Em fevereiro de 2023, o cineasta James Gunn anunciou os novos planos dele e do estúdio Warner Bros para reiniciar o universo dos super-heróis DC no cinema. Vamos ter um novo Superman, novas visões e personagens, mas como a Warner é a Warner, algumas coisas vão continuar: por exemplo, o “Batman”, do Matt Reeves, vai seguir em paralelo com a visão de Gunn, que trará Robin. Mas, no geral, o anúncio foi animador e nos fez ter esperança pelo futuro cinematográfico desses personagens – afinal, não há nada, teoricamente, que os impeça de serem tão bem-sucedidos no cinema quanto os heróis da Marvel.

No entanto, apesar do anúncio, ainda há algumas produções da “velha gestão” por estrear – ótima estratégia, Warner! O primeiro deles é este “Shazam: A Fúria dos Deuses”, continuação do longa de 2019. A julgar pelo resultado aqui, podemos apostar com relativa segurança que o Shazam e seus amigos não serão uma das coisas que Gunn e a Warner vão manter. O filme já chega às telas com jeito de natimorto e, pelo que se vê na tela, uma morte misericordiosa é a melhor coisa a se fazer mesmo.

Nesta nova história, Billy Batson (Asher Angel) e seus irmãos adotivos já estão agindo como super-heróis – eles se transformam ao gritar a palavra “Shazam!”, e a versão super-heróica do protagonista é interpretada por Zachary Levi. No entanto, apesar de bem intencionados, eles ainda causam tantos danos quanto buscam combater, e também lhes falta liderança: digamos que o líder do grupo é um paspalhão – embora seja curioso que ele não pareça assim tão imaturo na sua versão adolescente, que mal aparece, e já deveria ter crescido ao menos um pouco após os eventos do primeiro filme. Enfim… Quando surgem as Filhas de Atlas, determinadas a pegar para si o poder dos deuses que os irmãos receberam, os heróis terão de se unir para salvar a si mesmos e à cidade.

ROTEIRO E ELENCO NADA INSPIRADOS

O principal problema de “Shazam: A Fúria dos Deuses” é o seu roteiro, muito, mas MUITO fraco. Parece que o diretor David F. Sandberg, o mesmo do original, e seus roteiristas se bancaram apenas na aceitação do filme original – que era, sim, uma Sessão da Tarde agradável e despretensiosa, o tipo de filme que poderia ser até mais frequente no subgênero dos super-heróis – e se acomodaram, porque não trouxeram nenhum conceito interessante ou novidade para a sequência. A preguiça aqui impera.

Ao longo do filme vemos personagens se apaixonando um pelo outro sem motivo – o romancezinho entre Freddy (Jack Dylan Grazer) e Anne (Rachel Zegler) é de doer; os heróis não têm trabalho algum porque possuem uma canetinha mágica que explica tudo para eles; arbitrariedades (o que é aquela cena dos unicórnios?); pessoas que morrem, mas passam bem até a hora em que o roteiro precisa delas; e um deus ex machina no fim para resolver as pontas soltas. É abusar muito da boa vontade do espectador.

Sandberg e equipe parecem não ter consciência de que o protagonista pode ser abobalhado, mas não irritante. O Shazam não desperta empatia porque simplesmente não há motivo para isso – de novo, confiança apenas no filme anterior. E a atuação de Levi é muito sem graça, desesperado para arrancar risos. O elenco, aliás, se mostra problemático no geral e divide as atuações entre “ligados no 220V” – Grazer está muito caricato aqui e o fato de boa parte de “Shazam: A Fúria dos Deuses” repousar sobre seus ombros só piora as coisas – e “mínimo esforço” – as vilãs são feitas por Helen Mirren e Lucy Liu, duas veteranas que não parecem mais querer trabalhar duro e só curtem a vida de cheque em cheque por suas atuações.

Do elenco, os únicos que se salvam são Zegler, que quase consegue dar um pouco de dignidade à sua personagem, e Djimon Hounsou como o Mago – o ator sabe exatamente em que tipo de filme está e atua de acordo.

DESPREZADO NA SAÍDA

Se não há história e o elenco não ajuda, o que resta é acompanhar o filme sem inspiração, exceto em alguns momentos específicos. O design de criaturas cria algumas figuras interessantes aqui e ali, incluindo um dragão feito de madeira, e eventualmente a redenção do Shazam chega e o filme melhora um pouquinho perto do final. Mas aí já é tarde, e o próprio longa destrói com o amadurecimento do protagonista na sua cena pós-créditos – que indica um futuro que provavelmente não veremos.

No meio dos diálogos engraçadinhos e referências pop, fica claro que os cineastas por trás de “Shazam: A Fúria dos Deuses”  falham no eterno desafio hollywoodiano de criar uma sequência.  E o mais irônico é que, enquanto este segundo Shazam se torna um produto da máquina hollywoodiana, desprovido da graça e espontaneidade que seu antecessor teve, ele deve acabar sendo desprezado pela própria máquina que o criou. Afinal, o novo Universo DC vem aí e a família do Billy Batson, ao que parece, vai ficar sem casa por uns tempos.