Quem cantava a pedra do retorno de Brendan Fraser já pode anunciar: “eu avisei!”. “The Whale” é um filme que dá a devida vitrine ao astro e o coloca na dianteira da disputa do Oscar de Melhor Ator do ano que vem. Exibido no Festival de Londres depois da estreia badalada em Veneza, o novo longa de Darren Aronofsky é um emocionante conto de redenção.

Fraser interpreta Charlie, um professor de literatura que, após sofrer um infarto, resolve mover céus e terra para se reconectar com a filha afastada Ellie (Sadie Sink, da série “Stranger Things“). Dois grandes problemas se desenham: de um lado, enquanto obeso, o infarto coloca o corpo de Charlie em parafuso e ele sabe não ter muito tempo. De outro, Ellie não está disposta a perdoar o abandono parental do dia para a noite.

Aronofsky não é um artista conhecido pelas histórias calorosas e seu cinema é, antes de tudo, focado em método e estrutura. Dito isto, em “The Whale”, ele alcança o maior equilíbrio entre suas obsessões e um drama tocante desde “O Lutador”. Não por acaso, a narrativa base de ambos os filmes é a mesma: um homem isolado, com uma porção de más decisões nas costas, tentando se reaproximar da filha.

UM FEITO DE BRENDAN FRASER

“The Whale”, no entanto, dá maior peso (com o perdão da expressão) a essa narrativa devido ao roteiro de Samuel D. Hunter. Adaptando sua própria peça para a telona, o roteirista transforma uma história de desconexão familiar em um tratado sobre culpa, coragem e moralismo religioso.

No decorrer de cinco dias (devidamente sinalizados em cena), a pequena existência de Charlie vai dando espaço à sua responsabilidade para com Ellie e o retorno dela em sua vida reacende a dor de traumas antigos. Através da jovem, o público descobre como Charlie abandonou sua família para se relacionar com um de seus alunos e como esse romance acabou tragicamente com o suicídio de seu parceiro.

Religião é um grande interesse de Aronofsky e aqui, ele explora a intolerância por motivos religiosos com uma sensibilidade ímpar. Longe dos elementos fantásticos de “Noé” e do profundo simbolismo de “mãe!“, este filme vem carregado de um realismo que favorece este material.

O elenco de apoio está incrível, com destaque para Sink e Hong Chau (da série “Watchmen“), que interpreta Liz, enfermeira e melhor amiga de Charlie. No entanto, o filme é de Fraser, que domina a telona numa performance vulnerável e magnética. Ele imbui seu protagonista com um talento para ver o bem em todas as pessoas e a fragilidade de quem levou todas as surras que a vida podia dar.

É um feito do ator conseguir partir o coração do público sem recorrer a manipulações baratas e isso, de certa forma, pode ser dito do filme como um todo. À sua maneira, “The Whale” é uma história sobre pessoas muito feridas buscando salvação. Elas conseguem? É uma questão em aberto. Charlie acredita que isso é possível. Liz discorda. Ellie nem vê ponto na pergunta. Você decide.