É sexta-feira. Foi uma semana de árdua labuta. Você só precisa de algo para relaxar quando chegar em casa – algo que não dê trabalho, que não ofenda, mas que também não te deixe muito desperto. Apropriado, então, que este mais novo lançamento da Netflix já nos chegue como quem bate às portas do esquecimento. 

Podemos entender, assim, o que leva o cansado espectador a dar play neste “O Agente Oculto”, mais nova empreitada de Anthony e Joe Russo. O longa, aliás, dá prosseguimento ao interesse dos irmãos em espetáculos repletos de ruído digital. É que se nos filmes dos “Vingadores” que conduziram, a estética de cutscenes era complementada pela poluição visual de um milhão de bonecos digitais, neste mais novo capítulo da sua oeuvre, então, os irmãos adicionam poeira, fumaça e todo o tipo de partícula em CGI como quem tem um prazer sádico em obscurecer os frames. Sendo desinteresse ou falta de ideias, é uma estratégia que, então, nos faz perguntar: por que, afinal de contas, fazer este filme? 

Perguntas sem respostas

O desinteresse parece ser a chave, mesmo – um desinteresse cínico, multimilionário. Toda essa neblina digital seria, desse modo, uma cortina de fumaça para manter o espectador perpetuamente distraído. Sintomático, portanto, da era do conteúdo a qualquer custo, onde interessa menos que prestemos atenção ao que se desenrola na tela, e mais que nossos dispositivos transmitam imagens automáticas e perpetuamente, perdidos que estamos em afazeres rotineiros e necessidades fisiológicas. E por que – as perguntas continuam – alguém realmente prestaria atenção a este filme? 

Daí, a necessidade de estímulos constantes aos olhos: nada muito chamativo, para não nos despertar de nosso sonambulismo doméstico, mas sempre com uma dose generosa de imagens e ruídos conhecidos (espere, por exemplo, cenas de ação batidas ao som de músicas pop, bem como tiradas irônicas proferidas pelos personagens). 

É essa estratégia que está por trás, também, da profusão de cartelas ao longo da projeção: Bangkok, Mônaco, Turquia, os cenários se empilham uns sobre os outros, atrações mundiais que, regurgitadas por uma máquina de recursos infinitos, finalmente se transformam em mero ruído informacional. Por que então, perguntamos, alguém investiria $200 milhões neste filme?

…Por quê?

Nem mesmo alguns dos rostos mais carismáticos de Hollywood conseguem dar algum tempero a essa gororoba. Aqui, basta saber que Six (Ryan Gosling, preguiçosamente imitando seu xará, Ryan Reynolds) é responsável pelo trabalho sujo da CIA. Em uma de suas missões, Six descobre mais do que esperava sob o tapete da agência, e logo o bigodudo Lloyd (Chris Evans, que ao menos parece se divertir) e seu time infinito de mercenários estão em seu encalço. 

Outros rostos famosos aparecem, como os de Billy Bob Thornton, Ana de Armas e até mesmo Wagner Moura, em um papel étnico genérico. À parte seus salários milionários, “O Agente Oculto” é prova de que trabalho é sempre um porre: por que qualquer um desses atores deixaria sua cama para estar neste filme? 

Assim, como se nos desafiasse a prestar atenção, “O Agente Oculto” se coloca como uma série de perguntas – todas ressoando surdamente entre os ouvidos dos espectadores adormecidos numa sexta à noite. Engendrado através de maquinações algorítmicas, este é mais um filme que se desenrola como o equivalente audiovisual à música de elevador: apenas mais um arremate ao marasmo cotidiano.

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