Com uma mulher lutando contra um grande desafio em um sistema que não a privilegia, “Firebrand”, o novo filme de Karim Ainouz, se encaixa facilmente na filmografia do realizador brasileiro. Exibido no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary depois daa estreia em Cannes, ele tem o potencial para expandir o perfil internacional do diretor, a despeito de alguns entraves narrativos.

Primeiro longa-metragem de ficção rodado por Ainouz em inglês, “Firebrand” se centra na vida de Elizabeth Parr (Alicia Vikander) durante os últimos anos do reinado do marido, Henrique VIII (Jude Law), que, no século XVI, representou o auge do absolutismo na Inglaterra.

Conforme o déspota vai sucumbindo a uma infecção, Parr se vê andando em uma corda bamba, tendo que driblar os jogos de poder que querem tirá-la de cena e os caprichos do rei que, mesmo doente, ainda tem condições de exilá-la ou matá-la, como fez com suas cinco esposas anteriores. Eventualmente, a amizade com uma inimiga política da Coroa e o flerte com um dos conselheiros reais a colocam em uma posição perigosa. 

ENTRE GOT E DRAMA HISTÓRICO

À sua maneira, “Firebrand” empresta elementos de vários gêneros cinematográficos. Em partes, ele é um thriller político, com as intrigas da corte dando ares de “Game of Thrones” para a empreitada. Em outras, é um suspense de cativeiro, em que a corte inglesa é uma prisão em que Parr deve lutar pela sobrevivência. A despeito da figura ameaçadora do Bispo Gardiner (Simon Russell Beale), o filme tem seu real antagonista em Henrique, cuja volatilidade o torna imprevisível.

Porém, mais do que qualquer outra coisa, “Firebrand” é um drama histórico, com um forte viés revisionista, que busca pintar Parr como uma heroína pouco celebrada de seu tempo. O roteiro, escrito por Jessica e Henrietta Ashworth a partir de um romance histórico de Elizabeth Freemantle, admite abertamente sua condição de ficção logo no início, mas isso faz pouco para aliviar o maniqueísmo da produção.

Como a maior preocupação do filme é com a imagem de Parr, o espectador mais atento conseguirá ver as reviravoltas da trama muito antes de elas aparecerem em cena. Quem sofre mais com essa decisão é Vikander, que não tem muito o que fazer no papel principal, com Law dominando cada minuto de cena em que aparece. 

Ainda assim, o filme mantém a atenção do público e seu apuro estético faz com que as duas horas de projeção passem facilmente. As imagens da diretora de fotografia Hélène Louvart (novamente colaborando com Ainouz depois de “A Vida Invisível“) dão à Inglaterra um tom frio e inóspito, reforçando a solidão de sua protagonista na sua luta contra a tirania.

No geral, “Firebrand” é um filme de época bastante em linha com a celebração da feminilidade de hoje em dia. A produção pode não conseguir fazer de sua protagonista uma personagem multifacetada e complexa, mas funciona muito bem como entretenimento – especialmente para fãs de dramas de corte.