A união da sabedoria ancestral indígena com a ficção científica deu origem à ‘A Terra Negra dos Kawa’, novo filme do diretor Sérgio Andrade. A produção amazonense estreou na programação da 42ª Mostra de Cinema de São Paulo em uma sessão especial na última quinta-feira (25). O Cine Set conversou com o cineasta e os atores indígenas Kay Sara e Anderson Kary-Baya.

‘A Terra Negra dos Kawa’ nos apresenta a história de uma equipe de cientistas que, ao realizar um estudo agrícola em Manaus, descobre uma misteriosa terra negra, gerando dúvidas sobre suas propriedades medicinais, éticas e até sobrenaturais. Além dos atores indígenas, o elenco ainda conta com Mariana Lima (“O Banquete”), Marat Descartes (“Quando Eu Era Vivo”) e Felipe Rocha (“Como Nossos Pais”)

Assim como ocorreu no curta “Cachoeira” e nos longas “A Floresta de Jonathas” e “Antes o Tempo Não Acabava”, Sérgio volta à temática indígena, trabalhando questões como propriedade de terras e a relação dos índios com os elementos da natureza. Segundo ele, são assuntos que não pretende parar de abordar tão cedo em futuros projetos. “É uma missão que eu gosto de realizar e acho que quanto mais fizer melhor”, disse.

No filme, Sérgio Andrade cria os Kawa, uma nova etnia, como forma de homenagear todas as tribos. “Acho que o filme traz esse lugar precioso, essa simbologia do lugar sagrado, sábio que os indígenas trazem, que nos legam. Temos que reverenciar isso. É inacreditável que alguém pense em não dar ao índio o que é dele”, comentou.

O grito do novo índio e um ativismo através da arte

A representatividade indígena foi o que marcou a atriz da etnia Tarino, Kay Sara, uma das protagonistas de “A Terra Negra dos Kawa”. Há dez anos na área de atuação, ela acredita que a arte é uma forma de militar sobre a integração do índio na sociedade.

“(A atuação) ajuda a tirar esse estereótipo de achar que o índio só mora na aldeia. Estamos evoluindo, estamos na sociedade. Queremos ser aceitos. Meu trabalho como artista é a minha forma de ser militante e mostrar para as pessoas que estamos integrados na sociedade”, comentou a atriz que dá vida à personagem Kandra.

“Está na hora de mostrar que o indígena mudou, sendo capaz de se defender, dialogar. Temos outro tipo de entendimento das coisas, sejam os povos que moram na cidade ou na floresta”, disse Anderson Kary-Baya, irmão de Kay e protagonista de “A Terra Negra dos Kawa”.

Para Kary-Baya, a simbologia da terra negra no filme tem papel importante ao mostrar o quão precioso é o território indígena para pessoas que estão fora dessa realidade. Ele observa ainda que parte do público fora do Amazonas está perdido diante de temas como demarcação territorial e a rotina da vida indígena.

“Quando você começa a falar sobre os mistérios do mundo indígena, o pessoal fica perdido mesmo porque não sabe o que está sendo falado. A gente tem uma visão diferente do que eles têm sobre a terra, sobre a natureza mesmo”, comenta.

De São Paulo, “A Terra Negra dos Kawa” irá para o Festival do Rio a partir do próximo dia 1º de novembro. A estreia em circuito nacional deve acontecer em 2019.