes conseguem realizar.