Há algum tempo, um filme como Missão no Mar Vermelho estrearia nos cinemas, passaria algumas semanas em cartaz e até poderia arrecadar um dinheirinho respeitável. Afinal, o contexto histórico é interessante, e a trama e o astro principal garantiriam a ida às salas. Então, sairia de cartaz e pouca gente se lembraria dele depois. Mas como estamos em 2019, Missão no Mar Vermelho é um produto da Netflix, lançado direto nos lares dos assinantes e seguindo um pouco o padrão do que já nos acostumamos como um “filme Netflix”. Talvez a tecnologia realmente tenha tirado algo de nós, a obrigação de sair de casa para se assistir a filmes esquecíveis.

Inspirado em fatos reais ocorridos no final dos anos 1970, “Missão Mar Vermelho” traz Chris Evans vivendo Ari, um agente do Mossad, o serviço secreto israelense, cuja missão é tirar refugiados judeus negros da Etiópia. O contexto para a existência dessas populações judaicas na África é explicado às pressas pelo longa, deixando claro desde o início que o importante para a produção e para o diretor Gideon Raff é o entretenimento, que precisa ser ágil e com ação e tensão. Não há um mal inerente nisso, obviamente: mostrar versões “mais emocionantes” de eventos reais é algo que o cinema faz desde o seu início. Ora, Argo (2012) ganhou o Oscar há alguns anos fazendo justamente isso…

Ari então monta uma missão arriscada: junto com uma equipe, ele se instala num hotel à beira-mar abandonado e o transforma numa fachada para “contrabandear” para fora do Sudão refugiados etíopes que seriam mortos pela brutal perseguição religiosa. O Red Sea Diving Resort começa a receber hóspedes e a funcionar como um empreendimento normal, enquanto Ari e seus comandados se arriscam cada vez mais para cumprir as missões de “extração” dos judeus africanos.

É um filme com um tema atual e importante, feito para entreter o espectador e fazê-lo pensar um pouquinho. Nesse sentido, é bem realizado: Raff encena boas cenas de ação e há um clima meio Onze Homens e Um Segredo nas cenas em que Ari reúne sua equipe – no elenco do filme estão a interessante Haley Bennett, o sempre ótimo Michael Kenneth Williams e o veterano Ben Kingsley, emprestando sua dignidade. Para manter as coisas interessantes, há um conflito entre o herói e o médico vivido por Alessandro Nivola – pena que apenas brevemente explorado.

PRETENSÕES BAIXAS, RESULTADO FRACO

Porém, percebe-se também uma vontade calculada demais de se fazer um filme que agrade a todo mundo. Para um filme que aborda conflitos no sangrento continente africano, a violência é branda. Não há um real desenvolvimento de personagens ou profundidade emocional – O tema importante tem precedência na visão dos realizadores. E o filme, infelizmente, não escapa do velho clichê: mais uma vez, é uma história com heróis brancos ajudando negros em necessidade. E os negros do filme que não são indefesos são vilões, os sanguinários soldados comandados pelo personagem de Chris Chalk – que está ótimo no papel, vale dizer. É o tipo de visão paternalista que Hollywood sempre explora, em detrimento de outros tipos de histórias que raramente são filmadas.

Essa visão incomoda, mas para quem quer duas horas de entretenimento, existem várias opções bem piores na Netflix. Uma pena, pois, esse filme tinha potencial para mais, para se tornar uma experiência realmente marcante, para levar a uma reflexão mais profunda, além da mera diversão. Mas no fim das contas, precisamos julgar o filme que existe, não um no plano das ideias. Missão no Mar Vermelho, no fim das contas, é um filme com o qual dá para se entreter um pouco na Netflix num sábado à noite, carregado pelo carisma de um astro e pela história, que é genuinamente interessante. Mas ao seu final, parece impossível não pensar que “ficou na média” dos filmes Netflix. Esse é um pensamento triste, até percebermos que logo assistiremos outra coisa…

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