Lembra quando o presidente Jair Bolsonaro, no meio da pandemia da COVID-19 com mortes superiores a 1000 por dia, resolveu decretar que academias eram atividades essenciais? A surreal decisão parece saída do roteiro de “Subsolo”, animação satírica da dupla Erica Maradona e Otto Guerra, parceiros da série “Rocky e Hudson – Os Cowboys Gays”, com um olhar ácido sobre estes templos modernos da ‘boa saúde’.
Com oito minutos de duração, o projeto gaúcho selecionado para a mostra competitiva de curtas-metragens nacionais mostra o dia a dia dentro de uma academia localizada ao lado de um restaurante. No local, somos testemunhas do culto ao corpo, do ridículo das atividades e do narcisismo dos professores e frequentadores, enquanto a gordura queimada se transforma em mais comida feita para engordar.
“Subsolo” não chega a ser uma inovação ou trazer algo tão diferente ao estilo já conhecido de Otto Guerra com seus desenhos disformes, exagerados, ‘sujos’, lembrando mais “Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock n´Roll” do que “Até que a Sbórnia nos Separe”. Isso reforça o ridículo da situação repleto de personagens grotescos como o professor ultra musculoso com os mamilos saltando para fora da camisa de regata branca ou o físico franzino e barrigudo do sujeito que diz não entender como não emagrece ao ir todo o dia para a academia.
Isso acaba servindo para a zoeira do ridículo das atividades da academia serem potencializadas ao máximo como a deliciosa aula de zumba, além das frases dignas de coaching de quinta categoria grudadas em cartazes do local. O roteiro de “Subsolo”, escrito por Maradona e Vinícius Perez, ainda tenta ampliar a discussão ao mostrar como tudo faz parte de um ciclo vicioso e interminável em que a saúde fica em último lugar diante da atual cultura alimentar nosso do dia a dia, porém, soa deslocado e um nível abaixo se comparado à sátira.
Quem dera “Subsolo” fosse apenas uma visão distorcida pelo exercício normal de imaginação de um artista irônico como Otto Guerra, porém, vide os Stories nossos de cada dia, somente é a mais pura realidade de uma sociedade narcisista.