Não é à toa o destaque que “Homem-Aranha no Aranhaverso” vem ganhando. O novo filme é um prato cheio para quem é fã do cabeça de teia e também para quem gosta de uma boa animação. A Sony, que estava perdida com o universo do personagem, vejam só, encontrou no conceito da palavra uma saída criativa, eficaz e, de quebra, ainda apresentou um novo protagonista para vestir o manto aracnídeo.

Convenhamos substituir Peter Parker de cara, provavelmente, não seria uma ideia muito bem vinda por muitos. Então, inserir essa “passagem de faixa” organicamente ao roteiro foi uma ideia brilhante. “Homem-Aranha no Aranhaverso” não serve apenas para falar de Parker, mas de diversas versões do amigão da vizinhança.

Explicando, o filme já começa com Peter nos situando como já estamos cansados de saber, que ele é o Homem Aranha. Que, por baixo da máscara, ele já impediu tragédias, salvou vidas e Nova York diversas vezes – um dos momentos mais hilários do filme, diga-se de passagem. E que não importa o que aconteça, ele sempre vai estar ali, disposto a ajudar.

Miles Morales é um garoto com dilemas comuns, pressão no colégio novo, cobrança do pai e, nas horas vagas, gosta de conversar com o tio e grafitar. O que ele não imaginava é que seria picado por uma aranha e sua vida mudaria. Em uma noite, ele acaba flagrando o Homem Aranha sendo morto tentando impedir o Rei do Crime de abrir um portal interdimensional, porém, antes de morrer Parker faz o garoto prometer que terminaria a missão.

O que o rapaz não imaginava é que ao abrir o portal, Aranhas de outras dimensões acabariam caindo na sua realidade. Agora Miles, tem duas missões: impedir o Rei do Crime de consolidar o seu plano (não vou revelar, spoiler) e devolver os heróis de universos diferentes para as suas respectivas realidades. O que faz do filme, quiçá, um dos melhores crossovers já feitos, pois o grande público vai conhecer outras versões do personagem. No fim das contas, isso gera infinitas possibilidades para o futuro da série ou você acha que não vão aparecer outros em futuras continuações?

O interessante ao falar do visual do filme é como o trio de diretores – Bob Persichetti, Peter Ramsey e Rodney Rothman – consegue perfeitamente encaixar personagens com designs tão diferentes dentro da animação sem causar estranheza. Basta observar como o Porco Aranha que tem traços em 2D, claramente inspirado nos Looney Toones, interage com Miles e os outros personagens em 3D. E o que dizer do Homem Aranha Noir, que é preto e branco, e Peni Parker com traços de anime? Já os vilões tão conhecidos do herói ganham designs diferentes dos habituais, inspirados em suas versões ultimates da editora: O Escorpião e o Duende Verde que o digam.

Aqui, também encontramos a Gwen Aranha (no universo dela, Gwen Stacy foi picada e não Parker) e o Homem-Aranha que seria o tradicional (o que já tem mais de 50 anos de histórias), o que faz não sentirmos tanto o peso da morte do Parker da realidade de Morales. O roteiro de “Homem-Aranha no Aranhaverso” poderia se acovardar e dar maior destaque para este, mas, no fim, faz questão de lembrar que Miles é o protagonista, e ele mesmo o faz no fim – sendo um dos momentos mais tocantes do longa.

O apuro visual da animação é único: “Homem-Aranha no Aranhaverso” claramente emula os trejeitos de uma HQ. Mesmo em 3D, os personagens apresentam rabiscos e hachuras próprias de um gibi. Para não deixar mais claro em alguns momentos, balões são inseridos nos personagens para descrever pensamentos, quadros na tela para ditar o local e a sequência se move e se divide como se estivéssemos lendo uma edição.

O roteiro não tem vergonha de citar o material de origem e homenagear seus criadores quando surge a oportunidade, sendo uma maneira original de contribuir com a narrativa. As capas de gibi que saltam na tela pra explicar sobre os diferentes aranhas é uma delas. E acreditem a participação sempre esperada de Stan Lee está lá e, talvez ,seja a mais significativa até hoje.

As cenas de ação são outro destaque: inventivas e não hesitando em mergulhar em arroubos psicodélicos, principalmente no clímax. O roteiro é de Phil Lord que também assina a produção junto do seu parceiro habitual Chris Miller (“Uma Aventura Lego” e “Tá Chovendo Hambúrguer”). Ao enxergarmos o resultado de Aranhaverso nas telas, ficamos ainda mais com o gosto amargo da dispensa da dupla do filme do “Han Solo”.

O que “Homem-Aranha no Aranhaverso” peca um pouco é na forma já clichê do herói empacar com seus poderes: poderiam criar outras formas de ele lidar com sua inabilidade e, por que não, dar mais um pouquinho de espaço para o Homem-Aranha Noir e a Pene Parker? Mas, deixando claro que esses probleminhas não chegam a comprometer em nada a diversão.

Não esquecer o que faz o personagem especial, com certeza, ainda é o maior trunfo de “Homem-Aranha no Aranhaverso”. Não importa o universo, o gênero e nem a origem: o personagem sempre vai ter aquele toque de identificação do homem comum que precisa lidar com diversos problemas ao mesmo tempo e, no fim, ainda salvar o dia. Como diria um de seus criadores: “qualquer um poderia estar por debaixo da máscara”.

E pensar que a Sony estava pensando em fazer um filme da Tia May. Meu Deus.

Uma aventura imperdível, para ser vista na maior tela possível.

PS: Não saia da sala, a cena pós-créditos é sensacional, além de ser hilária.