AVISO: o texto abaixo contém SPOILERS 

Há mais ou menos um ano ‘remake’ era um conceito inocente para mim, mas, após ser bombardeada com tantas recriações realmente ruins, a palavra tornou-se um motivo de pânico. Em meio a este boom de reaproveitamento em Hollywood, ‘O Homem Invisível’ é uma grata surpresa ao revisitar um clássico buscando toques de originalidade em uma trama tão conhecida e igualmente reproduzida. O resultado é um thriller envolvente com ótimas atuações e abordagem muito bem direcionada sobre relacionamentos abusivos. 

Nesta versão, o cientista Adrian Griffin (Oliver Jackson-Cohen) forja a própria morte e cria um traje com a habilidade de lhe tornar invisível para perseguir a ex-namorada Cecília Kass (Elisabeth Moss). Assim, diferente das outras produções, “O Homem Invisível” não acompanha o ponto de vista de seu personagem-título, mas sim da vítima, uma mudança significativa para seu desenvolvimento. 

Como diretor e roteirista, Leigh Whannell acerta em grande parte de suas escolhas. O principal deles é o foco na personagem de Elisabeth Moss: além de permitir uma nova visão sobre a história, a obra também se apoia na ótima atuação e fácil identificação com o público da estrela de sucessos como “Mad Men” e “The Handmaid´s Tale”.  

Responsável por sucessos do terror como “Jogos Mortais” e “Sobrenatural”, Whannell cede aos clichês do gênero como uso de jump scares, forte trilha e situações demasiadamente convenientes para a história seguir adiante. Tais elementos até funcionam, porém, são bem esquecíveis a longo prazo. 

FOCO CERTO DA HISTÓRIA 

Se por um lado, Whannell apela para certos artifícios fáceis do terror, por outro, ele aproveita a trama sobre relacionamento abusivo para inserir vários momentos dramáticos e alcançar maior densidade. Para mim, o grande exemplo desta boa combinação é a morte de Emily (Harriet Dyer): uma cena impactante, inesperada com um final melancólico, sendo o ponto de virada necessário para a história. 

Mesmo digno de todos esses méritos, destaco a abordagem consistente sobre relacionamentos abusivos como a grande cereja do bolo de “O Homem Invisível”. Desde o comportamento traumatizado de Cecília até a descrição da convivência com Adrian, o filme abraça o tema com responsabilidade. 

Além de focar mais no ponto de vista da vítima, a omissão de Adrian também é uma ótima escolha do roteiro. Em grande parte do filme, o rosto do personagem não é revelado ao público, assim como sua voz aos poucos é conhecida. Isto além de tornar inviável uma possível defesa do vilão também deixa seu público ter medo de um personagem pouco conhecido, mas com atitudes muito comuns a realidade de relacionamentos tóxicos.   

A escolha desta abordagem é extremamente inteligente, pois, cria uma trama única a qual se distancia do que já foi visto sobre o livro ‘O Homem Invisível’. Mesmo com os elementos excessivos do terror e algumas previsibilidades do roteiro, o longa pode ser considerado um ótimo trabalho de Leigh tanto no roteiro – área que ele domina – quanto na direção, a qual ele possui um futuro promissor. 

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