Se me permitem começar numa nota pessoal… Eu queria ter gostado de Maniac bem mais do que gostei. A produção da Netflix, inspirada numa minissérie da Noruega e que conta com os produtores da versão original na equipe, é estrelada por atores que admiro e adoro ver em cena: Emma Stone, Jonah Hill, Justin Theroux, Sally Field. Maniac também é dirigida por um cineasta do qual também sou fã, o talentoso Cari Joji Fukunaga, diretor de Jane Eyre (2011); de Beasts of No Nation (2016), ainda hoje um dos melhores filmes originais da Netflix; e da marcante primeira temporada de True Detective para a HBO.

Por tudo isso, não pude evitar a decepção com o resultado final da minissérie – Maniac até que acaba sendo interessante, mas a experiência de se assistir aos 10 episódios não é desprovida de problemas. É quase impossível não se perguntar, em algum momento, “por que estou vendo isto?”. E muitas vezes, não se encontra respostas muito convincentes para essa indagação.

Maniac é sobre conexão entre as pessoas – a narração em voiceover do primeiro episódio meio que já deixa isso claro para o espectador – e sobre a eterna busca do ser humano por uma panaceia, algo mágico que reduza ou elimine a dor da existência. E também é sobre umas coisas malucas que acontecem com os protagonistas Owen (Hill), a ovelha negra de uma família rica e um sujeito que não possui um senso muito forte de realidade, e Annie (Stone), uma jovem viciada e atormentada por uma tragédia familiar. Owen, Annie e um bando de outros deprimidos vivem num futuro estranho e se candidatam a uma terapia experimental de grupo com o uso de revolucionárias drogas criadas por uma companhia farmacêutica. Supervisionando o processo de tratamento está o esquisitão Dr. Mantleray (Theroux), auxiliado pela leal Dra. Fujita (Sonoya Mizuno) e pelo computador GERT.

A série estabelece logo de cara o mundo em que esses personagens vivem, um lugar triste onde a publicidade é assustadora e onde é possível “alugar” um amigo ou companhia. O primeiro episódio é dedicado à apresentação de Owen e o segundo faz o mesmo com Annie. E a partir daí, o que já parecia estranho se torna verdadeiramente insano, com os personagens desfrutando de uma conexão que os leva a ter alucinações juntos. Num momento, Annie e Owen são um casal nos anos 1980, com direito a permanente nela e mullet nele, envolvidos no resgate de um lêmure. Mais tarde, Owen se vê como mafioso e Annie como elfa numa busca estilo O Senhor dos Anéis.

A estranheza não se limita aos personagens principais, mas se estende aos coadjuvantes também: por exemplo, um dos momentos mais hilariantes da minissérie é a cena com o aparelho de realidade virtual para masturbação do Dr. Mantleray. E mais à frente na história, até o supercomputador fica deprimido… As cenas envolvendo o tratamento e as “viagens” dos personagens inevitavelmente evocam lembranças de Charlie Kaufman e de Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (2004), e também é divertida a referência a Um Estranho no Ninho (1975) quando os cientistas se referem aos pacientes que falharam no experimento como “McMurphys”.

O elenco, em especial, se mostra inspirado. Stone consegue ser divertida, depressiva, carente, séria… Realmente não há limites para os estados emocionais da sua personagem, e o seu relacionamento com a irmã – a talentosíssima Julia Garner, de The Americans e Ozark – fornece à minissérie um bem-vindo reforço emocional para contrabalançar as esquisitices. Já Hill, agora magro, até faz com que a sua nova aparência contribua para o seu retrato de um cara deprimido e maluco, embora seu personagem seja menos interessante que o de Stone, no fim das contas. Como contraponto ao casal principal, as interessantes composições de Theroux e Mizuno para seus reprimidos personagens roubam diversas cenas. E Sally Field também se mostra divertida e disposta a embarcar na maluquice da experiência, chegando a adotar várias personas ao longo dos episódios – afinal, além de dublar o computador, ela também o personifica às vezes.

Essas são as qualidades… Mas ao mesmo tempo em que elas ajudam o espectador a abraçar a estranheza da experiência – e é possível abraçar, o quarto episódio, por exemplo, com Owen e Annie salvando o lêmure, é o mais divertido de todos – é impossível negar que às vezes a série é esquisita apenas pelo prazer ou vontade de ser esquisita, sem que haja um propósito narrativo forte para tal. Ora, ver Emma Stone como elfa ou Jonah Hill se transformando em falcão são momentos que acabam provocando a desconexão do espectador e despertam uma sensação de excesso. Afinal, a minissérie não escapa do já conhecido efeito Netflix: Mesmo tendo alguns episódios curtos, com pouco menos de meia hora de duração, ainda permanece a sensação em Maniac de muito tempo para pouca história. Há tanta coisa, tantas ideias jogadas dentro da experiência, que esses momentos de desconexão às vezes roubam o impacto de outros realmente engraçados.

Ao final, a experiência de Maniac consegue englobar vários aspectos: é uma minissérie divertida e até tocante em vários momentos, mas é também irritante e cansativa em outros. A reunião de tantos talentos, que já demonstraram certas doses de loucura em projetos anteriores e vontade de criar trabalhos desafiadores, não funcionou tão bem aqui. Às vezes é esquisita demais; às vezes fica claro que a história é meio comum e previsível, quando se deixa de lado as esquisitices do percurso. Nem uma produção genial nem um desastre completo, Maniac parece um ponto fora da curva, e algo claramente projetado para ser maratonado, caso o espectador embarque nesse trem. Falando nisso… Será que o computador é o algoritmo da Netflix, e Owen e Annie estão vivendo episódios-testes para outros seriados da plataforma? Bem… Talvez agora seja eu que esteja viajando demais.