Premiado na Mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes em 2022, “Rodeo”, o filme sobre paixões por motocicletas de Lola Quivoron, é um dos principais lançamentos da Imovision em maio deste ano. Velocidade, asfalto, motores acelerando, noite, fumaça, fogo: esses elementos compõe a iconografia visual da obra francesa, uma experiência de intensidade enquanto exercício fílmico alicerçado no estudo de personagem.

Abrindo com uma sequência de velocidade, “Rodeo” se mantém como uma intensa volta de moto, cheia de adrenalina, beleza e também de perigo. A história é a da jornada de Julia (Julie Ledru), sempre no risco e em busca da liberdade de poder ser quem é e fazer parte de uma gangue que pratica roubo de motos. Para tanto, ela precisa se provar e superar o preconceito e o machismo de seus pares, imigrantes como ela, cuja família veio das Antilhas, mas que vivem num subúrbio da França de forma bem segregacionista.

O chefe dela é o gângster Domino (Sébastien Schroeder), que controla toda a operação da prisão e mantém a esposa Ofélia e o filho sob vigilância constante, presos em casa. Ele vem a ser um dos estopins para Julia entender que precisa ajudar Ofélia a se libertar também. “O que eu vou fazer com o dinheiro, se tudo eu roubo?” ela fala para a mulher, em uma cena que explica que a motivação da personagem em viver sob rodas sem dar satisfações é perturbada pelo conflito interno que ela vive, de não querer estar sozinha sem alguém na garupa.

INFLUÊNCIAS DE DUCORNAU E SCIAMMA

“Rodeo” transita bem entre o drama, a ação, a aventura e o suspense, já que há uma trama de ameaças virtuais e reais que assolam Julia. Ela passa a ser agredida e isso chega ao ápice justo no grande momento do longa que envolve um assalto a um caminhão transportando várias motos de uma concessionária. O fato a leva a tomar uma decisão definitiva para a sua vida.

A clandestinidade dos piratas do asfalto, sempre em busca de ação a casa roubo de moto, vai fazendo Julie se sentir mais e mais feliz. Uma cena emblemática de “Rodeo” é quando, após um dia de trabalho bem-sucedido, Julie dorme na garagem onde fazem os desmontes das motos. Neste momento, ela coloca na cama, ao seu lado, a moto que acabara de marcar como sua.

A relação mulher-máquina remete a “Titane”, de Julia Ducornau, onde também serve como vetor de identificação e forma de ebulir os desejos da personagem. Já o elemento do fogo-fátuo que atravessa a memória e mantém na lembrança como “Retrato de Uma Garota em Chamas”, de Céline Sciamma, aqui adquire uma conotação fantasmagórica para possibilitar a transcendência de Julie.

A imagem de divulgação de “Rodeo” é retirada de uma cena que sintetiza a essência do filme de Quirovon, já que quem perde tempo pensando na morte passa menos tempo beijando o asfalto. Para Julie, andar de moto sentindo o vento no rosto e nos cabelos é um epítome da felicidade, possibilitando essa experiência libertadora também para Ofelia e o pequeno Kylian. É estar não chapada de droga, mas sim, de adrenalina. Acelerando em busca de seus sonhos mesmo que apenas por um instante.