Tom (Matthew Macfadyen) chegando no quarto com uma bandeja de café na manhã para Shiv (Sarah Snook), todo animadinho e feliz, os dois se beijando deveria ser um momento fofo para o casal que viveu os últimos meses em pé de guerra. Estamos, porém, em “Succession” e claro que toda esta harmonia não irá durar muito graças ao bizarro presente dele: uma estátua com um desenho de escorpião. “Eu te amo, mas, você me mata e, depois, eu te mato”, tenta justificar o chefão da ATN para sua amada incrédula com a surpresa do “mimo”. 

Uma hora depois lá estamos arrasados com uma série de torpedos inclementes disparados pelas duas partes na varanda do casal em uma festa com as 40 pessoas mais influentes dos EUA na véspera da eleição que pode definir os rumos da democracia nos EUA. É quando “Succession” encontra “Cenas de um Casamento”, clássico de Ingmar Bergman que ganhou uma nova versão recente com Jessica Chastain e Oscar Isaac.  

Durante a discussão, Tom fala sobre ser honesto, o que abre caminho para ambos utilizarem o que sabem ser o mais pesado contra o outro. Difícil dizer o quanto daquilo eles verdadeiramente sentem, mas, os dois têm o total conhecimento dos maiores medos de cada um e o exploram para causar dor à perfeição: Shiv e o fantasma da maternidade (já externado em uma conversa com a mãe em temporada anterior), enquanto Tom nas suas origens provincianas e na fragilidade dentro da família Roy. 

MATSSON DESTOANDO 

O bate-boca não apenas entra na lista de um dos maiores momentos da série como também salva do marasmo “Tailgate Party”, o sétimo capítulo da última temporada. A ida de Lukas Matsson a Nova York para uma festa de pré-eleição na casa de Tom não rendeu tantos momentos brilhantes ou tensos como poderia, ainda que reconfigure a reta final. Muito disso se deve aos excessos na composição de Alexander Skarsgård como o bilionário sueco: ok, “Succession”, igual “The White Lotus” e uma leva de filmes recentes, busca satirizar ao máximo a vida dos ricaços, suas motivações esdrúxulas e o quão patéticos são. O atual hit da HBO joga no caldo a influência desta gente sem nenhuma noção com a realidade – como demonstra brilhantemente Tom e Greg (Nicholas Braun) ao demitir centenas de pessoas de forma automática – assuntos fundamentais como a mídia e a própria democracia norte-americana. 

Tirando Shiv, todos os principais protagonistas de “Succession” já tiveram seus momentos vergonha alheia. Ainda assim, vez ou outra, podemos sim admirar as estratégias certeiras de Logan (Brian Cox), Kendall (Jeremy Strong), Roman (Kieran Culkin) ou até mesmo de Tom e Greg. Já Matsson só oferece a primeira parte como ao vermos chegando na festa com aquele casaco dourado destoando dos demais no meio do minuto de silêncio em respeito ao magnata ou nos xingamentos com Kendall (números gays? WTF?!). Skarsgård está claramente à vontade e se divertindo para moldar aquela caricatura.  

O sueco, entretanto, comete erros tão ridículos que o tornam um rival inofensivo de tão fácil de ser batido – pelo menos, até aqui, afinal, nunca se sabe quando virá um plot-twist em “Succession”. Agora, chamar para um evento decisivo não apenas o amigo barbudo maluco, mas, a diretora de Comunicação insatisfeita e disposta a abrir a boca para contar os problemas para o primeiro que passar é muito conveniente para os roteiristas segurarem por mais alguns episódios o duelo dos irmãos. Claro que isso abre possibilidades interessantes com Shiv, coitada, novamente nas cordas por ter feito a aposta errada e Kendall prestes a dar uma virada – ainda que com um adversário desses nem precise de muito. 

AMEAÇA DEMOCRÁTICA? E DAÍ? 

No meio da complexa treta entre Tom e Shiv e o duelo fácil Kendall versus Matsson, “Tailgate Party” ainda nos brinda com subtramas deliciosas. A eleição norte-americana marcada por uma ameaça real de rompimento democrático com a possível vitória de um extremista de direita nazista vira um joguete na mão da família Roy. Se Kendall tenta convencer o lado democrata de bandeira branca em troca de burocracia que dificulte a venda para Matsson, Roman não se inibe de negociar com o anticristo, incluindo, uma embaixada para o irmão Connor (Alan Ruck) em qualquer buraco do planeta desde que ele retire a candidatura patética – exceto, claro, no Alasca onde está “bombando” com “4, 5, 6% das intenções de votos”. 

Surgiu uma ameaça de bomba em Phoenix? Tudo bem para quem está negociando do alto de sua mansão com as 40 pessoas mais influentes dos EUA e sabe que não será afetado. Nada muito diferente da elite brasileira que prefere se abraçar e fazer campanha para um genocida. Sorte do planeta de “Succession” que a sensatez vem de onde menos (ou seria mais?) se espera, Willa, a ex-prostituta casada com Connor, a qual demonstra oposição ao extremista por conta da família e dos amigos. 

Por fim, cito ainda o merecido sermão de Gerri (J. Smith-Cameron) em Roman após anos de humilhação e assédio dos mais rasteiros. “Tailgate Party” mostra como “Succession”, mesmo que não seja brilhante em todos os episódios, sempre traz momentos capazes de serem marcantes. E aqui coube a Sarah Snook e Matthew Macfadyen esta responsabilidade mais uma vez. Os Emmy de ambos estão a caminho.